No fim de janeiro deste ano foi anunciado o encerramento das atividades do Colégio Nossa Senhora das Graças, tradicional instituição particular de Nova Friburgo, situado no bairro Olaria. Procurado por A VOZ DA SERRA, o Centro Social Nossa Senhora das Graças emitiu nota oficial sobre o assunto, assinada pelo padre Fábio da Cunha, pároco da Igreja Nossa Senhora das Graças. No dia 13 de fevereiro de 2016, Josanne Marchon de Oliveira — que dirigiu o colégio entre 20 de julho de 2015 até 31 de janeiro de 2016 — escreveu uma carta aberta à comunidade em seu perfil de uma rede social, avaliando a situação administrativa/financeira da instituição de ensino.
Segue abaixo a carta, na íntegra.
"Nova Friburgo, 13 de fevereiro de 2016.
Carta aberta à comunidade de Nova Friburgo - RJ
Assunto: COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS
LEGENDA:
CSNSG - Centro Social Nossa Senhora das Graças - Entidade Mantenedora do Colégio Nossa Senhora das Graças.
CNSG - Colégio Nossa Senhora das Graças.
No primeiro semestre de 2015 fui procurada pelo CENTRO SOCIAL NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS - entidade mantenedora do CNSG - para realizar um trabalho de consultoria, através da TNF Corporativa, na área de gestão do CNSG.
Acredito que este trabalho tenha sido uma das últimas tentativas de salvar a instituição, que apresentava importantes sinais de mórbido declínio, identificados pela mantenedora através de problemas tanto do ponto de vista financeiro quanto pedagógico.
Após várias reuniões com membros da diretoria da mantenedora para definição do trabalho a ser desenvolvido pela TNF Corporativa, finalmente, no início de julho, acertamos todos os detalhes para que o trabalho de consultoria fosse iniciado na segunda quinzena de julho de 2015. No entanto, "surpreendentemente", no dia 15 de julho de 2015, a então diretora, através de uma carta direcionada ao Presidente do CSNSG pede demissão do cargo que ocupava desde 01 de fevereiro de 2001.
No dia 16/07/2015, me foi solicitado iniciar o trabalho imediatamente, não mais como consultora, mas como diretora, em função da lacuna deixada com o repentino pedido de demissão da então diretora. Aceitei o desafio e iniciei meu trabalho no CNSG no dia 20/07/2015, uma segunda-feira.
Desde o primeiro dia de trabalho percebi uma rejeição gratuita à minha pessoa, advinda de vários colaboradores do colégio (professores e pessoal de apoio), sem nenhuma explicação, visto que eu não conhecia a grande maioria deles.
Vale ressaltar que a diretora que acabara de pedir demissão, já havia sido demitida há 5 anos e outra diretora fora apresentada para a função. Entretanto, seu retorno foi "exigido", forçado, garantido e assegurado pela " família GRAÇAS".
Como profissional da área de Recursos Humanos, posso destacar o clima vicioso que foi criado e implantado no CNSG ao longo dos últimos 5 anos, principalmente por esta situação inusitada.
No dia 27/07/2015 - uma semana após a minha contratação - me foi apresentado pelo Deptº. Administrativo-Financeiro do CNSGum relatório demonstrando um fluxo de caixa negativo de R$ 83.000,00 em dezembro de 2014, projetando um fluxo de caixa negativo em dezembro de 2015 de R$ 398.000,00. Deve ser ressaltado que este fluxo de caixa negativo foi coberto ao longo do ano de 2015 pela injeção de recursos provenientes da venda de um imóvel de propriedade do CSNSG, ocorrida antes de minha admissão. Portanto, o déficit de R$ 315.000,00 ao longo do ano, ou seja, (-R$83.000 - R398.000) foi coberto, mas a partir de 01/01/2016, o caixa passou a ser literalmente ZERO.
Em função de terem sido realizadas apenas 113 matrículas de alunos pagantes para o ano letivo de 2016, o fluxo de caixa projetado apresentava um déficit de R$ 30.000,00 por mês ao longo de 2016. Não havia mais recursos financeiros para cobrir este déficit. E com os números não há mágica!
Voltando ao mês de julho de 2015, na mesma semana de minha contratação, solicitei uma reunião extraordinária com a diretoria do CSNSG, em função da deterioração financeira que se podia prever. Esta reunião aconteceu no dia 01/08/2015 - 10 dias após minha contratação - na qual deixei claro para os participantes que o desafio de colocar o colégio nos "trilhos" seria muito grande. Realmente, não imaginava que o quadro financeiro fosse extremamente crítico como aquele que se apresentava. Pessoalmente, passava a ter um entendimento para a justificativa do pedido de demissão da antiga diretora, que como tal, era responsável por toda a parte financeira, administrativa e pedagógica do colégio e estava ciente do drástico agravamento do fluxo de caixa que se desenhava.
