“Toda mulher tem que ter noção do poder desse instrumento de proteção”. A afirmação é da delegada titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) em Nova Friburgo, Danielle de Barros, pelo Dia Estadual da Lei Maria da Penha, nesta terça-feira, 7. A data foi instituída pela Assembleia Legislativa (Alerj) em 2008, com o propósito de celebrar a lei que cria mecanismos para coibir a violência contra a mulher. Mas o que deve ser comemorado é o entendimento de que são necessárias medidas protetivas específicas para enfrentar esse tipo de crime, uma vez que os números da violência ainda são altos em todo o país.
Somente em Nova Friburgo foram registrados no primeiro semestre deste ano 718 casos de violência contra a mulher. Em 2017, no mesmo período, esse número chegou a 655. Segundo a delegada, o crescimento é pequeno, quando são avaliados os dados mês a mês, e é preciso considerar, por exemplo, se aumentaram os casos ou as denúncias.
De acordo com Danielle de Barros (foto), olhando especificamente os casos de feminicídio tentado, por exemplo, observa-se que foram registrados, um caso na cidade em 2016, outro em 2017 e, até o momento, um caso em 2018. E as investigações foram rígidas em todas as três ocorrências, mostrando que nenhuma violência passará impune.
A delegada destaca que o mais importante é a prevenção, que as pessoas se conscientizem sobre esse instrumento tão forte que é a Lei Maria da Penha e denunciem, que as mulheres busquem as medidas protetivas existentes: “É fundamental chamar as mulheres, promover a conscientização principalmente do público feminino, porque esse é um instrumento a que todas as mulheres têm alcance. E a Lei trouxe medidas protetivas, que são um dispositivo valioso, uma vez que a partir do momento em que a mulher faz a denúncia o problema passa a não ser só dela, passa a ser um problema da Deam, que pede a medida protetiva e o homem responsável é intimado e, se não respeitar as determinações, vai preso. Por isso, a mulher que é vítima de violência, seja ameaça, xingamento, agressão, qualquer tipo de violência, deve registrar a denúncia, deve ser protegida por lei”, reitera Danielle.
E é essa proteção, essa coibição da violência contra a mulher que a lei prevê: “Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social”, define o artigo 20 da Lei Maria da Penha.
A lei, que leva o nome de Maria da Penha, em homenagem à biofarmacêutica que se tornou símbolo da luta contra a violência à mulher - agredida durante seis anos pelo marido, sofreu duas tentativas de homicídio, ficou paraplégica em decorrência de uma delas na qual levou um tiro, e esperou 19 anos para que fosse julgado o processo contra o seu agressor - é datada de 7 de agosto por ser o dia no qual ela recebeu a indenização do governo por negligência e omissão. Apesar de ter entrado em vigor em setembro de 2006, é em agosto que se celebra o tempo de existência da lei, que este ano completa 12 anos.
Friburgo em números
A pesquisa do Tecle Mulher - Assessoria e Pesquisa no Âmbito dos Direitos da Mulher, Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), mostra que Nova Friburgo recebe mais denúncia de violência contra a mulher do que a cidade do Rio de Janeiro. O levantamento usou os dados e estatísticas do Dossiê Mulher 2018, publicação do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP-RJ) para produzir um documento que visa oferecer parâmetros reais e, assim, dar mais visibilidade à questão da violência contra a mulher.
De acordo com o Dossiê Mulher 2018, só em Nova Friburgo foram contabilizadas 1.650 ocorrências em todo o ano passado, Já a cidade do Rio de Janeiro registrou 42.970 denúncias. Agora, considerando a abordagem do Tecle Mulher que determina como parâmetro a média de 100 mil habitantes, a fim de quantificar a proporcionalidade, o resultado é altíssimo: Nova Friburgo apresenta 906,185 denúncias para 100 mil habitantes, enquanto o Rio tem 659.022 registros.
Segundo o levantamento, isso mostra que o município, assim como as cidades vizinhas Teresópolis (824,74) e Petrópolis (529,848), estão com os índices oficiais de violência relacionados à mulher maiores que os da capital. E a avaliação final do relatório é de que essas indicações auxiliem no acesso das mulheres às políticas públicas especializadas para garantir a aplicação da Lei Maria da Penha.
“Não tínhamos parâmetros reais na região, então fizemos esse levantamento, que usa os dados do ISP e assim pudemos contabilizar a realidade dessas denúncias. Vamos fazer um estudo maior, nosso objetivo é elaborar uma publicação, que dê voz aos casos de violência”, explica a diretora do Tecle Mulher, Laura Mury.
Ela ainda ressalta o quanto essa questão influencia não só na vida das mulheres vítimas de violência, mas também na vida de toda a população: “A maioria da população de Nova Friburgo é feminina, são mulheres que trabalham, que sustentam a economia, especialmente no setor de confecções, e essa violência, especialmente a doméstica, incide na produtividade do município”, acrescentou Laura.
Para a presidente da organização, Debora Spezanes, essa comparação também serve para mostrar o quanto o atendimento especializado (Deam, Centros de Referência da Mulher, Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher) é importante e que se faz necessário um fortalecimentos desses equipamentos para que as mulheres se sintam seguras, sejam de fato acolhidas e, com isso, reverter o número de casos:
“É preciso um monitoramento desses equipamentos, porque em alguns casos temos nas cidades os centros de referência, o espaço, mas o atendimento não é especializado, os profissionais designados para aquele local não têm o conhecimento necessário para a função. E isso faz com que, ao invés de se sentir segura, a mulher acabe voltando para o ciclo de violência em que se encontra. É preciso monitoramento e também que os profissionais sigam à risca o que determina a Lei Maria da Penha, pois nem sempre ela é reconhecida”, diz a presidente.
Débora ainda lembra que, além dos equipamentos existentes, falta ao município uma Casa de Acolhimento Provisório para mulheres em situação de risco de morte: “Foi feito um acordo entre os municípios de Nova Friburgo, Petrópolis e Teresópolis para a construção da Casa de Acolhimento. O imóvel foi erguido em Teresópolis e mobiliado, com recursos federais, mas ainda não está funcionando. Falta que os municípios assinem esse compromisso e invistam nesse equipamento. E que isso seja feito o quanto antes, para dar assistência a essas mulheres e também evitar que o imóvel seja vandalizado, já que está desocupado”.
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