Médicos da rede pública de saúde em Nova Friburgo anunciaram que irão entrar com uma ação coletiva na Justiça do Trabalho contra os cortes de até 30% nos salários promovidos, em outubro, pela prefeitura. Na última quinta-feira, 3, o Sindicato dos Médicos da Região Centro-Norte Fluminense (Simed) se reuniu para discutir o assunto e ainda indicou que a categoria poderá entrar em greve nos próximos dias, medida que afetará o já combalido atendimento nos hospitais municipais Raul Sertã e Maternidade Mário Dutra.
“Qualquer redução salarial é inconstitucional. Somente através de acordo coletivo de trabalho com efetiva participação dos sindicatos, que precisam ser autorizados pelas suas bases, é que é possível um acordo entre partes. Não houve nenhum acordo com a participação do sindicato, portanto, entendemos que a atitude da prefeitura de cortar a chamada gratificação foi unilateral, autoritária e ilegal. A gratificação por atividade hospitalar já perdura por alguns anos e, portanto, já está incorporada ao salário”, disse o representante do Simed, o médico ginecologista e obstetra Alexandre Vieiralves de Castro.
“A grande surpresa foi que durante a campanha eleitoral o atual governo dizia que a situação municipal era estável. Não queremos prejudicar a população, que sempre paga o preço mais alto, mas manifestamos o nosso luto pela saúde de Nova Friburgo e convidamos a todos que se juntem a nós na pressão ao governo atual para que ele recue e cumpra a lei”, acrescentou o médico.
Além do corte nos salários, os profissionais da saúde também reclamam das condições de trabalho no hospital e na maternidade. A VOZ DA SERRA ouviu alguns profissionais, sob anonimato, e ainda teve acesso ao “Livro de Ordens e Ocorrências Médicas”, onde a equipe do Raul Sertã relata as dificuldades enfrentadas todos os dias na unidade de saúde que recebe pacientes de 13 municípios das regiões Serrana e Centro Norte.
Os médicos contaram que a situação no hospital é dramática: faltam recursos para executar o trabalho, como medicamentos e materiais para procedimentos cirúrgicos. Eles também reclamam que a unidade não oferece alimentação adequada e não tem um local adequado para descanso da equipe que vira a madrugada de plantão. Os médicos ainda criticaram a estrutura física deteriorada do prédio (que está em obras há anos), relataram que falta iluminação em setores onde os pacientes são atendidos e até foco de luz nas salas cirúrgicas. “Eu já tive que fazer uma operação com uma lanterna”, revelou um médico que pediu para não se identificar.
A crise da saúde pública municipal é apurada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) há algum tempo. A VOZ DA SERRA apurou que uma investigação pode desencadear o fechamento da Unidade de Pronto Atendimento (UPA), no distrito de Conselheiro Paulino, importante unidade de emergência que tem sido usada para reduzir a quantidade de pacientes que buscam por atendimento no Hospital Raul Sertã. A UPA tem sido mantida pela prefeitura e o governo federal, porque há quase um ano o estado não repassa a sua parte dos recursos.
Na última quinta-feira, 3, mais uma denúncia chegou ao MP. Os vereadores Pierre Moraes e Éder Carpi (Ceará) protocolaram na 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Nova Friburgo um pedido para que o órgão apure as irregularidades nas unidades de saúde do município e também comunique ao Ministério Público do Trabalho (MPT) os cortes nos salários dos médicos.
“Uma paralisação dos médicos atinge profundamente a população. Os médicos estão corretos porque a prefeitura violou um direito trabalhista previsto na Constituição Federal. Não pode haver redução de salário, isso está, inclusive, na Lei Orgânica do município. É preciso assegurar o direito da população à saúde e também garantir os direitos trabalhistas dos médicos, pois isto é dever do estado”, disse o vereador Pierre.
O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) também se manifestou contrário aos cortes nos salários dos profissionais. Em nota, informou nesta sexta-feira, 4, que vai cobrar esclarecimentos do secretário municipal de Saúde, Rafael Tavares, e acompanhará o caso junto ao Sindicato dos Médicos, órgão responsável pelas questões trabalhistas da categoria.
Tesourada no salário
O corte nos salários do funcionalismo público municipal foi efetuado na folha de pagamento do mês passado. No último dia 5 de outubro, o prefeito Rogério Cabral publicou no Diário Oficial a portaria 685, que cortou todas as gratificações previstas na lei complementar 79/2013.
As gratificações são benefícios concedidos aos servidores de acordo com a complexidade das atividades exercidas, o grau de responsabilidade e de dedicação e comprometimento do servidor público. O benefício pago variava de R$ 250 a R$ 3 mil.
Na mesma edição do DO, a administração municipal exonerou 16 funcionários para se adequar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A medida faz parte dos cortes promovidos pela prefeitura, no último mês, para regularizar os gastos com a folha de pagamento que estão quase superando o limite de 54% do orçamento estipulados pela lei. O desequilíbrio ocorre, segundo o Executivo, por causa da crise financeira que faz minguar, há pelo menos dois anos, a arrecadação de impostos e os repasses feitos pelos governos estadual e federal.
A Prefeitura de Nova Friburgo já informou na última semana que não foi notificada de nenhuma greve dos médicos, e, ao contrário do que diz o sindicato, acrescentou que “a redução das remunerações foi definida após reunião com os representantes da classe, na qual os profissionais preferiram a redução de 30% dos rendimentos variáveis como: sobreaviso de emergência; gratificação de atividade hospitalar e salário plantão, em contrapartida de demissões”, diz a nota.
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