Inexplicavelmente pouco conhecida no Brasil, fora de sua área, a Dra. Nise da Silveira foi uma psiquiatra brasileira, aluna de Carl Gustav Jung. Dedicou sua vida à psiquiatria e manifestou-se radicalmente contrária às formas agressivas de tratamento de sua época, tais como o confinamento em hospitais psiquiátricos, eletrochoque, insulinoterapia e lobotomia. Foi ainda uma pioneira na pesquisa das relações emocionais entre pacientes e animais, que batizou de co-terapeutas.
No Brasil, nas décadas de 50 e 60, a psiquiatra utilizou animais na terapia de pacientes internos. Ela percebeu a facilidade com que esquizofrênicos se vinculavam aos cães.
A aproximação dos internos do Centro Psiquiátrico Pedro II no Rio de Janeiro começou por acaso quando foi encontrada uma cadelinha abandonada e faminta no terreno do hospital. Nise tomou-a nas mãos e, percebendo a atenção de um dos internos, perguntou-lhe se gostaria de tomar conta do bichinho, "com muito cuidado”. Diante da resposta afirmativa, a psiquiatra deu o nome à cachorrinha de Caralâmpia (personagem de "A terra dos meninos pelados” de Graciliano Ramos, inspirada nela). Os resultados terapêuticos da incumbência assumida pelo paciente foram excelentes. Em sua obra, a médica faz referência a outros casos em que ocorrem relações afetivas entre pacientes e animais: Abelardo, paciente temido por sua irritabilidade e força física, assumia postura tranquila e centrada quando tomava conta de alguns cães e gatos, mostrando-se apto a cuidar deles e investir afeto. Já a paciente Djanira teve sua capacidade criativa como pianista retomada por meio da relação com bichos. Nem sempre, porém, as relações eram amistosas. "Os animais recebem também projeções de conteúdos do inconsciente, que os tornam alvos de ódio ou temor excessivo”, escreveu a psiquiatra.
Em seu trabalho pioneiro com essas pessoas, a médica desenvolveu o conceito de afeto catalisado. Ela percebeu a facilidade com que esquizofrênicos se vinculavam aos cães. Ela partiu da ideia de que é importante que o paciente conte com a presença não invasiva de um co-terapeuta que permaneça com o doente, funcionando como ponto de apoio seguro a partir do qual o doente possa se organizar psiquicamente. Após ilustrar exemplos de co-terapeutas humanos, Nise afirma que animais são "excelentes catalisadores”. Segundo ela, eles "reúnem qualidades que os fazem aptos a tornar-se ponto de referência estável no mundo externo”, facilitando a retomada de contato com a realidade. (Fonte: Sabine Althausen)
Quem foi
Nise da Silveira nasceu em Maceió, em 15 de fevereiro de 1905. Sua formação básica realiza-se em um colégio de freiras — o Colégio Santíssimo Sacramento. Seu pai foi jornalista e diretor do Jornal de Alagoas.
De 1921 a 1926, cursa a Faculdade de Medicina da Bahia, sendo a única mulher a formar-se entre os 157 homens da turma. Casa-se com o sanitarista Mário Magalhães da Silveira, colega na faculdade, com quem vive até seu falecimento, em 1986. Em 1927, após a morte de seu pai, o casal muda-se para o Rio de Janeiro, onde engajou-se nos meios artístico e literário.
Em 1933, estagia na clínica neurológica de Antônio Austregésilo, e aprovada aos 27 anos num concurso para psiquiatra, em 1933 começou a trabalhar no Serviço de Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental do Hospital da Praia Vermelha. Durante a Intentona Comunista, foi denunciada pela posse de livros marxistas, o que levou à sua prisão em 1936 no presídio da Frei Caneca, por 18 meses. Neste presídio também se encontrava preso Graciliano Ramos, e assim ela tornou-se uma das personagens de seu livro Memórias do Cárcere.
Em 1944, é reintegrada ao serviço público e inicia seu trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Engenho de Dentro, onde retoma sua luta contra as técnicas psiquiátricas.
Ao recusar-se a aplicar eletrochoques em pacientes, Nise da Silveira é transferida para o trabalho com terapia ocupacional, atividade então menosprezada pelos médicos. Assim, em 1946 funda nesta instituição a "Seção de Terapêutica Ocupacional”.
No lugar das tradicionais tarefas de limpeza que os pacientes exerciam sob o título de terapia ocupacional, ela cria ateliês de pintura e modelagem com a intenção de possibilitar aos doentes reatar seus vínculos com a realidade através da expressão simbólica e da criatividade, revolucionando a então psiquiatria aplicada no país.
Em 1952, ela funda o Museu de Imagens do Inconsciente, um centro de estudo e pesquisa destinado à preservação dos trabalhos produzidos nos estúdios de modelagem e pintura que criou na instituição. Este valioso acervo alimentou a escrita de seu livro Imagens do Inconsciente, filmes e exposições. Foi, inclusive, adaptado para o cinema pelo diretor Leon Hirszman, em forma de trilogia mostrando as obras realizadas pelos internos a partir de roteiro criado por ela.
Através do conjunto de seu trabalho, Nise da Silveira introduziu e divulgou no Brasil a psicologia junguiana. Interessada em seu estudo sobre os mandalas, tema recorrente nas pinturas de seus pacientes, ela escreveu em 1954 a Jung, iniciando uma proveitosa troca de correspondência. Jung a estimulou a apresentar uma mostra das obras de seus pacientes que recebeu o nome "A Arte e a Esquizofrenia”, ocupando cinco salas no "II Congresso Internacional de Psiquiatria”, realizado em 1957, em Zurique.
Nise da Silveira estudou no "Instituto Carl Gustav Jung” em 1957 a 1958, e de 1961 a 1962. Retornando ao Brasil, formou o "Grupo de Estudos Carl Jung”. Escreveu, dentre outros, o livro Jung: vida e obra, publicado em primeira edição em 1968. Foi membro fundadora da Sociedade Internacional de Expressão Psicopatológica ("Societé Internationale de Psychopathologie de l’Expression”), sediada em Paris.
A Dra. Nise da Silveira morreu no Rio de Janeiro, em 30 de outubro de 1999.
(Trechos extraídos do Wikipédia)
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