A Justiça teve que intervir para que novos funcionários fossem contratados para cuidar de crianças e adolescentes que vivem em situação de risco na Casa de Acolhimento Vila Sorriso, no distrito de Mury. Segundo uma cuidadora que já trabalhou na unidade, estava cada vez mais difícil dar conta de atender todos os abrigados porque, há algum tempo, os serviços estavam acumulando devido à falta de mão de obra na casa.
“O combinado era que nós trabalharíamos 24 horas e descansaríamos nas 72 horas seguintes, em regime de plantão. O problema é que depois a jornada mudou: passamos a trabalhar um dia inteiro e a descansar dois dias. A situação piorou quando a escala mudou, de novo, de 24 horas de trabalho com um dia de folga. Ou seja, eu não estava conseguindo descansar direito porque o trabalho acumulava depois que vários funcionários começaram a deixar o abrigo”, disse a mulher que preferiu não se identificar. Para atuar na Vila Sorriso, os cuidadores recebem aproximadamente um salário mínimo.
O abrigo foi criado em 2013 após uma ação civil pública do Ministério Público que extinguiu, a partir de 2005, as antigas casas de passagem, por diversas irregularidades, em Nova Friburgo. O projeto foi reformulado e a unidade atual é gerida pela Prefeitura de Nova Friburgo e abriga cerca de 20 crianças e adolescentes, de zero até 17 anos, que perderam o vínculo familiar ou sofreram algum tipo de violência. O abrigo funciona em uma casa ampla e acolhedora, em um sítio cercado pela natureza, em Mury.
“As crianças e os adolescentes são cuidados como nossos filhos. Eu dava banho, alimentava, ajudava com as atividades escolares e até lavava as roupas deles. Nos últimos dias em que eu trabalhei lá, um bebê de 28 dias foi acolhido pela unidade. Imagine o quão delicado e difícil é cuidar de uma criança nesta fase?”, contou a ex-cuidadora. “Todos eles recebem alimentação balanceada, têm acompanhamento educacional e psicossocial. Muitos jovens vivem lá em situação melhor do que em suas antigas casas. O problema é a equipe para cuidar deles era insuficiente. O ideal seria oito cuidadores, mas havia somente quatro”, revelou a mulher.
Na última semana, o juiz Eric Scapim Cunha Brandão, titular da 1ª Vara da Infância e Juventude e do Idoso da Comarca de Nova Friburgo, determinou que a prefeitura publicasse, no prazo máximo de dez dias, decreto nomeando quatro novos cuidadores para começarem a atuar na Vila Sorriso, sob pena de multa diária de R$ 5 mil. A medida foi tomada durante audiência que contou com a presença do prefeito Rogério Cabral.
O Ministério Público estadual, autor da ação civil pública, havia formulado requerimento de tutela de urgência para nomeação dos profissionais, alegando que o número atual de cuidadores não atendia às necessidade da unidade.
“Determino a colocação de outros quatro cuidadores na Casa de Acolhimento Vila Sorriso, bem como a publicação dos decretos que nomeiam os novos quatro cuidadores imediatamente, devendo os empossados iniciarem suas atividades no prazo de dez dias a contar da publicação das respectivas nomeações, sob pena de multa diária de R$ 5 mil, a fim de completar o número de cuidadores do estabelecimento”, decidiu.
O magistrado também estabeleceu prazo de 15 dias para que o município apresente levantamento detalhado em relação às convocações dos aprovados no concurso realizado em 2015. Segundo o MP, o concurso previa 409 vagas, mas somente 288 foram preenchidas.
“Outrossim, foi fixado o prazo de 15 dias para que o município apresente levantamento detalhado quanto as convocações para os demais cargos previstos no artigo 8.º do decreto 203/2013, inclusive especificando se algum cargo não foi provido por falta de aprovados, bem como quais os cargos que foram abrangidos pelo termo de ajustamento de conduta celebrado com o Ministério Público por meio da promotoria de Justiça de Tutela Coletiva”, assinalou.
Em outra ação civil pública movida pelo MP, o mesmo juiz determinou que o município adote as providências necessárias para garantir a alimentação das crianças e adolescentes, na Vila Sorriso, todos os dias da semana, depois que uma comissão do juizado constatou que os abrigados ficavam cinco dias da semana (segunda, quarta, sexta, sábado e domingo) sem refeições. Só havia cozinheira no abrigo às terças e quintas-feiras, porque a outra profissional deixou de trabalhar na instituição por causa do término do seu contrato de trabalho.
“As crianças e adolescentes acolhidos na instituição Vila Sorriso estão vivenciando uma situação que atenta ao princípio da dignidade da pessoa humana”, narra um trecho da ação do Ministério Público.
O que diz a prefeitura
Em nota, a Prefeitura de Nova Friburgo informou nesta quinta-feira, 4, que os novos cuidadores, aprovados no último concurso público, já foram convocados para tomar posse nos cargos nesta semana. A Secretaria Municipal de Assistência Social esclareceu que a Vila Sorriso já “conta diariamente com duas cozinheiras concursadas e um auxiliar de cozinha que comparecem regularmente à instituição das 8h às 17h, se revezando de domingo à sábado, para garantir o preparo das refeições dos abrigados (café da manhã, almoço, lanche e jantar)”, diz a nota.
A prefeitura também explicou que as últimas convocações do concurso público foram realizadas para as substituições dos funcionários temporários por concursados. “Ocorre que alguns candidatos não compareceram às convocações ou não aceitaram as nomeações para os cargos, o que demandou novas pequenas convocações. Houve, ainda, convocações de profissionais para atuarem na Vila Sorriso. Os demais candidatos, dentro do número de vagas oferecidas, serão convocados de acordo com a conveniência e oportunidade da administração pública. Lembramos que o prazo de validade do concurso é de dois anos, podendo ser prorrogado por igual período”, informa a nota.
(A resposta da Prefeitura de Nova Friburgo foi atualizada por A VOZ DA SERRA nesta sexta-feira, 5, às 13h.)
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