Roberto Robadey Jr. (*)
Existe entre nós, brasileiros, o já propalado "complexo de vira-lata”. Em relação aos desastres é comum a comparação entre o desastre da Serra, em janeiro de 2011, e o desastre japonês (tsunami, acidente nuclear…), em março do mesmo ano. As pessoas costumam dizer: "No Japão já está tudo resolvido e aqui nada foi feito”.
Em março de 2012, quando o desastre japonês fez um ano, o Japão levou 120 pessoas de 24 países para visitar o que havia sido feito. Nosso subsecretário de Defesa Civil, coronel BM Jerri Andrade Pires, participou desta visita. Um ano depois, as pessoas ainda moravam em habitações provisórias (contêineres de três andares).
Em abril de 2012 tive a honra de participar, como assessor do secretário de Estado da Defesa Civil e comandante geral do CBMERJ, coronel Sérgio Simões, de um jantar na residência do cônsul do Japão no Rio de Janeiro. Na oportunidade, um policial japonês que também estava presente nos disse: "Com o desastre de 2011 foi encontrado um marco de 300 anos avisando para não construir abaixo dele, pois um tsunami havia chegado até aquele ponto! Cidades inteiras foram construídas abaixo do marco”.
Durante a Bosai 2013, Conferência Internacional sobre Desastres Naturais (Rio de Janeiro, 28/08), tive a oportunidade de perguntar a uma amiga japonesa como estavam as coisas agora, se as pessoas já tinham saído das habitações provisórias. Sua resposta, na presença do coronel Mori, secretário de Defesa Civil de Nova Friburgo, foi: "Não! A maioria ainda está em habitações provisórias. E muita gente não foi removida. O governo poderia ter removido imediatamente. Como não fez, agora é mais difícil”.
Registrei ainda o slide do palestrante Takao Hori (especialista da Jica — Agência de Cooperação Internacional Japonesa), no qual se pode observar que em termos de medidas estruturais, das 4.361 obras necessárias, apenas 532 foram concluídas! Ou seja, apenas 12,2% do total (os dados são do fim do ano fiscal de 2012).
Em Nova Friburgo, em janeiro de 2013, foi noticiada a conclusão de 29 das 251 contenções mapeadas inicialmente, ou seja, 11,6% das obras (http://www.avozdaserra.com.br/noticia/22641/concluidas-obras-de-contencao-em-areas-de-deslizamento-no-centro-e-duas-pedras)! Não é tão mal assim! Se mais duas obras fossem concluídas poderíamos comemorar estar na frente do Japão!
Ainda em janeiro, quatro grandes obras estavam começando (http://www.avozdaserra.com.br/colunas/5/9588/estado-comeca-obras-em-quatro--encostas-densamente-habitadas), elevando o número para 33 (13,9%).
É verdade que o Japão está milhares de anos-luz à frente, mas a grande diferença é cultural. E, em minha opinião, veio do sofrimento. O povo japonês, que sofreu, e muito, com o pior dos desastres — a guerra —, convive há séculos com terremotos (vários tremores por dia), tsunamis, e sabe o que fazer, quando fazer, como fazer...
Em janeiro de 2010 fizemos em Nova Friburgo a Conferência Municipal de Defesa Civil. Apesar de razoável divulgação, o público foi composto principalmente por servidores da Prefeitura. A comunidade não participou. Milito diretamente na área de Defesa Civil desde 1988, quando passei o carnaval em Petrópolis. Desde então observo que os eventos são sempre com pouca participação popular. Ao lado do desinteresse dos governantes em investir decentemente em Defesa Civil, a outra grande dificuldade sempre foi a comunidade, que em geral sempre achou que não precisa participar. Porém, como o Japão, estamos aprendendo com o sofrimento — depois do desastre de 2011, qualquer evento de Defesa Civil na Região Serrana é sinônimo de casa cheia.
Espero que os governantes comecem a investir decentemente em Defesa Civil, destinando de 1,5 a 3% dos orçamentos municipais para os órgãos que fazem prevenção e resposta, e que as comunidades entendam que sozinho o governo não faz nada nessa área.
Espero, por fim, que outras comunidades não precisem perder 900 vidas para entender a importância da Defesa Civil.
(*) Roberto Robadey Jr., coronel BM, coordenador da Defesa Civil em Nova Friburgo na ocasião do desastre climático de 2011 e atual secretário de Defesa Civil de Cantagalo
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