Vida saudável, bem-estar, alimentos naturais. Estes são temas corriqueiros num bate-papo descontraído, num encontro casual, numa roda de amigos. Parece que todo mundo está decidido a viver mais e melhor. E o que não faltam são campanhas veiculadas em todos os meios de comunicação, em palestras, entrevistas, programas de rádio e televisão. Afinal, saúde é uma das cinco maiores preocupações do brasileiro, segundo pesquisas.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o combate à obesidade infanto-juvenil é uma das prioridades de saúde pública, uma campanha criada e liderada pela primeira-dama Michele Obama. Já no Brasil, a médica pediatra e sanitarista Zilda Arns salvou centenas de vidas combatendo a desnutrição infantil, através da Pastoral da Criança, entidade que fundou em 1983.
Como se pode concluir, ter hábitos alimentares saudáveis salva vidas, desde a primeira infância até a vida adulta, da desnutrição à obesidade. Por isso, “a Pastoral da Criança, desde o início, teve a preocupação não só de reduzir a mortalidade infantil e a desnutrição, mas também de promover a paz nas famílias e comunidades, pelas atitudes de solidariedade e a partilha do saber a todas as famílias”, defendia Zilda.
A intervenção nestes dois casos, por sinal, opostos — desnutrição e obesidade — diferem em sua proposta, mas a finalidade, é a mesma: alimentos naturais na mesa.
Viver mais e melhor
A friburguense Lúcia Maria Bastos, comerciante, 45 anos, substituiu, paulatinamente, alguns itens de seu cardápio. No café da manhã, inseriu frutas (mamão, sucos), bolacha no lugar do pão, iogurte em vez de leite, queijo minas no lugar da manteiga, “e um cafezinho pra arrematar”. No almoço, mais salada: folhas, tomate, verduras. Menos carne vermelha, mais peixe e frango, fritura nem pensar.
“Eu era viciada em bife com fritas, um prato que demorei muito para tirar da minha mesa. Essa mudança foi a mais difícil, levei quase um ano para abolir completamente. Hoje, só de sentir o cheiro de fritura sinto enjoo, mas bife, confesso, ainda como de vez em quando. Devagar e sempre, me reeduquei e perdi 15 quilos, sem fazer uma dieta específica. Me livrei dos maus hábitos alimentares, combino saúde e sabor, mas fico atenta aos preços porque os naturais são mais caros. Dificilmente compro os orgânicos que são mais caros ainda. Enfim, o que importa é que lá em casa, agora, não faltam frutas, legumes e verduras”, disse Lúcia.
No Brasil, cresce o número de novas empresas voltadas para a produção de alimentos orgânicos, sem lactose, nem glúten, gordura. Nesse setor, o Brasil já é o quinto maior mercado de alimentos e bebidas saudáveis, com volume de vendas de US$ 27,5 bilhões em 2015, segundo levantamento da Euromonitor International (agência internacional de pesquisa e análise de mercado). O crescimento do segmento chama atenção: de 20%, em média, desde 2012, contra 8% no resto do mundo.
Relatório da Euromonitor divulgado recentemente mostra que 28% dos brasileiros consideram o valor nutricional o mais importante na hora de consumir um produto, enquanto 22% dão preferência a alimentos naturais e sem conservantes.
É a partir dessa tendência que surgem os produtos “da moda”, entre eles, os sucos detox, que são prensados a frio, comercializados em poucas grandes cidades e com data de validade curta.
Nutricionistas apontam uma crescente procura por snacks, barras de cereais e mix de frutas e nozes, assim como de geleias sem açúcar. “Outro nicho interessante são os sucos orgânicos ou sucos com menos conservantes, que misturam diversas frutas, assim como as bebidas de grãos ou cereais, com arroz, soja e aveia, que podem ser encontradas no varejo”, destacam.
A fisioterapeuta Gláucia Monteiro, 37 anos, engrossa esse grupo de pessoas. Ela começou a adotar uma alimentação balanceada antes mesmo de terminar a faculdade. “Comia de tudo na juventude, e não engordava. Na época achava que estava tudo bem, que podia continuar naquele ritmo, sem considerar a qualidade do que consumia. Mas, nos primeiros meses do curso, notei que comia mal e comecei a ser mais criteriosa e diminuir a quantidade, o tamanho do pratos. Só então percebi que era bem gulosa”, conta, rindo.
Orgânico: é mais caro, mas compensa
Enquanto as grandes empresas de alimentos industrializados dominam a logística e a distribuição, muitos dos alimentos mais saudáveis, como por exemplo os sucos, ao serem menos processados, têm prazos de validade curtos e contam com outros canais de distribuição, incluindo varejistas menores, lojas especializadas, comércio eletrônico e até entregas em domicílio, como no caso dos sucos detox.
Supermercados e lojas de varejo que abrem espaço para produtos naturais e orgânicos costumam colocar margens elevadas, dificultando sua venda e, consequentemente, atrapalhando a formação de novos consumidores. No caso dos hortifrutigranjeiros, os pequenos produtores, com produções limitadas, preferem comercializar nas feiras municipais. A negociação dos orgânicos com os varejistas ainda está sendo construída, pois trata-se de um relacionamento às vezes complicado.
O casal Jovelina e Luís Paulo Fonseca produz orgânicos no distrito de Amparo, no Sítio Cultivar. A propriedade, de seis hectares, tem grande potencial para a produção, como água pura, terra fértil e barreiras naturais de proteção. Lá, a produção é farta e variada: abóbora, agrião, aipim, aipo, alho-poró, batata andina e doce, berinjela, beterraba, brócolis, cebola, cenoura, couve, couve-flor, ervilha, espinafre, feijão, milho, nabo, pepino, pimenta, pimentão, quiabo, rabanete, radiche, repolho, rúcula, salsa, tomate e vagem. E também abacate, banana, caqui, limão-galego, morango e tangerina, além de ovos.
Para Jovelina, produzir orgânicos exige compromissos que vão além do trabalho de todos que lidam no dia a dia do sítio. É um projeto que envolve vida pessoal e profissional. Em entrevista concedida ao jornal A VOZ DA SERRA em abril, Jovelina comentou: “Conseguimos montar uma equipe totalmente comprometida com respeito e cuidado, entre nós e com o meio ambiente. Além do prazer de trabalhar com a terra, com esse tipo de cultivo, nos sentimos gratos por poder contribuir para a preservação do ambiente”, destacou a produtora, que usa energia solar, recicla o lixo e trabalha a conscientização pela preservação do planeta.
As estufas recebem cuidados especiais, garantidos pelo compromisso assumido com toda a cadeia de trabalho e que abrange o fator socioeconômico. “A crise, que para nós é política e não econômica, não nos atingiu. Às vezes a produção diminui por causa da chuva, mas as estufas protegem a produção e conseguimos atender a nossa clientela”, revelou.
Depois de uma experiência mal-sucedida com um mercado de varejo local, os proprietários do Sítio Cultivar optaram por atender apenas sua extensa carteira de clientes particulares.
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