Independência ou Morte, uma boa leitura

sexta-feira, 14 de setembro de 2012
por Jornal A Voz da Serra

Carlos Emerson Junior

Terminar a leitura, em pleno feriado do dia 7 de setembro, do famoso livro “1822”, do escritor e jornalista Laurentino Gomes, editado pela Nova Fronteira, foi mera coincidência ou seria apenas um recurso deste colunista que vos digita para iniciar um novo assunto? Bom, que importa mesmo é que a obra, que tem como subtítulo a sugestiva frase “como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram D. Pedro a criar o Brasil – um país que tinha tudo para dar errado”, é uma ótima e obrigatória aula de história para brasileiros de todas as idades.
Discutir os rumos que o país tomou 190 anos após a Independência é um exercício fascinante e base para traçar o futuro. Precisamos compreender nossas origens para não repetir os velhos erros de sempre. Aliás, e a propósito, quem aprendeu no ensino básico um pouco mais do que a mera descrição do famoso quadro do José Américo, ou seja, Dom Pedro I às margens do riacho Ipiranga, montado em um belo cavalo branco, com a espada desembainhada, no centro da tropa, bradando a célebre frase “Independência ou Morte”?
Pois é, para a maioria dos brasileiros, o assunto se encerrou aí e a vida seguiu seu rumo. E esse é o mérito de “1822”, contar de forma jornalística, e sem abandonar o rigor histórico, que nada foi fácil, pelo contrário, precisamos inclusive criar um exército e uma marinha do nada para lutar contras as tropas portuguesas que se mantinham leais ao governo de Portugal. 
A independência não foi só uma conspiração palaciana ou um acordo de nobres portugueses. O autor do livro deixa bem claro que “entre fevereiro e novembro de 1822, milhares de pessoas perderam a vida em roças, morros, mares e rios em que se travou o conflito. O número de combatentes foi maior do que o das guerras de libertação da América espanhola na mesma época. Só na Bahia mais de 16.000 brasileiros e aproximadamente 5.000 portugueses trocaram tiros durante um ano e quatro meses”.
Na introdução, Laurentino Gomes adverte: “No ano de sua independência, o Brasil tinha tudo, de fato, para dar errado. De cada três brasileiros, dois eram escravos, negros forros, mulatos, índios ou mestiços. Era uma população pobre e carente de tudo, que vivia à margem de qualquer oportunidade em uma economia agrária e rudimentar, dominada pelo latifúndio e pelo tráfico negreiro. O analfabetismo era geral. De cada dez pessoas, só uma sabia ler e escrever. Os ricos eram poucos e, com raras exceções, ignorantes”.
O mais curioso é que a elite que proclamou a independência, D. Pedro I inclusive, abominava a escravidão. Em um documento, datado de 1823 e guardado até hoje no Museu Imperial de Petrópolis, o já então imperador bate duro: “Ninguém ignora que o cancro que rói o Brasil é a escravatura, é mister extingui-la.” Como sabemos, o Brasil dependia inteiramente da mão de obra escrava e a abolição dessa prática vergonhosa só foi possível 66 anos depois e acabou sendo responsável pelo advento da república. 
Os personagens são retratados sem o menor pudor. A Princesa Leopoldina era culta, educada e foi fundamental na Independência, mas era feia e desleixada. Dom Pedro, uma espécie de Casanova dos trópicos, logo se envolveu com a Marquesa de Santos, talvez uma das primeiras lobistas da então nascente política brasileira. O próprio imperador, mulherengo e grosseiro, contraditoriamente amava as ideias liberais e é dele a constituição de 1824, uma das mais modernas da sua época.
A leitura atenta do livro mostra que o Brasil deu certo como nação, mas deixa bem claro que todos os principais movimentos que moldaram nosso país foram iniciativas da elite política, visando sua própria sobrevivência. Os três séculos de escravidão deixaram marcas indeléveis na economia e na sociedade e o baronato, nobres e ricos pouco instruídos que controlavam os grotões, praticamente ainda se perpetua. 
O historiador americano Gordon S.Wood, citado por Laurentino Gomes em seu “1822”, disse que “entender o passado em toda a sua complexidade é uma forma de adquirir sabedoria, humildade e um senso trágico a respeito da vida”. Concordo plenamente e não tenho a menor dúvida que o Brasil só será completamente independente quando conseguirmos diminuir ou eliminar as desigualdades sociais e levar a educação para todos os brasileiros. 
Conhecer a nossa história é um bom começo.

carlosemersonjr@gmail.com

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