Monitoramento contínuo: o preço do nosso conforto digital

O artigo de estreia da nova colunista da VOZ DA SERRA, Bia Willcox
terça-feira, 24 de outubro de 2017
por Bia Willcox
Monitoramento contínuo: o preço do nosso conforto digital
Não há como colocar o gênio de volta na garrafa. Todos serão acompanhados e monitorados pela segurança, comodidade e serviços incríveis que terão na Internet. Monitoramento contínuo - sensores, database e poder tecnológico: a regra.

"Não somos forçados a nada: oferecemos nossos dados de mão beijada, bastar pedir com jeitinho"
Quem afirmou isso foi o economista-chefe da Google, Hal Varian.

A minha humilde impressão é de que teremos que optar entre isso ou privacidade. E quem, com tantas vantagens trazidas pelo futuro, optará pela privacidade vintage?

O futuro chegou voando rasante nas macrovidas públicas e nas microvidas cotidianas, sacudindo lares, hábitos, casais e relacionamentos diversos.

E o mais genial e admirável do que estamos vivendo é que não somos tradicionalmente forçados a nada: oferecemos nossos dados de mão beijada, bastar pedir com jeitinho. Com contas em redes sociais poderosas como o Facebook ou Google, nos vinculamos a um monte de outros aplicativos, basta um clique e autorizamos tudo o que quiserem saber sobre nós, até o número do cartão de crédito! Trocamos nossos insignificantes dados (afinal quem somos nós nesse mundão?) por serviços cada vez melhores. Troca justa, não?

Perdemos o controle de quem e quantos têm os nossos dados. Uma pesquisa feita no ano passado com americanos revelou que 91% deles reconhece que perderam o controle de como e para que seus dados foram coletados. Já era.

Você tem medo? Deu frio na barriga? Provavelmente sim. Mas isso não impede ninguém de continuar se expondo, entregando seus dados e consumindo tudo de melhor que o mundo digital pode nos oferecer. É uma espécie de vício - somos adictos e nos entregamos completamente à nossa luxúria digital.

Sabemos de tudo de maior que isso significa, mas será que já nos demos conta do quanto estarmos ligados a vários computadores e mobiles está inevitavelmente mudando a maneira que teremos que nos comportar e conduzir as regras de nossos diversos relacionamentos, especialmente o amoroso?    

Eu já perdi a conta de quantos casos próximos de estresse, aborrecimento e decepção causados por descobertas indesejadas em contas ligadas, messengers ativados e arquivos na nuvem.

Homens e mulheres que descobriram traições reais (físicas) ou virtuais (o que não diminui a dor) por terem invadido contas em redes ou aplicativos de conversa de seus parceiros. Conversas desveladas em celulares e notebooks. Fotos descobertas, logins em apps de paquera são avisados  às vezes na conta do e-mail fuxicado, senhas hackeadas para checar os celulares e por aí vai. Será que os que mantêm conversas, relações e segredos estão somente exercendo a sua privacidade num tempo em que ela é escassa?

Os tempos estão tão líquidos, e ao mesmo tempo, tão solidamente pesados, que devemos ajustar nosso comportamento na esfera amorosa sob pena de o amor se tornar gasoso e evaporar.

Se a mentira antes tinha pernas curtas, hoje ela é amputada, não tem mais perna pra contar a história. Esconder em tempos de password, sign up e login é missão quase impossível.

Portanto, se privacidade é o que perdemos, voluntariamente, para vivermos as maravilhas do mundo “Black Mirror”, aceitemos que o preço é ser transparente. Será que conseguimos?

 

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