CABELOS BRANCOS
Foi há muitos anos que Augusto Guiringelli me contou esta história, passada ao tempo da Segunda Guerra Mundial. Na época ele, que era italiano, vivia em seu país, envolto no grande conflito. Todos o conheciam por Pipa. Isto porque Augusto passava quase todo tempo com uma pipa (cachimbo) nos lábios. Ele era um jovem partigiano, combatendo os nazi-fascistas nas montanhas do norte da Itália.
Esses valentes brigavam a favor dos aliados, na base da guerrilha, vivendo quase todo o tempo escondidos no mato, passando por toda sorte de privações, além de enfrentar a morte a cada instante. O grupo de Augusto, ajudado pelos norte-americanos, combatia na região de Ossola, mais tarde palco de um filme que teve, como tema, justamente a história que vamos contar. Alan Ladd foi o ator principal dessa película.
Os guerrilheiros viviam de forma perigosa e bem dura, combatendo debaixo de chuvas torrenciais - comuns naquela região, dormindo ao relento, tiritando de frio, passando até fome, mas nunca esmorecendo o ódio que tinham pelos cruéis inimigos. Havia um consolo: a maioria da população das cidades onde lutavam os ajudava, dando-lhes guarida, alimento e roupas.
A má sorte os alcançou em Stresa. As tropas alemãs souberam que eles estavam escondidos naquela cidade e a cercaram totalmente. Trinta dos guerrilheiros foram presos. Eles sabiam a triste sina que os aguardava. Seriam torturados e, depois, fuzilados. Um dos companheiros de Augusto, chamado Gino, sofreu toda sorte de tortura. Arrancaram-lhe, inclusive, uma a uma as unhas dos pés e das mãos, cortaram-lhe a língua (porque ele negou-se a denunciar onde era o esconderijo dos guerrilheiros), furaram-lhe os olhos e o penduraram, agonizante, numa árvore. No peito do valente guerrilheiro, pregaram um cartaz que dizia : "Este será o vosso fim."
Depois de interrogarem barbaramente os trinta guerrilheiros presos, os oficiais da SS os levaram para uma praça, onde foram fuzilados frente à estarrecida população de Stresa. Algumas rajadas de metralhadoras, corpos tombando inertes no chão. E os militares alemães se retirando como sempre, sem se preocuparem com os cadáveres.
O povo da cidade esperou, prudentemente, que os nazistas fossem embora, antes de recolherem seus heróicos compatriotas. E foi aí que descobriram, para surpresa geral, que um dos guerrilheiros estava vivo. Só por milagre ele não fora morto pelas balas dos fuzis alemães. Mas caíra junto com os demais, fingindo-se de morto, com o sangue dos companheiros empapando suas roupas. Não movera um só músculo, nem quando um oficial da SS veio verificar se algum deles ainda respirava, para dar-lhe o tiro de misericórdia.
Segundo Augusto Guiringuelli, algo muito estranho aconteceu com esse sobrevivente. O rapaz, salvo pela ajuda divina, em poucos dias estava com a cabeça totalmente branca.
Existe um caso semelhante na história do nosso país. Aconteceu com o poeta Alvarenga Peixoto, considerado cúmplice de Tiradentes, na Conjuração Mineira. Preso nos imundos subterrâneos da Ilha das Cobras, ao lhe comunicarem a sua sentença de morte, ele foi vítima de forte choque nervoso. Em apenas uma noite, seus negros cabelos ficaram totalmente brancos ! Pela manhã, ao vê-lo, o carcereiro se espantou : "Como envelheceste, senhor, de ontem para hoje !" O poeta tentou sorrir e comentou : "A natureza é justa, amigo. Eu devia morrer velho mas, como os homens me condenaram ainda moço, apressou-se a morte em me envelhecer."
Deixe o seu comentário