Matérias - 5 de setembro

sexta-feira, 04 de setembro de 2009
por Jornal A Voz da Serra

Ronnie Peterson

“Pesquisar faz parte da minha natureza”

“Nunca vi um friburguense tão apaixonado”. Era assim que a chefe do hotel onde Ronnie Peterson trabalhava, na zona sul do Rio de Janeiro definia aquele rapaz. Na época, Ronnie era um estudante de Turismo e não perdia nenhuma oportunidade de demonstrar seu amor pela cidade onde nasceu. Quando se formou, foi convidado a assumir a gerência de um dos hoteis da rede, mas não pensou duas vezes antes de recusar o convite. “Quero ir embora para minha terra”, respondeu.

A possibilidade de ficar sem emprego não chegou a perturbar aquele rapaz simples, mas com uma capacidade de trabalho a toda prova. Poderia voltar a ser guia de turismo nos hotéis da cidade, como foi no passado, por exemplo. Enquanto isso, feliz da vida, retomou suas pesquisas no Pró-Memória, lugar que começou a frequentar aos 18, 19 anos.

Nem ele sabe o motivo pelo qual sempre se interessou tanto pela história de Friburgo. Talvez por achar que até muito pouco tempo ela era muito relegada ou, verdade seja dita, muito da mal contada. “Só se falava na história dos suíços, dos alemães, mas desde que comecei a ler mais sobre a origem da nossa colonização comecei a achar que tinha mais coisas além disso”, diz. O foco de suas pesquisas foi, inicialmente, o legado destes colonizadores, o que eles fizeram, para onde foram, o que deixaram e que valeria a pena ser contado. Aos poucos, Ronnie foi direcionando o objeto de suas pesquisas para um outro foco.

Voltou-se, então, para a história da Praça Getúlio Vargas, que foi o núcleo de Nova Friburgo, o local onde os primeiros colonos suíços construíram suas 48 casinhas. Ronnie até parece historiador sem nunca ter sido e sem qualquer veleidade de um dia vir a sê-lo. Mas, como em tudo o que faz, mergulhou fundo em suas pesquisas. Quando esgotou o material existente no Pró-Memória, foi para o cartório do 2º ofício, onde passou três meses transcrevendo tudo o que encontrou sobre a praça, no período que vai de 1820 a 1940.

Juntou cadernos e mais cadernos de anotações. Aí, quando chegava em casa, ia montando seu quebra-cabeças. As primeiras descobertas foram os nomes. Pouca gente sabe, mas o primeiro nome da praça foi rua Direita, depois virou Praça Princesa Izabel e, a seguir, Praça XV de Novembro até ganhar o nome que ostenta até hoje, Praça Getúlio Vargas. Num determinado momento, ela se desmembrou em duas, surgindo a Praça Dermeval Barbosa Moreira que, aliás, primeiro era chamada de Largo do Mercado, depois virou Largo da Matriz e, a seguir, Praça D. João VI, até ganhar o nome do saudoso “médico dos pobres”, em 1966.

Interrompeu as pesquisas quando foi fazer faculdade no Rio, mas levou seus cadernos e volta e meia mexia neles. Quando achava que um dado não batia, trocava e-mails com Carlos Jayme Jaccoud e sempre dava um jeitinho de ir conversar com Thereza Albuquerque Mello, no Pró-Memória.

Demorou doze anos mapeando a praça, das casinhas coloniais até o dia de hoje - quantas obras aconteceram ali, que casas eram essas, quem morou ali. A pesquisa ainda não está disponível, mas já foi, inclusive, registrada. “Estamos terminando de montar o quebra-cabeças”, diz, referindo-se às informações que conseguiu no Arquivo do Estado e na Biblioteca Nacional com as obtidas no Pró-Memória, no cartório e na Câmara. O inventário da praça está praticamente encerrado e é bem provável que vire um livro, ainda este ano.

Apaixonado pela história de Nova Friburgo

Ronnie Peterson conheceu o prefeito Heródoto Bento de Mello quando estava fazendo este levantamento. Precisava de uma planta da praça na década de 1980 e achava que Heródoto poderia ter uma cópia, como de fato tinha. Afinal, foi ele quem construiu a rodoviária urbana. O então futuro (e atual) prefeito lhe confidenciou ao pé do ouvido que seria candidato e, caso ganhasse as eleições, queria Ronnie em sua equipe.

Dito e feito. Ele foi convidado para colaborar com Nelson Bohrer e Thereza Albuquerque Mello no Pró-Memória, novidade saudada com entusiasmo por ambos. “Sabe o homem certo no lugar certo?”, pergunta Thereza, fã número um de seu novo colega, digamos assim. Ela destaca que Ronnie passava tanto tempo no Pró-Memória que as pessoas até se dirigiam a ele perguntando por isso ou por aquilo. “Os funcionários em geral pegam o catálogo para saber onde está uma determinada pasta, o Ronnie não. De tanto pesquisar, já sabe onde estão as coisas”, diz Thereza. A rasgação de seda é recíproca. “Thereza é a mãe de todos nós”, diz. Ronnie faz questão de destacar sua importância para a cidade. “Os friburguenses devem isso tudo aqui a ela. Se não fosse a Thereza, não existiria o Pró-Memória”, destaca.

Ronnie começou agora um mestrado em Patrimônio Cultural, no CPDOC, da Fundação Getúlio Vargas. Paralelamente está concluindo uma nova pesquisa, desta vez sobre a Catedral São João Batista. Aliás, ele tem encontrado muitas dificuldades para fazer o levantamento e aproveita para solicitar a ajuda de quem tiver qualquer documento histórico sobre a catedral. “Apesar de todo o esforço que tem sido feito, existem lacunas grandes não apenas no que diz respeito à história da catedral, mas na história do município, como um todo”, ressalta.

Na época em que estava fazendo suas pesquisas sobre a praça, seis livros no cartório do 2º ofício tinham se perdido e quatro se estavam se esfarelando. Como se não bastasse, uma série de livros do 1º ofício de notas datados de 1820, do coronel João José Zamith, desapareceram. Era ali que estava a escritura da matriz, que tinha se perdido e ninguém acreditava que ainda existisse.

Pesquisa daqui, pesquisa dali, Ronnie foi parar no Arquivo do Estado, no Rio de Janeiro, onde encontrou as duas plantas originais da matriz, a baixa e a da fachada, datadas de 1838. “Só tivemos acesso a estes documentos porque foram enviadas para o governo provincial junto com as plantas originais”, diz. “Este foi o grande achado e permitiu afirmar que o histórico da igreja matriz, o que o monsenhor Miranda afirmou em seu livro, estava totalmente equivocado”, garante. Na verdade, nossa matriz não levou oito anos para ser construída, e sim, 18. E mais: acabou ficando bem diferente do projeto original.

Ronnie nem concluiu o projeto da igreja e já se encontra envolvidíssimo com outro. Seus olhos brilham só de falar nos livros originais da estrada de ferro de Cantagalo, que localizou no Arquivo do Estado. Já está trabalhando no material - nada menos que 60 mil folhas - e que guardam muitos segredos sobre a história de Nova Friburgo. “Achei a galinha dos ovos de ouro”, diz.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
TAGS:
Publicidade