De 7 a 23 de fevereiro, será realizada em Sochi, na Rússia, a 22ª edição dos Jogos Olímpicos de Inverno. Na equipe brasileira, uma atleta vai fazer o nosso coração bater mais forte: Maya Harrisson, que passou os primeiros meses de vida na simpática Duas Barras, município vizinho a Nova Friburgo. Ela compete na modalidade de esqui alpino, tendo ficado em 48º lugar nos Jogos passados, em 2010, em Vancouver, Canadá. Nesta entrevista, feita no dia 23 de janeiro pelo jornalista Márcio Madeira – que também assina a tradução, já que Maya pronuncia poucas palavras em português –, a esquiadora de 21 anos conta uma história de garra, superação e esperança de ficar entre as 40 melhores do mundo e depois, quem sabe, vir para o Brasil para encontrar sua mãe biológica. Aqui fica a nossa – dupla – torcida.
Light : Fale-nos, por favor, um pouco sobre sua história, e sua relação com o Brasil e a Região Serrana.
Maya Harrison: Eu nasci no Rio de Janeiro, mas minha mãe biológica era de Duas Barras e eu passei meus primeiros meses lá, antes de ser adotada. Então, quando tinha um ano de idade eu me mudei para a França, onde fiquei até os sete anos, quando finalmente me mudei para a Suíça, onde vivo até hoje. Na França eu morava numa região montanhosa, e não tinha muita coisa para fazer. Foi por isso que eu comecei a esquiar. Meus pais me levavam para frequentar um clube de esqui, e eu comecei a praticar aos dois anos de idade. Desde então nunca mais parei. É o que amo fazer.
Por acaso a região de sua mãe biológica também é marcada pela presença de muitas montanhas. Podemos dizer que as montanhas estão em seu DNA...
Sim, com certeza.
E você mantém algum contato com sua família biológica aqui?
Não, eu não sei praticamente nada sobre minha família. Eu sei apenas o nome de minha mãe biológica, e que ela é de Duas Barras. Não sei nada sobre meu pai biológico, mas quando tiver uma folga em meus treinamentos pretendo ir ao Brasil procurar por minha família.
Essa era justamente uma de nossas perguntas. Você então tem a intenção de conhecer a região em que viveu, e encontrar sua família biológica?
Sim, com certeza eu gostaria de visitar Nova Friburgo, Duas Barras e o Rio de Janeiro, porque desde que eu fui adotada nunca mais voltei. Eu já estive duas vezes em São Paulo para fazer testes físicos na Confederação, mas não no Rio de Janeiro.
E por que você escolheu competir pelo Brasil, mesmo sem falar português?
No início eu nem sabia que existia uma Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDN). Eu comecei competindo pela Suíça, e quando atingi um nível mais alto pude ver que havia atletas competindo pelo Brasil. Fiquei curiosa quando soube da existência da Confederação. Daí entrei em contato, e comecei a competir pelo Brasil.
Você tem as duas nacionalidades?
Na verdade eu tenho três nacionalidades. Eu sou brasileira, porque nasci aí, sou suíça, porque é onde eu vivo, e também sou canadense, porque meu pai é de lá.
Conte-nos um pouco sobre a sua rotina. Como é o dia a dia de uma esquiadora de nível internacional? Como são seus treinamentos?
Não é nada fácil. A preparação física é extenuante e por vezes dolorosa, porque é preciso fortalecer certas articulações e partes do corpo, além de desenvolver uma boa condição cardiovascular. É preciso seguir padrões de exercícios, dieta e sono, e conciliar tudo isso com as viagens e todos os problemas da distância em relação à confederação que represento. Antes das competições existe um período de estresse muito grande, e após elas eu me sinto muito cansada. Acabo indo para a cama muito cedo, ou do contrário eu não conseguiria suportar a carga de treinamento todos os dias.
E em relação aos riscos? Aqui no Brasil, pela própria falta de neve, geralmente só se fala em esqui durante os Jogos Olímpicos, ou quando alguém famoso se acidenta. Recentemente houve dois casos, primeiro com a premier Angela Merkel, e depois com o heptacampeão mundial da Fórmula 1, Michael Schumacher, que segue em coma. Os dois casos enquanto esquiavam. Você já sofreu algum acidente mais sério?
Essa é uma pergunta muito boa. Na verdade sim, eu já me machuquei seriamente duas vezes, e o suporte da confederação é muito importante para lidar com esses riscos. Após os Jogos Olímpicos de Vancouver em 2010, por exemplo, eu fiquei praticamente três anos sem poder competir em consequência dessas lesões. O primeiro tombo foi em 2010, e o segundo no ano seguinte. O tempo de recuperação é bem longo e sacrificante. Eu passei por várias cirurgias e fiquei imobilizada durante muito tempo. Na verdade eu só consegui voltar a esquiar há poucos meses, no início de setembro. Estou realmente feliz por ter voltado bem e ter conseguido minha classificação para os Jogos Olímpicos de Sochi. Até porque todos os demais classificados tiveram várias oportunidades para competir e alcançar os índices, e eu tive que fazer tudo isso em um mês. Foi um período muito difícil, mas agora eu estou olhando para a frente e pensando apenas em ir bem nas Olimpíadas.
Depois de enfrentar lesões tão sérias, você sente que ficou algum tipo de trauma, alguma insegurança quando você esquia?
Com certeza não foi fácil, e muitas vezes eu me questionei se conseguiria voltar a esquiar como antes, com confiança. Por isso eu voltei devagar, com cuidado, e estava com muito medo da velocidade. Simplesmente não conseguia esquiar solta, à vontade, como costumava fazer. Então eu me entreguei ainda mais à preparação física, forçando nos treinos para me sentir bem, me sentir forte, e recuperar a confiança. Com o corpo recuperado eu trabalhei a mente, e agora eu me sinto no melhor de minha forma. Foi um período difícil, mas felizmente já passou.
E na Suíça você recebe algum tipo de suporte da Confederação Brasileira?
Sim, eu recebo uma ajuda de custo para os treinamentos, e quando viajo em competição recolho sempre as notas dos gastos, para receber o reembolso.
Essa será sua segunda participação nos Jogos Olímpicos. Qual sua expectativa pessoal em relação a resultados?
Eu era muito jovem nos jogos de Vancouver, tinha apenas 17 anos e queria principalmente me divertir. Agora, sinto que amadureci muito depois desse período difícil de recuperação. Tenho a consciência de que minha preparação não foi completa, e que não posso pensar em medalhas nesta edição. Considerando tudo o que aconteceu, eu acredito que possa terminar entre as 40 ou 30 melhores do mundo em Sochi, e ficarei satisfeita se isso acontecer. Estou com 21 anos, ainda sou jovem, e tenho certeza que poderei me preparar melhor para outras Olimpíadas no futuro.
Corajosa e muito guerreira, Maya disputa sua segunda Olimpíada de Inverno. Estamos na torcida!
Aos 21 anos, Maya Harrison representa o Brasil no esqui alpino
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