“Buracos e mais buracos, relevos, degraus, rampas mal construídas, árvores, telefones públicos, lixeiras, bancas de ambulantes, entulhos, entre tantos outros obstáculos presentes nas calçadas. Se é difícil para a gente, imagina para os deficientes físicos ou visuais”, exclama a aposentada Maria de Oliveira Barros, de 65 anos de idade.
Em tempos de eleição, muito se ouve falar sobre mobilidade urbana. No entanto, os anos passam, o governo muda e pouca atenção é dada a essa questão, tão básica e que, de certa forma, funciona como um sensor da qualidade da urbanização.
Definida como tudo o que diz respeito ao deslocamento das pessoas dentro da cidade, a mobilidade urbana é de responsabilidade do poder público, que deve garantir que seus habitantes possam exercer seu direito de ir e vir livremente, de forma rápida e eficiente. Além de facilitar e organizar o transporte público viário, ferroviário e fluvial, ela deve favorecer o transporte individual por meio de automóveis ou veículos movidos à tração humana e, claro, os pedestres.
Na prática, no entanto, a questão é bem diferente. Ivone Marques Moreira, atual presidente da Associação Friburguense de Integração do Deficiente Visual (Afridev), perdeu a visão há 30 anos, já adulta. Ela conta que teve toxoplasmose na vista esquerda e deslocamento de retina, na direita. “Fiz uma reinvenção na minha vida. Faço trovas, viajo para muitos lugares, entre outras atividades. Sou uma pessoa muito ativa. Mas, uma das minhas maiores dificuldades é andar nas ruas da cidade sozinha. O piso irregular dos passeios, bueiros e carros parados nas faixas de pedestre são os principais obstáculos que dificultam o dia a dia do deficiente. Outra questão que impede a nossa independência, embora já exista uma lei sobre isso, é a falta de cardápios adaptados nos restaurantes. Só o McDonald’s tem uma lista, em braille, colada na parede. Mas nem tem todos os produtos”, disse ela, acrescentando que “já ouvimos muitas promessas de piso tátil, sinal sonoro, construção de mais rampas, mas as autoridades, em especial a Secretaria de Mobilidade Urbana, não sabem ou fingem que não existimos”, pontua.
Wanda Maria Guebel, que também participa da Afridev, tem uma história parecida. Há 28 anos perdeu a visão, por conta de uma degeneração da vista, e hoje tem o que se denomina visão residual, que lhe permite enxergar apenas algumas cores e sombras. “No começo foi muito complicado, é claro. Mas com o tempo a gente passa a ver a vida, literalmente, de outra maneira. Sentimos mais os cheiros, o vento e os sons”, conta. Entre os pontos críticos para o deficiente em Nova Friburgo, Wanda destaca a Avenida Alberto Braune. “As lojas que colocam tapa sol e expõem produtos nas calçadas são um grande problema. A gente anda e sai esbarrando e tropeçando em tudo”, afirma.
Heraldo Cezar Cshetting, de 65 anos, é deficiente visual há dois. “Fui dormir e acordei cego. Alguns médicos dizem que tenho retinopatia diabética, outros garantem que é glaucoma”, explica. Há pouco tempo nessa nova realidade, Heraldo lembra-se de alguns episódios em que se machucou. “Estava caminhando devagar pela calçada, com a ajuda da bengala, quando bati em um monte de gaiolas. Algumas estavam no alto, acertando meu rosto, e outras no chão”, disse ele, referindo-se a uma loja, no Centro.
Há três anos, a retinopatia diabética fez com que Célio Vicentino dos Reis, de 58 anos, perdesse a visão. Otimista e de muito bom humor, ele não sonha com a cidade perfeita, mas com uma cidade para todos. “Não somos pessoas tristes ou amarguradas, mas precisamos de atenção. Apoio psicológico, adaptação dos espaços públicos, leis que permitam a inclusão dos deficientes e um pouco mais de empatia deixariam nossa vida um pouco mais fácil”.
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