Maria da Tempestade, romance de João Mohana, escrito nos anos 60 marcou minha história de leitora. O livro acompanhou-me toda a adolescência. Depois, perdi o exemplar e a entrada na juventude-adulta praticamente me fez esquecer dele. Só agora, na maturidade, engajada em projetos de promoção de leitura, dei-me a falar no tal livro. Achei-o em um sebo virtual e, nas férias, pus-me a (re)lê-lo.
No início do séc. XX, em São Luis (MA), uma jovem rica e religiosa (informação essencial!) rebela-se contra a vida fútil que levava. Seguem a paixão por um jovem digno e pobre, que é condenado por um crime que não cometeu. Entre o primeiro olhar e a prisão entremeiam-se relações familiares, casamento escondido, a gravidez concebida no único encontro íntimo. Depois da partida do navio que levava o amado para o Sul, a mocinha enfrenta ainda a morte da filha ao nascer e liberta de um vício a amiga que a acolhera. Enfim, uma heroína! Termina o romance a chegada de um novo ano: não há reencontro, não há “foram felizes para sempre”. Há apenas a esperança.
Quando cheguei ao ponto final, sentia – perplexa! – a mesma impressão de ser um “Fusca com motor de Boeing”, que tinha quando garota. Mas, e os anos vividos entre aquelas primeiras leituras feitas pelo prazer de ler e a que fiz agora, já adulta e formada nas teorias da literatura?
Sim, foi uma leitura diferente. Desta vez, procurei a história do autor e a fortuna crítica do romance. João Mohana é um padre que se dedicou à literatura para evangelizar. Publicou romances e peças de teatro. Maria da Tempestade chegou à 10ª edição e teve uma boa recepção entre os especialistas. A intenção de seu autor de exaltar os aspectos religiosos é nítida. Em que isso implicou em minha leitura? Em nada. Continuei sentindo que estava diante de uma grande história de amor; um tanto anacrônica, mas que ainda me mobilizava.
Ler o romance em dois tempos distintos me fez confirmar a perenidade dos sentimentos. Se na adolescência buscava a ilusão do príncipe encantado, hoje eu o encontro dormindo ao meu lado quando fecho o livro. Se sentia ímpetos de romper com o mundo para viver um grande amor, esse mesmo homem prova que grandes amores também se constroem na simplicidade dos dias. E constato que a vida às vezes encontra a intenção de um autor e a ficção pode se tornar real. Entre ambas, apenas a esperança, aquela mesma com que meu romance preferido termina e que não coloca ponto final na história humana.
* Mestre em Literatura
Brasileira pela PUC-Rio
gilda@puc-rio.br
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