Nesta sexta-feira, 1º de maio, é comemorado o Dia do Trabalho, data marcada por festas, passeatas e reivindicações dos trabalhadores em várias partes do Brasil e do mundo. Neste dia especial, A VOZ DA SERRA presta uma homenagem àqueles que não fazem parte do mercado de trabalho formal mas, diariamente, se dedicam a um ofício. A reportagem ouviu dois artesãos, uma artista plástica e um baleiro que, por opção ou por não encontrarem espaço no mercado, trabalham na informalidade. E, nem por isso, deixam de ter uma rotina diária de serviço. Confira a seguir um pouco do cotidiano e da história de quatro cidadãos que são um exemplo de criatividade e luta.
Seu Cereja: tornando a Alberto Braune mais doce há 30 anos
Quem passa em frente aos números 120 e 122 da Avenida Alberto Braune sempre encontra seu Cereja vendendo suas balas e doces. José Cereja Neto, de 74 anos, faz isto não é de hoje. Aposentado como servente de pedreiro, decidiu instalar sua banquinha no local, tanto para passar o tempo como para faturar um troco extra e reforçar sua aposentadoria.
Sem ter nada para fazer, seu Cereja resolveu se entreter vendendo balas e doces na Alberto Braune. E ali permanece há 30 anos, sempre fazendo muitas amizades, dando informações e ganhando a vida honestamente. “É mais para passar o tempo, não dá para ganhar dinheiro. Mas, se vender está bom, se não vender está bom também”, comenta, sempre com um sorriso que não tem mais tamanho.
Nesse meio tempo, seu Cereja viu acontecer muita coisa na principal avenida da cidade. São tantas que ele nem se lembra. Mas cita as diversas manifestações, as posses de prefeitos e também acidentes. No dia da entrevista mesmo, na última quarta-feira, 29, ele havia acabado de presenciar um acidente que vitimou um motociclista.
O que seu Cereja vende mais são balas, paçocas, salgadinhos de milho, chicletes, amendoins e mariolas. Tem freguesia certa, entre crianças, adultos e idosos. A toda hora para alguém a fim de comprar uma bala ou um doce. E ele conhece todo mundo, da cidade inteira. Mora no bairro Bela Vista, em Olaria, e todo dia vai para o Centro, onde fica das 8h30 às 19h. A comida, ele leva de casa e almoça no interior da sapataria que fica ao lado de seu ponto de venda. O entrosamento é tão perfeito que enquanto seu Cereja almoça, o próprio gerente da sapataria se encarrega de cuidar do movimento de sua banquinha.
Casado, tem seis filhos e três netos. Nas horas vagas, gosta de arrastar o pé num bom forró. Tudo autorizado pela mulher, que fica em casa. Depois que ficou viúvo, teve 27 mulheres até se casar pela segunda vez com a atual esposa, com quem mora há 19 anos.
O baleiro é daquele tipo boa praça, que nunca briga com ninguém e vai levando sua vida, sempre fazendo novas amizades e faturando seu dinheirinho que, pelo menos, lhe garante o forró. (Eloir Perdigão)
Monique Bertão ganha a vida com
sua arte mas sonha com um emprego
A criatividade e a capacidade de transformar tudo em arte estão presentes no DNA de Monique Bertão. Filha de Teté Bertão, que marcou época em Friburgo com suas aquarelas, bicos de pena e murais, Monique herdou o talento artístico de seu pai. Só que os tempos são outros. E, para ela, certamente tem sido muito mais difícil ganhar a vida.
Não lhe falta trabalho, é verdade, mas é uma luta diária. “Tenho que estar sempre procurando, correndo atrás”, conta. Para ganhar a vida, Monique faz de tudo. Trabalhos em papier maché, marchetaria, colagens, mosaicos, dá cursos. Cria luminárias, arandelas (luminárias de parede misturando laminados de madeira com garrafas pet), caixas, painéis de fotografias, enfim, objetos belíssimos que todo mundo adora e ela não tem nenhuma dificuldades para vender.
