Queria que palavras corressem. Explodissem. Queria que palavras me lançassem pela estratosfera. Mas não. Palavras são firmes na tela do computador.
Queria que palavras me transpassassem como uma saraivada de flechas. Queimassem como um incêndio azulado. Como a dor. A dor corre. E explode. A dor me lança pelo cosmo e para dentro dos buracos negros. A dor me transpassa como uma saraivada de flechas. E queima como um incêndio azulado.
Não tenho tempo. E corro contra o próprio medo. Aposto corrida com a dor. E as palavras estáticas não ganham velocidade como faz o meu uivo.
Quero respirar o ar dos deuses. Quero explorar cada curva do sonho. Irromper pelos portões do pesadelo. Mas não tenho asas e o anseio arrasta-se na lama.
Quero que meus poros se abram para a poeira do sol. Quero que todos os meus dentes caiam num prato branco e cintilante. E que meus olhos se esvaiam em sangue vermelho e bulboso. Quero transpirar sangue. Quero ver a Beleza emergir da espuma de asco com uma ferida aberta no ânus e uma reentrância no crânio. Quero correr até a água e me atirar no escuro úmido.
Não mais beleza minúscula pairando sobre as ondas da impossibilidade. Não mais beleza minúscula para flutuar num mar de mentiras. Não mais. Quero que o chão se abra como um cão.
Sim, luto contra o tempo. Tento ludibriá-lo, fustigá-lo. Tento passar em branco pela próxima curva. O tempo é uma invenção da dor, e serve aos deuses do medo. O tempo não corrobora com a morte. Ele é o seu próprio senhor. Uma pústula no leito.
Trancado no quarto, um ritual se faz presente. A lua copula com fantasmas num céu tombado como uma tumba. Trancado no quarto, um ritual se faz presente. E dez mil diabretes flanam e dançam, cuspindo risadas que escorrem por suas línguas bífidas e entram como agulhas pelos meus ouvidos, enquanto a tevê anuncia o inferno na sala.
Quero que reis tenham rostos bovinos e que rainhas relinchem como cavalos.
Quero rasgar minhas palavras. Engalfinhá-las com unhas de aço. Mutilá-las. Quero morder minhas palavras e arrancar pedaços de carne como um animal noturno. Quero atacar todo o meu significado. Quero fazer doer para fazer viver. Urrar para a pupila esbranquiçada que se arregala no céu.
Quero atropelar a lembrança. Quero que a noite se dissolva. Noite, dissolva-se numa taça de vinho. Brinque com a linguagem do eco. Minha voz sobrevoa o silêncio.
Quero reduzir o passado a pó e fazê-lo voar com o vento dos cemitérios. Quero esmurrar o futuro flácido até ele ganir. Quero que toda a violência do homem flameje como um cometa no meu único instante de existência. Então, meus olhos brilharão como galáxias que se consomem no deserto do infinito.
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