Histórias Verídicas - AS LADRAS INOCENTES

por Mario de Moraes
sexta-feira, 04 de julho de 2008
por Jornal A Voz da Serra

Antes de chegar à Seção de Roubos e Furtos do antigo Segundo Distrito em Copacabana (Guanabara), o inspetor Nilo de Oliveira passou em frente ao xadrez de mulheres. Decaídas, ladras, assassinas, deitadas pelo chão, na maior promiscuidade possível, aguardavam remoção para a penitenciária.

O inspetor viera a chamado do comissário José Lúcio para resolver um caso de furto. Haviam se apossado dos anéis de brilhantes de uma senhora de importante sobrenome, e esta acusava duas jovens vendedoras de uma loja próxima.Um bando de colegas das moças e muitos curiosos aglomeravam-se à porta da delegacia, aguardando o desenrolar dos acontecimentos. Assim que chegou à seção que chefiava, Nilo de Oliveira tratou de ouvir a vítima. A mulher contou-lhe que entrara num magazine, naquela mesma rua, para comprar meias. Ao examiná-las, retirara os anéis dos dedos. Escolhido o artigo, comprara um par e só na rua dera por falta das jóias. Regressara apressadamente, mas os anéis tinham sumido de cima do balcão. Como a demora fora pouca, entre sair e voltar, somente as duas vendedoras poderiam ter furtado as jóias.

Num canto da sala duas mocinhas choramingavam, protestando inocência em frases entrecortadas de soluços. O inspetor resolveu interrogá-las. Mas, para isso, pediu que as demais pessoas se retirassem da sua sala. O interrogatório, a portas fechadas, demorou apenas alguns minutos. Findos os quais, Nilo de Oliveira apareceu, anunciando que ia dar uma espiada no local do furto. Contra a vontade do gerente da loja, que insistia em ter revistado tudo, de ponta a ponta, sem nenhum resultado.

Não foi fácil chegar ao balcão de meias, pois o bloco de curiosos não queria perder um só movimento do policial. Auxiliado por um investigador, Nilo de Oliveira passou a examinar caixa por caixa, balançando-as, na esperança de que os anéis tivessem caído dentro de uma delas. Lá para a décima, ouviu um barulhinho característico. Aberta a caixa, foi comprovada a sua teoria: no fundo da mesma, misturadas com as meias, estavam as jóias desaparecidas.

A dona dos anéis quase teve um colapso. E foi chorando, tremendamente arrependida, que ela pediu perdão às duas balconistas, chegando mesmo a oferecer-lhes dinheiro para passarem melhor o Natal, já que faltavam apenas dois dias para a festa máxima da Cristandade.

Esta foi a reportagem publicada na época em vários jornais cariocas.

Mais de 50 anos são passados e só agora é contada, pela primeira vez, a verdadeira versão do caso.

Voltemos à sala do inspetor Nilo de Oliveira, justo quando ele interrogava as duas jovens vendedoras. Frente ao experimentado policial, que lhes falava de forma persuasiva, não tendo ninguém por testemunha, as pequenas terminaram confessando. Deslumbradas com as valiosas jóias, num instante de irreflexão, tinham furtado os anéis da madame. Depois, com medo, haviam negado. Nilo de Oliveira pediu-lhes os anéis de volta. Uma delas retirou-os do sutiã, entregando-os ao policial.

E foi nesse exato momento que a triste imagem do xadrez de mulheres voltou à mente do inspetor. Só que desta vez, no meio das detentas, Nilo de Oliveira imaginou as duas vendedoras, jovens de 18 anos de idade, misturadas à pior escória da sociedade.

A solução humana não poderia ser aquela. Por isso, o inspetor explicou às mocinhas que ia livrá-las da cadeia, mas que elas deviam esquecer o que havia acontecido, prometendo-lhe nunca mais repetir a desonesta façanha.

A seguir, foi à loja em companhia de um investigador de sua inteira confiança. No caminho, discretamente, passou-lhe os anéis, pedindo-lhe que os escondesse disfarçadamente numa das caixas de meias. Onde terminou por “encontrá-los”...

Hoje aquelas duas mocinhas são senhoras bem casadas e felizes, já avós, esquecidas totalmente daquele 23 de dezembro em Copacabana.

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