Friburgo sem fronteiras: onde tudo começou

Conheça a história da jovem que inspirou a série
sexta-feira, 26 de junho de 2015
por Karine Knust
Nós já contamos um pouquinho das experiências de alguns jovens que embarcaram em busca de conhecimento. Passamos pelo Japão, Canadá, Irlanda, Inglaterra e Austrália e neste fim de semana nós continuaremos indo longe. Nesta última parte da série, vamos compartilhar as histórias de Katerine Knust e Polyana Perrud, que estão, respectivamente, nos Estados Unidos e Portugal. Além disso, você também poderá conferir uma entrevista exclusiva com o coordenador do programa de inglês para estrangeiros da Arizona State University, John Deal.

Não há como explicar ou mensurar a experiência de fazer intercâmbio, é algo que simplesmente muda uma vida inteira

Katerine Knust, estudante

Nosso último desembarque será onde tudo teve início. Na verdade, a ideia de fazer uma série contando as experiências de estudantes friburguenses em outros países começou aqui mesmo, em Nova Friburgo. Mais precisamente na minha família, com a entrevistada da vez, Katerine Knust, minha prima, que desde junho de 2014 está nos Estados Unidos estudando Nutrição pelo programa Ciência sem Fronteiras. 

Leia mais:

Austrália - Um friburguense na terra dos cangurus
Inglaterra - Rumo à terra da Rainha
Irlanda - As frentes que aqui esfriam não esfriam como lá
Canadá - Snowboard, aurora boreal e muita engenharia
Japão - Uma brasileira em busca da sabedoria oriental
Portugal - Mesmo fim, diferentes meios

Num desses bate-papos de família surgiu a oportunidade de ir visitá-la nos EUA. Meu sonho era conhecer um pouco do país, e ter a chance de passar duas semanas dentro de um campus universitário parecia excelente. Foi aí que, inevitavelmente, pensei: “Por que não transformar esse passeio de férias em matéria e contar um pouco de como funciona a vida de um estudante em uma universidade fora do país?”. Sempre foi uma curiosidade minha e, acredito, de outras pessoas também. Era a junção perfeita do útil ao agradável. Katerine seria minha cobaia. 

Então percebi que a tecnologia podia funcionar ao meu favor para que a matéria crescesse. Afinal, Katerine não é a única friburguense fora da terrinha, não é mesmo? De acordo com dados que recebemos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), só pelo programa Ciências sem Fronteiras são 33 jovens friburguenses espalhados pelo mundo. Isso sem contar com os programas internos oferecidos por universidades do país e os diversos tipos de intercâmbios particulares. 

Através das redes sociais fui buscando novos participantes. Muitos se dispuseram e confesso que, se pudesse, contaria a história de cada um deles. Mas tive que escolher. Ouvindo cada experiência pude me transportar um pouco para os países que “exploramos” nessas páginas publicadas no mês de junho — e espero que você, leitor, também tenha conseguido fazer o mesmo. Japão, Canadá, Irlanda, Inglaterra, Austrália, Estados Unidos e Portugal. Sete países. Sete jovens, sete experiências. 

Um oásis no deserto

Chegar a Arizona State University foi algo para lá de surpreendente. Quando os intercambistas dizem que a infraestrutura das universidades fora do país é impecável, eles falam sério. Quando o assunto é mistura de povos em um só lugar, a afirmativa é mais séria ainda — bem mais do que podia imaginar. E quanto às fraternidades que aparecem nos filmes de comédia romântica que toda adolescente já assistiu — as tais Alpha, Beta, Tetha, entre outras... — elas realmente existem. 

A cidade de Tempe é onde está localizado o maior campus da ASU, universidade que é uma das maiores instituições públicas dos Estados Unidos, cerca de 70 mil estudantes. O espaço é tão grande que confesso ter precisado de um mapa quando resolvi me aventurar pelas ruas sozinha. E nessas andanças, nunca pensei que ia me deparar com jovens de culturas tão distintas (japoneses, coreanos, mulçumanos, hindus...), espaços muito bem projetados, uma academia quase maior que algumas faculdades da nossa região, refeitórios com tanta variedade de refeições... Enfim, era quase impossível não ficar surpresa com cada detalhe do lugar.

Fui visitar minha prima quando ainda era primavera no Arizona, no fim de abril deste ano. Já Katerine, ao desembarcar lá, se deparou com uma realidade  climática bem mais intensa: “Quando eu saí do aeroporto de Phoenix, o que mais me chamou atenção foi o calor. O Arizona é um estado que é desértico, zona árida dos Estados Unidos, e no verão as temperaturas ficam em torno de 50 graus. Cheguei numa noite de junho e mesmo assim o calor era absurdo”, conta Katerine.

