Mea culpa legislativo: ação e reação

Aprovados no Concurso 2015 questionam posicionamento de vereadores
quarta-feira, 23 de março de 2016
por Ivan Correia
(Foto: Ivan Correia)
(Foto: Ivan Correia)

O concurso público da Prefeitura corre o risco de ter uma de suas fases anuladas. Pelo menos se a Defensoria Pública obtiver sucesso na Ação Civil Pública  000268335.2016.8.19.0037, movida contra o município e a Exatus Consultoria, empresa que organizou o concurso. Na ação, a Defensoria pede liminar para “reconhecer a nulidade do item 4.32 do edital do concurso, excluindo a previsão do Teste de Aptidão Física, por violação da razoabilidade e da cláusula de reserva de lei (art. 37, II da CRFB)”.

A ação pede ainda, também por liminar, que, “subsidiariamente, não sendo acolhido o pedido anterior, requer a suspensão do concurso público em relação aos cargos submetidos ao TAF (agente de limpeza pública, auxiliar de serviços de sepultamento, auxiliar de serviços gerais, calceteiro, carpinteiro, guarda municipal, jardineiro, servente de obras e trabalhador braçal)”.

Aprovados na Câmara

A última sessão da Câmara na terça-feira, 22, por sua vez, funcionou como uma aula prática de Física, especialmente no tocante à célebre Terceira Lei de Newton, um dos postulados que forma o pilar da mecânica clássica: “Para toda interação, na forma de força, que um corpo A aplica sobre um corpo B, dele A irá receber uma força de mesma direção, intensidade e sentido oposto”. 

Essas aspas newtonianas caem como luva para descrever o transcorrido no plenário Dr. Jean Bazet. A “aula” começou já com a sessão quase encerrada, os vereadores se preparavam para ingressar na hora livre. Até ali, tudo transcorrera sem qualquer percalço. Sessão curta, pauta tranquila. Foi quando um grupo ingressou silenciosa e organizadamente no auditório. Portando faixas, se sentaram nas primeiras filas. Os vereadores, então, entreolharam-se.

Eram pessoas aprovadas no último concurso da prefeitura, contando com aprovados no TAF e aprovados cujo cargo não necessitam do teste físico. Passados alguns minutos, o vereador Marcelo Verly solicitou ao presidente Marcio Damazio que paralisasse os trabalhos regulares da sessão para oferecer espaço de manifestação para os presentes, perguntando se algum deles gostaria de falar na tribuna.

Paula Schautz, que passou em primeiro lugar para o cargo de professora (cargo que dispensa realização do TAF), foi a primeira ao microfone e relatou o trajeto percorrido por alguns candidatos bem-sucedidos durante a preparação. “Essas pessoas leram o edital, se prepararam, treinaram e passaram”, disse Paula, que completou: “Entendemos que nenhuma forma de voltar atrás seria justa. Refazer esse teste não seria justo”, frisou. Ela externou também a discordância do grupo presente ante a uma eventual modificação ou cancelamento do TAF. “Há pessoas que não se inscreveram em tais cargos por entenderem que não poderiam passar por aquelas provas”, completou Paula, que continuou: “Existem os aprovados. Somos nós, estamos aqui. Queremos simplesmente que o concurso caminhe dentro do cronograma estabelecido”, pontuou. 

Constrangimento

Foi quando Higor Linhares, também aprovado no concurso, subiu à tribuna e pegou os vereadores desprevenidos diante do contraste entre o tom manso de sua voz com o tom ácido de suas colocações: “Em nome dos concursados pergunto aos nobres vereadores: quais de vocês leram o edital assim que o mesmo foi publicado? Qual de vocês entendeu que aquilo ali que constava no edital não estava de acordo com os cargos que eram oferecidos?”, inquiriu.

O usual murmúrio que faz pano de fundo às falas na tribuna deu lugar a um silêncio sepulcral. Linhares estava só começando: “Vossas Excelências têm suas assessorias, seus advogados. Tudo para que possam fazer qualquer tipo de questionamento em benefício da população”, frisou. A essa altura só se ouvia o ruído do ar-condicionado, com Higor continuando: “O que causou certa preocupação é que, justamente em um momento em que o país clama por honestidade, algumas pessoas tentam se utilizar de artifícios eleitoreiros”, disse ele, sendo aplaudido pelo auditório e até por alguns vereadores.

