Friburgo: a grande cabeceira de água da região

Diretor do Comitê de Bacia Rio Dois Rios, Licius de Sá Freire, fala das ameaças às nascentes do município
sexta-feira, 22 de março de 2019
por Alerrandre Barros (alerrandre@avozdaserra.com.br)
Licius de Sá Freire, diretor-presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica Rio Dois Rios (Foto: Alerrandre Barros)
Licius de Sá Freire, diretor-presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica Rio Dois Rios (Foto: Alerrandre Barros)

Dois dos principais rios do estado e outros pequenos afluentes que nascem em Nova Friburgo sofrem ameaças que vêm de longe e de perto. Um fato que merece reflexão neste Dia Mundial da Água (hoje, 22). Em entrevista para A VOZ DA SERRA, o diretor-presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica (CBH) Rio Dois Rios, Licius de Sá Freire, traça um panorama da geração de água na cidade e enumera alguns caminhos para proteção do recurso.

A VOZ DA SERRA: Nova Friburgo é uma “fábrica de água”?

Lícius de Sá Freire: Friburgo tem uma importante estrutura de recarga hídrica. Aqui estão nascentes de grandes rios do estado: o Rio Grande (que passa por oito municípios, desaguando no Paraíba do Sul, em São Fidélis) e o Rio Macaé (que deságua na Região dos Lagos). Temos também nascentes que formam cursos d’água em Cachoeiras de Macacu e Teresópolis. Proteger a cabeceira desses rios é, portanto, fundamental para a Região Serrana, Centro-Norte, Norte e dos Lagos.

Para isso, basta proteger as nascentes?

A nascente é o ponto em que o lençol freático alcança a superfície e forma cursos d’água. Cuidar dela é tão importante quanto proteger os mecanismos de reabastecimento do lençol, margens dos rios, encostas e grandes matas que absorvem a água da chuva.

A cabeceira dos rios na cidade depende da chuva. Deve onde ela vem?

A chuva abastece Friburgo de água. Se parar de chover, a cidade não tem como pegar água do Paraíba do Sul ou do mar, ambos estão longes. A chuva pode vir do Norte do país, os rios aéreos vindos da Amazônia, mas é inconstante e, por isso, podemos enfrentar épocas de excesso ou escassez de chuva. Do Sul do país, vem a chuva trazida com o vento polar úmido, mais constante, e que irriga a nossa área de recarga hídrica.

O que acontece na Amazônia então impacta a nossa região.

Sim, a chuva que vem do Norte está irregular. O que se tem conhecimento é que o grande desmatamento nas regiões Norte e Centro-Oeste tornou essas chuvas irregulares. A tragédia climática de 2011 é um exemplo de chuva irregular vinda do Norte.

O que fazer para gerar chuvas e mitigar os impactos do desmatamento?

O que deve ser feito, preventivamente, é proteger as matas e reduzir o desmatamento, desenvolvendo uma agricultura sustentável, que proteja o solo para que a chuva tenha maior chance de infiltrar e abastecer os lençóis freáticos. Sem proteção das matas, o solo não suporta grande quantidade de chuva e rompe, causando os transtornos que conhecemos. Daí a importância do planejamento urbano e rural.

Quais as ameaças da falta desse planejamento?

Como ameaças eu aponto a impermeabilização devido a expansão da malha urbana. Toda essa bacia de drenagem do Bengalas, que contribui com o rio, está impermeabilizada. Já na zona rural, a ocupação de áreas de proteção que deveriam ser resguardadas para recarga de água. O correto planejamento do uso e ocupação do solo, com atenção para a conservação de recursos hídricos, é a grande ferramenta para preservar as águas da nossa região.

O que a população pode fazer?

Não temos muitas opções além do que está em nosso domínio. Se você tem quintal, não pavimente o quintal. Evite cortar árvores na rua. Essa cultura de proteção precisa avançar. Eu não acredito que as ações individuais irão resolver o problema. O cidadão deve cobrar dos órgãos públicos a manutenção das florestas acima das nascentes, o bom uso da nascente e da faixa marginal de proteção dos rios e uma agricultura e expansão urbana responsáveis. Isso virá com políticas públicas.

Sem essas medidas, podemos no futuro viver conflitos por água?

Temos poucos conflitos por água na região, mas vivemos no estado que, entre 2013 e 2015, viveu um estresse hídrico com São Paulo pela disputa das águas do Paraíba do Sul. O que não podemos fazer é deixar de cuidar das nossas águas. Esse é o grande recado. A água que cuidamos aqui está indo para o Paraíba do Sul. Está servido a outras regiões jusantes, abaixo de nós.

 

Conheça mais sobre a história da bacia hidrográfica que corta o município no documentário “Caminho das Águas - do Caledônia a Atafona”, lançado no ano passado pelo CBH Rio Dois Rios, em youtu.be/vmsycsdYX7U. Acompanhe o trabalho comitê de bacia em cbhriodoisrios.org.br.

 

Foto da galeria
O Rio Grande deságua no Paraíba do Sul, o maior do rio do estado
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
TAGS: Dia Mundial da Água | Rio Dois Rios
Publicidade