Menos é mais

A oportunidade de morar em outro país surgiu aos 22 anos, mas a estudante de Nutrição afirma que este era um sonho de infância. “Meu pai sempre gostou de viajar e me carregava pra todo canto. Aos poucos peguei esse gosto, percebi que quanto mais lugares eu conhecia, mais realizada e feliz eu era. Os planos de morar em outro país já eram feitos há muito tempo, o que faltava era oportunidade e, principalmente, dinheiro, mas vontade nunca”, revela Katerine, que ainda explica como conseguiu chegar ao objetivo: “O programa do governo federal, CsF, foi a minha grande chance. Não tinha me inscrito antes porque a prova de avaliação do nível de fluência em inglês era muito cara, mas quando apareceu a oportunidade de fazer o teste de graça, eu não pensei duas vezes. Fiz a prova do Toefl, li o edital, corri atrás dos pré-requisitos e esperei bastante”.

Katerine fez parte da chamada de número 156 do programa CsF. Ela chegou no Arizona em junho de 2014, mas ainda precisou fazer dois meses de curso de inglês antes de começar as aulas acadêmicas de Nutrição. Assim como os outros friburguenses entrevistados em nossa série, ela também sentiu muitas diferenças no ensino das universidades norte-americanas: “A minha rotina acadêmica é basicamente de me preparar para as aulas (ler os slides das aulas, livros, etc), ir às aulas, fazer deveres de casa, trabalhos e estudar para as provas. Aqui a responsabilidade de aprender é totalmente do aluno, o professor é só um guia. Mas isso não me faz achar o ensino daqui mais difícil do que no Brasil, como muitos jovens brasileiros tendem a achar. Eu tenho bem menos horas dentro de classe do que eu teria no Brasil, mas em relação às atividades extraclasse a quantidade é maior. O professor espera que o aluno já esteja preparado e por dentro da matéria antes de assistir a aula”, explica a friburguense.

Garota, agora ela está na Califórnia

No verão, as aulas nas universidades são interrompidas por conta das férias e alguns alunos vão à busca de estágios ou pesquisas para fazer neste período. Katerine foi um deles. Depois de passar quase um ano na ASU, a jovem se mudou para a University of California, Los Angeles, a Ucla. Em parceria com o hospital Division of Endocrinology VA Greater Los Angeles Healthcare System, ela faz uma pesquisa sobre alimentos infantis e iodo com bebês não amamentados menores de um ano. Além disso, a friburguense também foi convidada a ser coautora do capítulo do livro “Aspectos Moleculares, Genéticos e Nutricionais dos Minerais”, que ainda não tem previsão para ser lançado no Brasil. 

“Não há como explicar ou mensurar a experiência de fazer intercâmbio, é algo que simplesmente muda uma vida inteira. Com certeza, uma pessoa que viveu por um tempo em outro país é diferenciada. O olhar para as oportunidades mudam, você amadurece e se torna mais independente. Você percebe que pode ter laços com muitas pessoas, família e amigos, mas que nem sempre é possível viver por perto e que isso faz parte do seu crescimento. Você se torna mais seguro de si. Sem contar com a abertura de muitas portas profissionais, o que eu nem preciso dizer”, conclui. Katerine volta para o Brasil em agosto deste ano.

Outra casa, outra língua: coordenador do programa de inglês para estrangeiros esclarece como funciona o sistema

Uma boa recepção ao chegar em uma nova universidade pode fazer toda a diferença, não apenas para quem está lá para aprender, mas também para quem tem a responsabilidade de coordenar este intercâmbio. Na Arizona State University, parte desta demanda fica a cargo de John Richard Alves Deal, coordenador do programa de inglês intensivo para estudantes internacionais. Logo de início ele explica: nem todos os alunos chegam prontos. “Cerca de metade dos alunos precisa passar pelo inglês intensivo antes de começar a frequentar as aulas da faculdade”, conta.

