Em certo dia do ano 2013, uma cantora se apresentava na Praça Getúlio Vargas quando foi impedida de continuar sua apresentação por fiscais do Departamento de Posturas. A reação da classe artística e de pessoas que assistiam à cena foi imediata: mobilizados, apresentaram ao tal departamento a Lei Municipal 4.198, sancionada em novembro de 2012, que garante a “apresentação de artistas de rua nos logradouros públicos do município de Nova Friburgo”.
Em defesa de Serena, a cantora proibida, os artistas exigiram o respeito à lei. O fato gerou revolta na classe artística, que a duras penas produz cultura no país, e em particular em Nova Friburgo, uma cidade, por sinal, plena de talentos em todas, absolutamente todas as áreas e culturais: teatro, música, dança, cinema, circo, artes plásticas, literatura, e tantas outras expressões artísticas. Tais manifestações não podem, não devem ser cerceadas, limitadas, sofrer quaisquer interferências, censura, seja do poder público ou da sociedade. Trata-se, aqui, do pleno direito de expressão, exercício da cidadania, do livre pensar. Podemos falar, contar, ou cantar. Ou o que for.
A questão da apresentação dos artistas de rua foi discutida durante muito tempo pelo Conselho Municipal de Cultura e demorou para virar lei. Nova Friburgo foi o segundo município do estado a aprovar lei neste sentido, fora a capital, seguindo o princípio de liberdade de expressão da Constituição Federal. E diz: “As manifestações culturais de artistas de rua no espaço público aberto, tais como praças, largos, boulevards, entre outros, independem de prévia autorização dos órgãos públicos municipais”. Era o que fazia Serena, em suas apresentações a céu aberto, gratuitas para os espectadores, mas recebendo doações espontâneas, o que é permitido pela lei.
Serena, 32 anos, é mineira nascida em Belo Horizonte e mora em Friburgo desde 1998. Começou a tocar na praça em 2010, na época com o então marido, que tocava violão. Ela cantava acompanhada de playback, até que começou a tocar violão também. “Passamos a fazer apresentações em restaurantes e festas. Quando me separei, em 2013, passei a me apresentar sozinha, o que não foi fácil porque não tinha carro. Então, tinha que carregar equipamento no ônibus, com a ajuda da Maria”, contou. Maria é a filha mais velha de Serena, de 17 anos. Completando a família de Serena vêm Rubi, 16, Mateus, 13, e Agnus, 11.
Ela lembra que foi neste mesmo ano que ocorreu o problema com a Postura. “Muitas vezes eu ia pra praça contando de levar mantimentos para meus filhos, com meu trabalho na música. Mas, aí, era barrada, e em nenhum momento tentavam compreender minhas necessidades, o porquê da minha atividade ali, nas ruas, nas praças. Não havia um único gesto de gentileza, nunca. Mesmo assim, eu arriscava”, contou.
Certo dia, ela lembra bem, “aquele rapaz que é vocalista da banda O Vazio, o João, junto com outro rapaz, me entregou um documento que autoriza o artista de rua a exercer sua arte em locais públicos. Mesmo assim os funcionários continuaram a perturbar. Até que uma pessoa de autoridade reconhecida dentro da prefeitura interferiu. Desde então, vejo crescer o número de artistas de rua em Friburgo. Isso é só um resumo das dificuldades que o artista de rua enfrenta”, revelou Serena.
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