Espaço de Leitura - O tempo é presença

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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013
por Jornal A Voz da Serra

Francisco Gregório Filho
As avós são em número maior. Vemos também avôs de mãos dadas com seus netos a levá-los à escola, muito embora em número menor. Comoventes imagens registradas nesse início de atividades escolares do ano. Diariamente meus olhos presenciam nas ruas da cidade essa relação de meninos e meninas com seus avós a caminharem e a conversarem em fecundos exercícios de aprendizado sobre a vida e o viver em sociedade. Um vai e vem de histórias onde um escuta e o outro conta e vice-versa. Um vigoroso diálogo de bem querer. 
Recorro aqui a fragmentos do texto da professora Gilka Girardello denominado “Na clareira do presente: o diálogo narrativo entre as gerações – A arte de contar histórias e o diálogo entre gerações”* para fazer nos instigar a algumas questões:
“Quando crianças e pessoas com larga experiência de vida conseguem se encontrar de fato na clareira de sentido inaugurada por uma narrativa compartilhada, o que ocorre não é uma lição ministrada por quem sabe a quem não sabe, mas um diálogo do qual ambos são autores, no qual ambos fazem perguntas e esboçam respostas sobre os mistérios que veem na vida a partir do lugar único no tempo humano em que se encontram, o presente.”
Gostaria, amigo leitor, de comentar por aqui pequenas observações que tenho feito ao acompanhar esse interessante movimento de vai e vem das crianças com seus avós ou bisavós. O avô ou a avó chega ao portão da escola e entrega seu neto ao cuidado do professor e quase nunca é convidado a entrar nesse espaço e participar também de momentos de troca e aprendizado. Geralmente retorna da entrada e volta depois para reencontrar seu neto na saída. 
Com as devidas exceções, claro, os idosos, em geral, são dispensados de qualquer envolvimento com as práticas de ensino das escolas, ou quando convidados, o que ocorre raramente, o são para atuar passivamente, em eventos das turmas de escolares onde, no mais das vezes, atuam apenas como plateia. 
Considero essa postura da escola uma insensibilidade, um desperdício mesmo, e uma entre as muitas questões a serem reconduzidas pelos pais e pela comunidade escolar.
Insisto, caro leitor, que estou aqui a comentar genericamente, pois sei que há muitas iniciativas diferenciadas de algumas escolas. Muitas têm buscado ampliar o compromisso das práticas escolares com a participação mais ativa das famílias dos alunos, especialmente dos avôs e avós, como por exemplo, nas rodas de leitura. Sei de escolas onde já há uma agenda de compromisso dos avós para a contação de histórias semanal.
“A amizade e o amor entre crianças e pessoas ‘de idade’ é dos temas férteis na filosofia e na literatura. A força desse encontro talvez tenha a ver com o fato de que ambos, em geral, têm mais tempo livre em seu cotidiano (o tempo, essa dimensão tão cobiçada na mitologia contemporânea), e por isso consigam melhor falar e ouvir uns aos outros. À margem da correria dos adultos jovens para “ganhar a vida”, idosos e crianças podem de fato ganhá-la, saboreando o presente do momento em que estão juntos sem passado nem futuro.”
Parabenizo aqui professores e escolas que já incluíram de forma mais intensa e regular a participação dos avós em suas práticas.
“O velho já pode olhar mais ceticamente os maneirismos sociais de seu tempo, até porque sente-se cada vez mais desobrigado deles. A sabedoria dos velhos vem da consciência da fugacidade do tempo e do consequente apreço pelo instante presente, lugar em que acabam se encontrando com as crianças.”
Aqui e ali, entre um cafezinho e outro nas padarias da cidade, tenho ouvido de alguns avós manifestações sinceras do desejo de contribuir mais intensamente para as práticas escolares e para o intercâmbio de valores humanos com todos os que atuam no espaço escolar.
Vamos crer nesse novo tempo que sem dúvida é um presente?
Aproveito aqui para saudar os educadores nesse tempo de inicio de ano letivo e desejar serenidade, paz e sabedoria nesses dois semestres de 2013 e que as boas notícias sobre a melhoria das condições de trabalho cheguem a cada dia. Inclusive com o apoio dos avôs e avós. E viva o conhecimento! 

*O artigo da professora Gilka pode ser encontrado no livro A arte de encantar – o contador de histórias contemporâneo e seus olhares. Organização de Fabiano Moraes e Lenice Gomes. São Paulo, Editora Cortez. 2012.  A professora é Coordenadora do centro de Educação da Universidade de Santa Catarina e coordena ainda a Oficina Permanente de Narração de Histórias e o Núcleo de Pesquisa Infância, Comunicação e Arte. É contadora de histórias da Biblioteca Barca dos Livros. www.nica.ufsc.br e www.aurora.ufsc.br. 

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