Natividade
Neste mês de junho, mês dos namorados, nada como uma boa História Mineira
Natividade era louca por Joaquim Bitú, parecia coisa feita. Bastava vê-lo e seu coração desandava a bater dentro do peito feito cabrito montês, e ela se sentia toda envergonhada e faceira.
Joaquim Bitú nem desconfiava que a atrapalhação da moça fosse por conta dele e seguia em frente passarinhando outros amores.
As amigas de Natividade lamentavam sua falta de amor próprio, pois, quanto maior o pouco caso de Bitú por ela, mais seu amor por ele crescia.
Pois foi de tanto ser desprezada que, um dia, Natividade acordou com a avó atrás do toco, de juízo virado. Disposta a fazer qualquer coisa pra conquistar o amor de seu bem-amado.
Era véspera de Santo Antônio e ela se lembrou de ter ouvido dizer que Pai Antônio, um benzedeiro ali da região, sabia fazer uma simpatia no justo dia do santo que lhe dera o nome, pra se conseguir a pessoa amada, bastando pra isso, que lhe dessem alguns fios do cabelo dessa pessoa.
— Ora — pensou ela — porque não pensei nisso antes?
E não perdeu tempo. Mandou um recado pra Filismino, que era empregado de Bitú, pedindo que ele desse uma chegadinha até sua casa, pois queria ter com ele dois dedos de prosa.
Filismino, que há muito se interessava pela moça, pensou que a coisa podia ser com ele. Então, tomou banho demorado, passou cheiro turco no cabelo, amarrou um lenço cor de palha no pescoço, e assim, todo frajola, foi à casa de Natividade.
Mas sua ilusão durou pouco, pois assim que ela o avistou, foi logo dizendo:
— Ô Filismino, meu anjo, se eu lhe pedir um favorzinho cê faz pra mim?
— Uai, Natividade — respondeu ele disfarçando o desaponto — se tiver ao meu alcance... desejo seu é ordem!
— Sabe o que é Fili? É que eu preciso de uns fios de cabelo da linda cabeleireira de Joaquim Bitú, pra fazer uma simpatia pro bem dele. Agora, é sem indagação... é pode ou não pode...
— Tá certo... — respondeu Filismino voltando pro rancho, pensando numa maneira de fazer Natividade pagar por esse desaponto.
Foi quando bateu o olho em Fulô. Uma mulinha recém-chegada no rancho, e viu que o couro da barriga de Fulô era assim todo coberto de uns fios de cabelo bem fininhos.
— É... vai ser bem mais fácil do que eu pensava — disse ele pra si mesmo. — Acho que nem vou ter que incomodar o patrão...
Cortou uns fios de cabelo de Fulô, fez um embrulhinho e o levou bem cedinho pra casa de Natividade.
A moça ficou louca de alegria! Deu-lhe muitos abraços de agradecimento, e depois correu à casa de Pai Antônio.
Encontrou o benzedeiro sentado na soleira da porta pitando cachimbo. Entregou-lhe o embrulhinho. Ele levantou pra ela os olhos cansados, deu uma risadinha e balançou afirmativamente a cabeça fazendo com que o coração de Natividade se enchesse de esperança.
À noite, estava lá Filismino se aprontando para a festa, quando ouviu uma inquietação lá pros lados das mulas. Olhou pela janela, e viu uma delas dando uns pulinhos miúdos e depois, num salto, ganhar estrada!
Ele não perdeu tempo: correu atrás da fujona! Atravessaram a estrada, entraram na cidade, passaram pela igreja, pela escola, pela praça, pelo coreto; Filismino gritando e a mula desembestada sem que ninguém pudesse agarrá-la!
Até que, de repente, ela empacou na porta de Natividade toda arrepiada e zurrando sentimental.
A moça, ouvindo aquela zoada, saiu de casa com uma vassoura na mão gritando: Saí peste! Fora daqui!
Mas em vez da mula fugir, foi-se chegando toda amorosa querendo lambê-la!
Foi aí, foi só aí, que Filismino viu que a tal mula era Fulô. A dita cuja da qual ele tinha cortado os pelinhos.
Aí, bem, aí, suas pernas ficaram moles e ele caiu no chão com os olhos idiotamente abertos! Dizem que nunca mais ele se recuperou.
Dizem também que Fulô ficou pra sempre na porta de Natividade e que por causa disso Joaquim Bitú foi muitas, muitas vezes à casa de Natividade tentar entender o que estava acontecendo. E nessas idas puxou conversa, a conversa puxou namoro, o namoro noivado e depois casamento.
E que até hoje, quando alguém lhe pergunta como foi que ela conquistou Bitú, ela responde toda misteriosa:
– Foi o santinho, sabe, foi o Santo Antônio!
História popular recontada por
Maria Ignez Corrêa, escritora, fonoaudióloga
e contadora de histórias do Confabulando.
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