Mas emprego que é bom (e que nunca faltou para seu pai), ela não tem há anos. “Nunca fiquei de braços cruzados, mas que um trabalho de carteira assinada me faz falta, lá isso faz - e como faz! Nem que a gente ganhe pouco, ter um fixo por mês que garanta o básico dá muita tranquilidade. Para Monique, o pior de estar desempregada é não poder fazer uma prestação e, principalmente, não conseguir pagar a contribuição ao INSS que lhe garantiria a aposentadoria. Ela até já tentou contribuir como autônoma mas não deu. “Não é fácil reservar R$ 70, R$ 80 reais todo mês. Às vezes a gente até tem mas às vezes não dá mesmo”, declara.
Seu sonho é ser convocada pela prefeitura para assumir o cargo que conquistou no concurso de 1999. Na verdade, sente saudades dos anos em que trabalhou na secretaria de Turismo. De lá prá cá, trabalhou durante anos criando artesanato com fitas decorativas para a Sinimbu, um trabalho regular e bem pago, mas que acabou. Há 15 anos também presta serviços para a Clínica Santa Lúcia criando as alegorias e fantasias do bloco Maluco Beleza.
De vez em quando tem algumas encomendas maiores, como a imagem em papier maché da santa Francisca Cabrini, que fez para a colônia italiana e está exposta na Praça do Suspiro.
“Isso tudo vai me dando fôlego para o dia a dia na esperança de que mais adiante as coisas se resolvam e eu possa voltar a ter um patrão”, declara. (Dalva Ventura)
Fazendo arte na calçada
Após oito anos de serviço, o vendedor de sapatos, Marcelo Moura, deu um basta: ou fazia algo de que gostava, ou corria o risco de se sentir frustrado para sempre. E foi assim que largou o emprego e começou a vender pulseiras personalizadas.
O assim, claro, não foi tão fácil. Primeiro, Marcelo precisou aprender a confeccionar as pulseiras, o que não foi tão difícil, garante. Assim que se sentiu seguro de suas habilidades, o agora artesão escolheu um ponto considerado tradicional para a venda de artesanato na cidade, a calçada do Instituto de Educação de Nova Friburgo (Ienf).
Seus principais fregueses são os alunos da própria escola, mas ele também se arrisca fora da cidade. Conta que num único final de semana em Copacabana, faturou o suficiente para comprar uma geladeira. Para o artesão, um dos maiores problemas enfrentados é a falta de um local adequado para que eles e outros artesãos possam vender seus produtos.
E é lá, na calçada do Ienf, que também podem ser encontrados os quadros pintados em azulejo, de Leonardo Lessa Neves, que confecciona pulseiras, pinta camisetas e faz tatuagens de henna. Mas é com sua aquarela digital, feita com os dedos, que o rapaz impressiona quem passa pela rua. Cria paisagens usando apenas os dedos, um ou outro palito e tinta líquida para rejunte, dessas usadas em obras. Ele prefere não utilizar tinta a óleo, por conta da presença de chumbo contida na mesma. A técnica, que é espanhola, Leonardo aprendeu por conta própria, após observar outros artistas fazendo o mesmo, quando era mais novo. Após algum tempo treinando em casa, e por achar que já estava na hora de arcar com os próprios custos, o artista achou que já fosse hora de arriscar-se, vivendo pela própria arte, há um pouco mais de quatro anos.
Leonardo e Marcelo ficam lá, à vontade, fazendo o que gostam, dividindo com outros o espaço, que é precário, sempre tranquilos e com um sorriso no rosto, vendo os dias passarem através da agitação presente no olhar daqueles que passam, os mesmos que acabam se encantando por seu trabalho. Alguns, como o ex-patrão de Marcelo, que acabou comprando uma pulseira, não tem muito tempo atrás. (Diego Vieira)
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