O correto seria ter continuado à frente do trabalho que vinha exercendo ao longo dos últimos 14 anos na direção do CNSG, buscando soluções para equacionar o problema ocorrido durante sua gestão, mas optou por um pedido de demissão, evitando desta forma ser questionada durante a realização do trabalho de consultoria que a TNF Corporativa iria desenvolver na instituição.
Nesta mesma reunião do dia 01/08/2015, apresentei uma série de simulações de redução de custos, objetivando reverter, o máximo possível, o agravamento da situação financeira que se apresentava. Discutimos até a possibilidade de negociarmos um percentual de redução de salários de professores e demais funcionários, que poderia ser aplicada já a partir de setembro de 2015.
Era imperativo reduzir colaboradores, tal o "inchaço" de pessoas no colégio. Algumas destas ações foram adotadas entre agosto e dezembro de 2015, ressaltando-se que a redução de salários não foi aplicada.
Um ponto importante a ser considerado é que o CNSG é uma entidade SEM FINS LUCRATIVOS, mas que para se manter precisa ser superavitário, ou seja, ter um fluxo de caixa positivo, pois é extremamente necessária esta geração de recursos para a manutenção do prédio, investimento em equipamentos, etc., e estes são provenientes da receita das mensalidades dos alunos, cuja fórmula mundialmente conhecida é RECEITA (mensalidades dos alunos pagantes) menos DESPESA (salários de professores, pessoal de apoio, luz, água, etc.) que deve apresentar como resultado um FLUXO DE CAIXA POSITIVO.
No entanto, o FLUXO DE CAIXA do CNSG apresentado em minha primeira semana de trabalho era de um déficit de R$ 315.000,00. CONCLUSÃO 1: Problema agudo no fluxo de caixa.
Do ponto de vista pedagógico, observei haver muitas críticas (pais e professores) ao sistema de ensino utilizado, o qual estava implantado há 12 anos no colégio, contratado pela direção anterior, sem que os professores tenham sido adequadamente capacitados à utilização do mesmo. Fazendo uma conta aproximada, deveriam ter ocorrido cerca de 48 sessões de treinamento aos docentes neste período. Constatei que nenhuma sessão ocorrera. Isto é um absurdo sem precedentes!!! Era cláusula contratual, da qual a direção optou por abdicar. Como viabilizar a capacitação dos professores à utilização de um sistema de ensino, abdicando dos treinamentos que seriam oferecidos pela equipe de assessoria pedagógica do fornecedor do sistema? O que se objetivava?
Entretanto, mesmo havendo significativo descontentamento e visível ineficácia do sistema de ensino adotado pelo colégio, a direção anterior renovou o contrato de fornecimento do material didático (sistema de ensino) por mais 3 anos, a contar de 01 de janeiro de 2015, (6 meses apenas antes de pedir demissão), e que previa uma severa multa se rompido por parte do colégio. Estes dois exemplos podem dar uma boa ideia do quadro caótico, do ponto de vista pedagógico, instalado no CNSG. CONCLUSÃO 2: Problema crônico no projeto pedagógico.
Objetivando recuperar o tempo perdido e já que o CNSG não poderia romper o contrato com o fornecedor do sistema, no dia 15 de agosto de 2015 ocorreu a primeira capacitação dos docentes do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio e em outubro, dos professores do Ensino Fundamental I e Educação Infantil. Solicitei e a equipe de assessores prontamente atendeu à demanda.
Além da necessidade de cortar custos, foi preciso ajustar o valor das mensalidades e o ajuste foi balizado num patamar abaixo dos valores praticados pelos colégios de mesmo nível em nossa região. Conforme comentado acima, era mandatório melhorar o fluxo de caixa do colégio, e para tal consideramos basicamente as três maneiras de aumentar o fluxo de caixa de qualquer instituição: 1) aumento das receitas por aumento das mensalidades defasadas; 2) aumento das receitas por aumento da quantidade de alunos; 3) redução de despesas. Tivemos que atuar nestes três flancos ao mesmo tempo, no sentido de reverter a dramática situação financeira pela qual o CNSG passava. Já considerávamos perder certa quantidade de alunos, mas na verdade, o CNSG sofreu uma concorrência que acreditamos ter sido desleal, na medida em que grande parte dos pais de alunos passaram a receber ofertas de descontos irrecusáveis, via rede social, para matricularem seus filhos no colégio onde hoje trabalha a antiga diretora do CNSG. Este "trabalho desleal" certamente impactou de forma substancial na perda de cerca de 300 alunos que não se matricularam no CNSG para o ano letivo de 2016.
O CNSG chegou ao dia 18 de janeiro de 2016 com apenas 94 matrículas efetivadas para o ano de 2016 (Educação Infantil e Fundamental I) e 19 matrículas (Fundamental II e Ensino Médio). Este quantitativo, extremamente reduzido, inviabilizaria a continuidade das atividades do CNSG no ano de 2016.
