Tudo piscando e tocando músicas natalinas sem parar. “Ho, ho, ho”, diz qualquer pinguço bucólico que atravessa a rua. Esquinas e mais esquinas de luzinhas coloridas que acendem e queimam, acendem e queimam, acendem e queimam.
As lojas estão abertas até mais tarde. Passam mel nas vitrines e besuntam os manequins de açúcar para atrair os compradores como formigas saúvas. Um arzinho de clima familiar misturado com viagem de ácido lisérgico. Todos caminham como se fosse domingo, nos sete dias da semana. Os caras assumem aquele semblante de bobo alegre, olhando para cima sem razão aparente.
Todos enfiam as mãos no bolso e sacam os cartões de crédito. Estupram os caixas eletrônicos, seguidas vezes. Puxam os calções pra fora em busca do último frangalho de dinheiro. Por trinta dias convencem a si mesmos que são ricos e que dinheiro não é problema. Janeiro é o mês com o maior índice de tiros nos miolos. A maior quantidade de bobos alegres suicidados de que se tem notícia.
Mas enquanto dezembro durar... bem, enquanto dezembro durar as ruas se entopem de gente. Turistas de cidadezinhas perdidas no mundo vestindo camisas floridas e bermudas cáqui. Trombam uns nos outros pelas calçadas. Os olhos cintilam diante das vitrines. Comprar por comprar. Comprariam uma velha gagá de noventa anos, se estivesse à venda. Ho, ho, ho. O que fazem? Celebram o nascimento de Cristo. Veja Cristo nascer na sua tevê de plasma, aperte a tecla SAP. Já nasceu Deus menino. Espalhe a boa nova pelo celular, você ainda tem crédito.
Papais noéis de shopping center ficam bêbados depois do expediente.
A multidão desfila pelos centros comerciais. O pessoal emenda o mês de dezembro inteiro. Só quem trabalha é a garotada que descola empregos temporários pelas lojas e butiques.
A lavagem cerebral é completa e implacável.
Não há nada errado com o natal. O que está errado é todo o resto. Ho, ho, ho e tudo o mais. Vez por outra alguém sorri na frente de todos. O sorriso mais plastificado que já vi. É como acordar de manhã e descobrir que o mundo se tornou uma bolha de sabão em pó, cheia de carneirinhos dentro dela.
Ninguém é capaz de comprar o mundo, mas todos tentam. O cheiro de panetone paira no ar. Alguém aparece na tevê, ou na porta de sua casa, e discorre um papinho manjado e forçado sobre fraternidade e paz na Terra, como se ninguém tivesse escutado aquilo antes. Em dezembro é de bom tom ser canastrão.
Dizem que Cristo nasceu em dezembro. Sei disso, vi num filme. Mas talvez não seja bem assim. Provavelmente, a única coisa que nasceu em dezembro foi o consumismo.
O consumismo, os bobos alegres e os sorrisos plastificados. Isso sem falar nas tevês de plasma e nos celulares. O resto é só o resto.
Deixe o seu comentário