Há exatos cem anos, quando a Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Nova Friburgo (Acianf) era criada, três setores da economia da cidade se uniam em um mesmo órgão: comércio, agricultura e indústria. Atualmente, as duas últimas se desvincularam em associações próprias. Como era Nova Friburgo quando esta associação foi criada?
Em 1917, a maior parte da população vivia na zona rural e a agricultura era a principal atividade econômica, possivelmente superando as demais. Alguns anos antes, em 1911, empresários alemães haviam instalado indústrias têxteis de passamanaria em Nova Friburgo, quando até então as fábricas no município se limitavam à produção de bebidas alcoólicas, chapéus e tamancos. No entanto, de início, essas indústrias têxteis não tinham o peso econômico que viriam a ter em meados do século 20, quando transformaram a história de Nova Friburgo, colocando o município na Era Industrial.
O impulso dado ao comércio da pacata cidade serrana foi em razão dos veranistas (foto acima) que fugiam da canícula e das epidemias de febre amarela do Rio de Janeiro, no final do século 19. Parece exagero, mas esses turistas ficavam em sua maioria durante mais seis meses na cidade, de novembro a maio, alugando residências ou se instalando em hotéis como o Engert, o Salusse, o Friburguense e o Leuenroth, que regurgitavam de hóspedes no verão.
O comércio concentrava-se na Alberto Braune (foto abaixo), outrora Rua General Argolo e na Praça Getúlio Vargas, outrora Quinze de Novembro. A sofisticação dos produtos oferecidos por alguns estabelecimentos comerciais nos leva a crer que o comércio do Centro da cidade se direcionava aos veranistas. Havia lojas comerciais com produtos requintados, como joalherias e relojoarias que vendiam brincos e bichas de brilhantes, alfinetes de ouro, pulseiras e adereços em brilhantes, argolões africanos em ouro, relógios de marcas caríssimas como um Patek Philippe, entre outros artigos de luxo.
Era possível encontrar um comércio com produtos de charcuterie e pâtisserie para os ilustres veranistas. Na Praça Paissandu existia a Charcuterie Française, de propriedade de Felix Besnard, que vendia “boudins, saucisses, crepinettes, pâte d’Italie, paté de foie de canard, paté de Pithuiers, langues fourrées, rillettes de Tours, paté de Ruffec, tripés a la mode de Caen, saucissous de Lyon, jambons, westphalie york, glaces, galantine truffée, salpicões, morcelas e salames”, descrevia um anúncio do periódico O Friburguense.
Na Guarany Store, na atual Praça Getúlio Vargas, ao lado do Willisau Center (foto abaixo), vendiam-se bombons finos da Suíça, variado sortimento de “chocolat Suchard à la vanille, biscuits Suchard, cacao soluble, deblotins vanilles, mandarines, cartons de bolons à la creme, petites croquettes santé, petites croquettés vanillé, bouteilles de calendrier perpétuel, ameixas francesas, tâmaras, uvas passas, abricot cristalino, amêndoas de Lisboa, nozes, açúcar branco e fiambres”. Muitas dessas guloseimas eram importadas da Casa Suchard, em Neuchatel, na Suíça.
No setor de bebidas podiam-se encontrar a cerveja Franziskaner pilsen e a cerveja preta inglesa. Na Casa Sá se comercializavam gêneros importados de qualidade e hors d’oeuvre, uma espécie de entrada com pratos frios. Na confeitaria de Frieda Huttig, na General Osório, variado sortimento de pudins, pão de loth, biscoitos, bolos, balas e pratos frios como saladas, maionese, entre outros acepipes.
Comida pronta naquela época, só mesmo para atender aos veranistas, que também encontravam vinhos de Bordeaux, água de Vichy, da França e a nativa cerveja Friburgo Brau. A descrição de todas essas iguarias é extraída de um jornal do final do século 19, e certamente o público-alvo desses anúncios eram os veranistas.
Podemos conhecer através da crônica de Arthur Guimarães, que, por volta de 1916, esteve em Nova Friburgo, suas impressões sobre o comércio da época. Guimarães descreve os armazéns dos portugueses negociando “em grosso” em prédios acaçapados.
Quanto aos libaneses árabes, dominavam o comércio de fazendas, armarinhos e modas (foto acima), sendo todos muito afreguesados. A colônia italiana se dedicava a alfaiataria, relojoaria, sapataria, funilaria, açougue, venda ambulante de jornais, de mármore, serviços de carpintaria e carroçaria. As padarias eram geralmente de italianos e de portugueses, com entregadores em carrocinhas.
Era um tempo em que havia, igualmente, o comércio ambulante em que levavam as mercadorias em carrinhos (foto abaixo), tabuleiros ou samburás, apregoando frutas como manga, uva, melão, jabuticaba, morangos, bananas, caqui, ameixa, melancia, marmelo e abacaxi. A confecção e venda de balaios de taquara era um comércio praticado por descendentes de escravos.
Empregados de algumas senhoras da cidade, “moleques negrinhos”, vendiam roletes de sorvete depositados em caixas de madeira com gelo. A venda de lenha era feita por cargueiros e carreiros, além de ser vendida aos feixes nas quitandas e armazéns.
O município se abastecia de leite vindo de Cantagalo, Macuco, Cordeiro e Bom Jardim, sendo esse produto transportado congelado e em barras. O comércio de laticínios era especializado, fixo ou ambulante. Nas leiterias comercializava-se leite, coalhada, manteiga e doce de leite. Moía-se o café, bem como o milho para o fubá, à vista do freguês. Muitas residências possuíam hortas em seus quintais, mas, ainda assim, os verdureiros ambulantes tinham boa clientela. A cidade respirava a comércio, como na Rua do Arco (foto abaixo).
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