Ana Borges
“Meu grande amigo e muito prezado colega Portinari:
“Venho por este meio lhe agradecer muito o seu cartão pelo ano novo com os seus sinceros desejos como artista e colega. Como sabes, desapareci do Rio depois de ter visitado por duas vezes a sua muito interessante exposição que o consagrou definitivamente entre os primeiros pintores modernos do nosso todo querido Brasil.
“Meu silêncio é este! Sou um apaixonado da natureza, aliás, os meus desenhos lhe contestam e por isso estou agora passando já dois meses em minha terra natal, a convite de um amigo. Sabes que sou montanhês e por isto, forte de saúde. Estou passando muito bem e espero o mesmo de você e vocês todos.
“Soube aqui da visita do Dr. Getúlio Vargas, uma raridade, meus mais sinceros parabéns. Para você, prezado amigo e caro colega, um ano muito feliz, com novidades artísticas com o mais absoluto sucesso, saúde e felicidade.
“Com grande abraço, sempre, o trabalhador Guignard.”
(Carta de Guignard a Portinari, escrita em 8 de janeiro de 1940, no Solar Savori, em Mury, Nova Friburgo)
Esta missiva é uma das preciosidades, entre tantas outras do fotógrafo Osmar Castro, exibidas no Centro de Arte, na exposição “Uma história viva em busca de Guignard”, inaugurada em 26 de agosto e aberta à visitação até 28 de setembro. A mostra é uma realização do Gama e do escultor Zeppe, complementada pelas telas dos artistas plásticos Felga de Moraes e Marcelo Auad. Para ilustrar a estadia do pintor em Nova Friburgo, em 1940, Castro cedeu diversas reproduções de imagens da época—de seu acervo digitalizado—, onde podemos apreciar o cenário friburguense, com suas ruas, avenidas e pessoas no cotidiano da cidade nos anos 40 e 50 do século passado.
Com cerca de mil assinaturas no livro de presença, até o momento, a exposição tem atraído jovens estudantes. Semana passada recebeu 50 alunos e as professoras Manoela Iezzi, Gisele, Luciana, Andréia e Fátima, do Centro Educacional Lemos Valentim. Atrair este tipo de público tem sido um dos objetivos de Júlio Cezar Seabra Cavalcanti, o Jaburu, fundador do Gama, que trabalha incansavelmente pela divulgação da arte e cultura locais, de seus artistas e suas obras. Como acredita que a formação desta plateia pode e deve começar através do ambiente educacional, ele convida as direções das escolas das redes municipais, estaduais e privadas a levar seus alunos ao Centro de Arte.
“Parece que esses jovens não sabem que existe uma diversificada programação cultural na cidade. Ou se sabem desconhecem o significado e a importância deste contato. Por isso é fundamental que sejam informados e conduzidos aos eventos; afinal, educação é resultado de cultura. Observar a curiosidade e a satisfação estampada no rosto das crianças olhando pela primeira vez algo que jamais viram foi muito gratificante e apenas comprovou o que penso a respeito: os jovens só precisam ter acesso às artes para descobrir um novo mundo e as possibilidades que ele traz para sua formação acadêmica. Literatura, música, artes plásticas, cinema, teatro, tudo isso oferece uma gama infinita de perspectivas para o seu aprimoramento. É extremamente necessário abrir as portas da percepção desse universo para a garotada”, argumentou Jaburu.
Entre as observações dos alunos, ouvimos comentários como: “Muito legal a reprodução dos quadros em papel machê”; “A arte do espelho é interessante. Maravilhosa a exposição”; “Legal tirar fotos segurando arte”; “Gostei da exposição com essas cores fortes e vibrantes”. As professoras Luciana, Gisele e Manoela fizeram questão de ressaltar o quanto a visita valeu a pena: “É importante estar presente em eventos culturais, principalmente com quadros e esculturas dos nossos artistas. Gostamos muito”.
Coincidência ou não, o fato é que Guignard está sendo redescoberto. Na edição de 9 de setembro, o colunista Joaquim Ferreira dos Santos, de O Globo, escreveu: “Novo Museu—Eduardo Paes foi às compras anteontem, na abertura da ArtRio. Adquiriu três fotografias de Walter Firmo, o óleo ‘Rio de Janeiro’, de Tarsila do Amaral, e um banco de madeira com a paisagem da cidade, pintada por Guignard. São as primeiras obras do acervo do Museu de Arte do Rio, que abre em 2012”. Logo abaixo, outra nota: “Aliás e a propósito—Colecionador de arte e diretor da feira, Alexandre Accioly pagou US$ 200 mil pelo quadro ‘São Sebastião’, de Volpi, e o doou para o museu. Max Perlingeiro, da Pinakotheke Cultural, onde quase todas as obras foram compradas, também fez doação: ofereceu ao prefeito um desenho de Guignard”.
Ainda está em tempo de o friburguense descobrir e dar o justo valor e reconhecimento ao conterrâneo Alberto da Veiga Guignard. Visitas de grupos estudantis podem ser agendadas pelo telefone do Centro de Arte: (22) 2533-1359. A mostra será encerrada na próxima quarta-feira, dia 28.
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