Na universidade, existe um planejamento para receber os novos alunos. Um deles é voltado para o ensino do inglês — idioma utilizado em todas as aulas. Os estudantes são divididos em três categorias: iniciante, intermediário e avançado. É realizado um teste no Brasil, em que os candidatos são avaliados em relação ao conhecimento da língua, o Toefl. De acordo com John, os jovens que têm compreensão e fluência no inglês baixas recebem maior atenção: “Se ele ingressar no nível iniciante, por exemplo, terá mais semanas de aulas de inglês. Mas ao longo desse período ele pode realizar testes uma vez por mês para avaliar sua evolução na língua, e aí, dependendo da nota, o aluno é liberado do curso para passar a frequentar as aulas da universidade”, explica, além de ressaltar que a convivência com estudantes de outros países é bem comum. “Os estudantes, quando estão no programa de inglês, convivem com outros das mais diversas partes do mundo: Japão, China, Oriente Médio...”

Um Brasil fora do Brasil

A Universidade Estadual do Arizona já abrigou este ano 350 brasileiros. No entanto, esse número já chegou a 700 em 2014. John acredita que esse cenário vá mudar daqui pra frente e que esse pode ser um ponto positivo no entrosamento dos estudantes do Brasil com os alunos de outros países, além da prática do inglês com mais frequência. “Já faz quatro anos que recebemos alunos enviados pelo CsF. A partir deste verão, o número que vamos receber será bem menor porque o programa ficou muito popular nos Estados Unidos e aí muitas universidades começaram a aceitar brasileiros. E como agora os grupos de estudantes vindos do Brasil para as faculdades será menor, isso vai contribuir para que eles interajam de fato com outras culturas e pratiquem o inglês”, pontua John, que critica, de certa forma, a pouca troca cultural praticada pelos intercambistas. “Eles vêm animados para conhecer americanos e outras culturas, mas depois as coisas mudam um pouco e quando eles começam a conviver com outros brasileiros e criam laços de amizades acabam vivendo num Brasil fora do Brasil”, pondera o coordenador. 

John é brasileiro, mas se mudou para os Estados Unidos há cerca de 20 anos. Ele conta que o novo cenário do CsF será importante para os estudantes, mas admite que este contato mais próximo com seu país lhe fará muita falta. “Acredito que esta nova fase em que os alunos serão ainda mais espalhados pelo país, as experiências com a língua serão maiores e isso será essencial para o desenvolvimento deles. Mas tenho que admitir que sentirei falta. Sou brasileiro e vi no programa do CsF a oportunidade de, de alguma forma, sentir um pouco do Brasil aqui. Sou coordenador do programa de inglês, mas acabei estreitando os laços com esses alunos e tento ajudar no que for preciso.”

Neste período de incertezas no governo e economia brasileira, algumas polêmicas surgiram em relação a um possível término do programa estudantil. Quando perguntado sobre este aspecto, John afirmou: “Sabemos que a economia do Brasil passa por um momento difícil, mas ainda não recebemos nenhuma informação sobre o futuro do Ciência sem Fronteiras. Se ele vai acabar? Nós não sabemos. Mas esperamos que isso não aconteça”, conclui.

  • Katerine Knust em frente à Arizona State University (Arquivo pessoal)

    Katerine Knust em frente à Arizona State University (Arquivo pessoal)

  • Katerine se mudou para a Califórnia em maio deste ano (Arquivo pessoal)

    Katerine se mudou para a Califórnia em maio deste ano (Arquivo pessoal)

  • O Grand Canyon também fez parte do roteiro turístico da friburguense (Arquivo pessoal)

    O Grand Canyon também fez parte do roteiro turístico da friburguense (Arquivo pessoal)

  • Katerine em um dos mais famosos pontos turísticos do Arizona, Horseshoe Bend (Arquivo pessoal)

    Katerine em um dos mais famosos pontos turísticos do Arizona, Horseshoe Bend (Arquivo pessoal)

  • Katerine Knust na Arizona State University (Arquivo pessoal)

    Katerine Knust na Arizona State University (Arquivo pessoal)

  • Katerine Knust em frente à Arizona State University (Arquivo pessoal)

    Katerine Knust em frente à Arizona State University (Arquivo pessoal)

  • A turma cosmopolita de Katerine Knust na Arizona State University (Arquivo pessoal)

    A turma cosmopolita de Katerine Knust na Arizona State University (Arquivo pessoal)

  • John Deal, coordenador do programa de inglês intensivo para estudantes internacionais (Divulgação)

    John Deal, coordenador do programa de inglês intensivo para estudantes internacionais (Divulgação)

  • As estudantes friburguenses Katerine Knust e Polyana Perrud (Infográfico de A Voz da Serra)

    As estudantes friburguenses Katerine Knust e Polyana Perrud (Infográfico de A Voz da Serra)

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