Linhares foi explícito ao citar a sessão onde os reprovados no TAF tomaram o auditório: “A única manifestação que nós vimos aqui e onde foi dita a verdade foi a de um vereador que eu faço oposição, que é o Marcelo Verly”. Ele se referia à fala onde Verly ponderou sobre o impasse jurídico que poderia advir de um eventual questionamento do concurso na Justiça, onde algum dos grupos sairia necessariamente prejudicado, fala que foi vaiada pelo auditório. “Ouviu vaias, mas disse a verdade”, alfinetou Linhares. “Às vezes, as palmas da sociedade não são as palmas da verdade”, emendou, para depois arrematar: “Os nobres vereadores gostariam que mexessem na regra da eleição depois do pleito?”, questionou. 

Contradição?

Após Higor concluir sua fala, o primeiro vereador a se manifestar foi Zezinho do Caminhão, que solicitou a leitura do documento “Apoio aos Concursados de 2015”. O documento acabou sendo um dos motivos que levaram o grupo à Câmara para questionar a posição dos vereadores. Os mesmos se defenderam, dizendo ser o objetivo principal do documento o pedido de uma audiência com o prefeito, não a tomada de posição a favor ou contra qualquer um dos grupos.

Contudo, é importante que se lembre: o documento foi assinado por todos os vereadores manifestando “apoio irrestrito aos concursados de 2015 aprovados em prova teórica e reprovados no exame físico realizado nos últimos dias 20 e 21 de fevereiro, por considerar os parâmetros para aprovação totalmente desproporcionais às necessidades para exercício de cargos”. 

Esse fato foi mencionado no auditório, entre alguns que conversavam em voz baixa, como uma contradição na fala de alguns vereadores. “Se só queriam pedir a tal audiência e são assim tão isentos, por que assinam um documento que põe em xeque a credibilidade do TAF?”, perguntou irritado um manifestante.

Zezinho ponderou que, por outro lado, no documento fica clara, também, a importância de se preservar os direitos daqueles que passaram no teste, além daqueles que foram aprovados, mas não precisaram realizá-lo. De fato, é importante lembrar que na ocasião onde os reprovados no TAF compareceram à Câmara, as lideranças do grupo que se manifestaram foram explícitas nesse sentido, quando solicitaram a audiência com o prefeito Rogério Cabral. 

Zezinho lembrou que se um grupo se sente prejudicado e busca na Justiça um respaldo, “é algo legítimo, eles têm todo o direito”. O que se sucedeu após a leitura do documento, foi uma sequência de falas por parte dos vereadores na linha de reconhecer a importância de se preservar o direito à nomeação dos aprovados, com mais algumas intervenções dos manifestantes rebatendo as alegações de condições precárias ou excessivas para a realização do TAF.

Paula voltou à tribuna, rebatendo vereadores que questionaram a distância cobrada nas provas de salto. Ponderou sobre o funcionamento da meritocracia para ingresso no serviço público, no sentido de lembrar que o conteúdo cobrado em um concurso, sempre é abrangente e não precisa ter ligação direta e obrigatória com o cotidiano das atribuições de cada cargo.
Os vereadores alertaram sobre a impossibilidade de o Legislativo intervir diretamente no andamento do certame. Muitos rebateram a fala de Higor com igual veemência ao dizerem que não possuem nenhum interesse eleitoral com o concurso, muito menos com a criação de um impasse que hostilize as posições de aprovados e reprovados no TAF.

Mea massima culpa

O vereador Wellington Moreira divergiu e reeditou sua fala contundente com os reprovados no TAF e admitiu a necessidade dos colegas realizarem o mea culpa, no que precisou manter seu lugar ao microfone ao ser interpelado pelos colegas: “Eu ouvi vocês falarem com toda atenção. Agora é minha vez!” Foi acompanhado, novamente, pelo vereador Nami Nassif na necessidade de que a casa reconheça o erro por parte do Legislativo em sua atribuição fiscalizadora, quando da confecção do edital por parte do Executivo.

Ao final da sessão, os manifestantes reiteraram sua preocupação com as repercussões que uma ação na Justiça possa ter em seu futuro profissional. Essa preocupação, por enquanto, se concentra seus olhares na juíza Paula do Nascimento Barros Gonzalez Teles, titular da 1ª Vara Cível, onde corre a ação. No último dia 21, a juíza proferiu despacho “ao Ministério Público, com urgência, sobre a antecipação de tutela pleiteada”. Além disso, Paula também citou os réus (município e Exatus) para que se manifestem.

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TAGS: Câmara Municipal de Nova Friburgo | concurso 2015
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