Gabriel Rony Rocha Cerqueira, natural de Porto Seguro, na Bahia. Em comum com a maioria dos garotos de sua idade, o sonho de jogar futebol profissionalmente. Com este objetivo, o jovem de apenas 14 anos deixou o Nordeste para tentar a sorte no Rio de Janeiro. Depois de passar por Flamengo e Botafogo, o meia chegou ao Friburguense no início deste ano. "Eu saí da Bahia com 12 anos e fui morar no Rio de Janeiro em busca do meu sonho. Fiquei seis meses no Flamengo e um ano no Botafogo. Conheci o Siqueira e ele me trouxe para Nova Friburgo”, conta.
O garoto compõe o grupo de jogadores do Friburguense que disputa o Campeonato Carioca na categoria infantil a partir deste sábado, 12. A estreia aconteceu no último sábado contra o Vasco, no estádio Eduardo Guinle. Os resultados não foram os melhores: a equipe juvenil perdeu por 2x1, enquanto o infantil, de Gabriel, foi goleado por 6x0. A tabela prevê jogos em dois turnos, Taça Guanabara e Taça Rio, no sistema de ida e volta sempre aos sábados, até 25 de outubro. "Vou jogar o Carioca pelo clube e pretendo ter um bom futuro por aqui. Estou gostando bastante. A estrutura aqui é parecida com a do Botafogo. A atenção, alimentação, alojamento e união dos jogadores são melhores. A gente cria um vínculo maior com o clube.”
O discurso de gente grande não esconde um obstáculo comum aos jovens atletas: a saudade da família. Muitos deles, inclusive, abandonam a carreira ainda no início por não resistirem à distância. Os pais de Gabriel o acompanharam enquanto puderam. O pai abriu mão dos negócios de sua empresa, e a mãe, professora, dos empregos na Bahia. Ambos alugaram um apartamento no Rio de Janeiro e moraram com o filho até o final de 2013.
"Nunca fiquei longe da minha família. Tem dois meses que minha mãe foi embora e me deixou no alojamento. No dia 9 foi o aniversário dela e, pela primeira vez, eu passei longe. É algo diferente, acordei triste por isso. Mas faz parte. Ela fala comigo diariamente, pergunta como foi o treino, se eu fiz gol e se joguei bem. É o meu sonho, e tenho que lutar por ele. Se tudo der certo, eu trago a minha família para morar comigo e tudo volta ao normal.”
Gabriel parece decidido a seguir carreira longe de casa, e revela que não pretende voltar a jogar na Bahia. "Pretendo jogar fora da Bahia. Lá existe muita panelinha e nunca me deram uma oportunidade. Escolhi o Rio de Janeiro e estou indo bem. Por ter apenas dois clubes grandes, as dificuldades são bem maiores. A concorrência é enorme.”
Sem recursos, clube investe na base
Sem grandes recursos desde o rebaixamento, em 2010, o Friburguense centralizou os investimentos na base. Ao todo, o clube trabalha com 70 jogadores nas categorias infantil, juvenil e júnior. Diariamente, são servidas cerca de 160 refeições — café da manhã, almoço, jantar e lanche. O Tricolor conta com 25 jogadores de Nova Friburgo e cidades vizinhas no juvenil e outros 27 no infantil. Na categoria júnior, são 12 atletas de municípios distantes.
O clube mantém uma casa alugada no Parque São Clemente, a menos de 150 metros do estádio Eduardo Guinle, onde moram os jogadores de fora da cidade. O Friburguense oferece assistência médica, odontológica, psicológica e outros tipos de acompanhamento, com o objetivo de ser oficialmente reconhecido como clube formador. Desta forma, os contratos firmados garantiriam um respaldo maior para evitar o assédio aos jovens atletas até os 16 anos.
"Queremos ser um clube de referência, para termos a questão do contrato de formador. Estamos avançando bastante nesse sentido, e será bom tanto para o clube quanto para o jogador. A gente trabalha mais com o pessoal da região. O Friburguense aloja no máximo três jogadores no infantil e cinco no juvenil de fora do estado. Em um grupo de 30, a maioria é da cidade e dos municípios da região.”
Recentemente, o Friburguense firmou uma parceria de cooperação com a Universidade Estácio de Sá. O clube terá à disposição o serviço de fisioterapia e o apoio de alunos formandos em Educação Física. "O objetivo é dar um apoio ao clube fora do campo. Vamos oferecer estágios aos alunos e dar um suporte ao Friburguense desde a base ao profissional em nossa área de atuação, que é a Educação Física e a Fisioterapia. Eles serão escolhidos e avaliados por mim, e em seguida indicados ao Sávio (coordenador da base do Friburguense). Ele vai indicar em qual categoria cada estagiário vai atuar, de acordo com a necessidade. O clube adquire uma maior quantidade staff”, explica o professor Claudio Cirto, que atuará como preceptor entre a faculdade e o Friburguense.
Um drible na realidade
Mesmo com uma boa estrutura, os caminhos até a assinatura de um contrato profissional são sinuosos. Gabriel e os companheiros terão que vencer a cruel realidade brasileira para chegar ao profissionalismo: cerca de 90% dos jovens não conseguem espaço nas equipes principais ao atingir a idade limite. Outros desistem no meio do caminho, ou são iludidos por propostas e projetos que não se concretizam.
"No processo entre infantil e juvenil, existe uma relação mais tranquila. No entanto, a partir dos juniores, começa o deslumbramento com outras propostas. Eles são iludidos e acabam desistindo. Existe também a questão de conciliar o futebol com os estudos, e muita gente desiste por isso. É um processo de renúncia e o pessoal desiste mesmo. A gente perde muitos jogadores da cidade por isso, às vezes porque o Friburguense não é muito valorizado.”
Os investimentos feitos nos últimos anos começam a render os primeiros frutos ao Friburguense. Destaque pelo bom desempenho no estadual de 2014 com apenas 17 anos de idade, o atacante Luis Felippe despertou a atenção de vários clubes grandes do país. Botafogo, Fluminense, Flamengo, Palmeiras, Atlético-MG, Cruzeiro, Grêmio e Internacional sondaram a situação do jogador junto ao Tricolor da Serra. O Colorado apresentou a melhor proposta e deve levar o jovem friburguense por empréstimo por dois anos com prioridade de compra — o valor do passe ainda será definido.
"Ele é um jogador que tem um potencial muito grande e que vinha sendo muito procurado. Analisamos a situação e vimos que o melhor era o empréstimo. É onde o Friburguense pode ter uma receita”, explica o gerente de futebol José Siqueira.
No Carioca deste ano, Luis Felippe marcou quatro gols no time principal e balançou as redes cinco vezes nos juniores. O atleta chegou a fazer testes no Cruzeiro em 2013, mas não se adaptou e retornou ao Friburguense.
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