A direção, na busca de captação de novos alunos, recomeçou um processo de desenvolvimento de parcerias, iniciado em agosto de 2015, para concessão de descontos a filhos de funcionários das grandes empresas locais. Foram realizadas visitas às seguintes empresas, as quais receberam muito bem nossa proposta: WERMAR, ÁGUAS DE NOVA FRIBURGO, NOVAMIX, SUPERPÃO, BRAMIL, ENERGISA, PEDRINCO, FERRAGENS 3F, NFP Automotive, dentre outras. Outra iniciativa para melhoria do fluxo de caixa foi a concentração de esforços para recuperação de cerca de R$ 400.000,00 de inadimplência, até 2014, via "ação judicial", e outro montante de cerca de R$ 200.000,00 de inadimplência construída ao longo de todo o ano de 2015. Estas ações, como bem sabemos não produzem resultados no curto prazo, pois trata-se de processos de negociação.
Outra iniciativa foi propor a cada pai de aluno matriculado a indicação de um novo aluno, dessa forma teríamos a possibilidade de dobrar o número de alunos e a condição de viabilizar o funcionamento do colégio, mesmo que mais reduzido.
Enfim foi marcada uma nova reunião com a diretoria do CSNSG, ocorrida em 25/01/2016, e após diversas avaliações de cenários, inclusive ponderações sobre a atual fragilidade da economia brasileira, decidiu-se pela suspensão das atividades do CNSG em 2016. CONCLUSÃO 3: Inviabilidade de continuação das atividades do CNSG em 2016.
Lamento muito a perda de emprego de muitas pessoas e destaco de forma muito especial o reconhecimento aos pais dos alunos que matricularam seus filhos para o ano de 2016 (cerca de 113 alunos matriculados) e que acreditaram no colégio.
Em 26/01/2016, procurei outros dois colégios confessionais católicos da cidade, respectivamente COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS MERCÊS e COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS DORES, para que pudessem acolher todos os alunos que já estavam matriculados no CNSG, inclusive os cerca de 20 bolsistas. Solicitei que lhes fossem asseguradas as mesmas condições que teriam no CNSG. Coube aos pais o discernimento da escolha de onde matricular seus filhos. Esta reunião ocorreu no auditório do CNSG, no dia 26/01/2016, às 14 horas, com a presença das diretoras dos dois colégios citados.
Minha conclusão pessoal sobre a "tragédia" que se desenhava é que ao longo dos últimos anos foi criada dentro do CNSG uma cultura "de jeitinho e amizade da família GRAÇAS" na qual não havia senso de responsabilidade de que as receitas provenientes da mensalidade dos alunos (a qual depende da quantidade de alunos) são cruciais para o pagamento das despesas de qualquer instituição, mesmo aquelas SEM FINS LUCRATIVOS. O que pude observar foi uma política de concessão de muitos descontos, falta de determinação em recuperação da INADIMPLÊNCIA, bolsas de estudo sem critério, "pontos grátis" para alunos que não aprendiam nada nos programas de reforço, etc. etc. Destaca-se também, através das redes sociais, uma aversão absoluta a qualquer programa de INOVAÇÃO, inclusive manifestada por pais de alunos, que tendo decidido matricular seus filhos antecipadamente em outros colégios, sempre se posicionavam contra qualquer processo de TRANSFORMAÇÃO. Daí, - como comentado no início desta carta - poderia ser explicada a rejeição brutal que sofri logo que entrei no CNSG, pois percebia-se em mim uma diretora que viera para TRANSFORMAR. Não foram poucas as vezes em que fui pressionada, de todas as formas possíveis, a abdicar do cargo. Entretanto, eu fora contratada para dirigir o CNSG e estava preparada para realizar o trabalho da forma que me havia sido solicitada, ou seja: empreender as mudanças que a situação requeria.
Porém, os atores optaram por "não escutar outra música além daquela que aprenderam por muitos e muitos anos". Os pais decidiram matricular seus filhos em outros colégios. Parodiando Nietzsche em O NASCIMENTO DA TRAGÉDIA: "e aqueles que foram vistos dançando foram julgados pelos insanos por aqueles que não podiam escutar a música".
Encerro esta carta aberta à comunidade deixando um legado de esperança e com a certeza absoluta de que o COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS (o qual aprendi a amar, assim como o hino à NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS que é simplesmente encantador!!!) ainda poderá se tornar um CENTRO DE EXCELÊNCIA DE EDUCAÇÃO.
O CNSG possui uma localização privilegiada e a "obra" que o PADRE MIELLI construiu ainda poderá se reerguer, principalmente em função de questões de mobilidade, logística e meio ambiente, com as quais cada vez mais iremos nos deparar.
O CNSG poderá ser a escolha para 100% dos jovens de Olaria e adjacências e um atrativo para os alunos do centro, que poderiam se beneficiar do contrafluxo Centro-Olaria-Centro.
Atenciosamente,
Josanne Marchon de Oliveira.
Diretora do COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS entre 20/07/2015 e 31/01/2016."
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