Escritor radicado em Friburgo lança livro sobre a arte de procrastinar

Rogério Madureira mostra que é possível conciliar produtividade com o jeitinho brasileiro de deixar tudo para depois
terça-feira, 29 de outubro de 2019
por Adriana Oliveira (aoliveira@avozdaserra.com.br)
A capa do livro
A capa do livro "A Arte de Procrastinar" (Reprodução da web)

Carioca de nascimento, friburguense de coração - ou por usucapião, como ele diz -  o escritor Rogério Madureira Tavares, de 47 anos, está lançando seu quarto livro,  "A Arte de Procrastinar", no qual ele mostra ser possível conciliar produtividade com o jeitinho brasileiro de deixar sempre tudo pra depois. Nesta entrevista, que levou um mês entre ser combinada e efetivamente produzida, ele explica seu trabalho, que pode ser acessado aqui ou aqui. 

A VOZ DA SERRA: Fale um pouco de você, sua relação com Nova Friburgo.

Rogério Madureira: Eu sou nascido no Rio, mas vim para cá com 13 anos. Morei  aqui até me casar pela primeira vez, aos 22. Depois morei em Petrópolis, depois no Rio de novo e então São Paulo, onde fiquei por 15 anos. Estou de volta há uns quatro anos.

O que mudou na cidade desde que você saiu?

As árvores! Elas dobraram de tamanho! Foi o que me deu um susto quando cheguei. De resto, os engarrafamentos monstruosos nos horários de rush, que simplesmente não existiam quando fui para São Paulo. Mas gosto muito do clima, sem dúvida, o melhor que eu conheço no Brasil. É frio, porém não tanto quanto no extremo Sul do país. É uma cidade com uma paisagem de tirar o fôlego, como nunca vi em nenhum outro lugar que visitei no Brasil. Tenho um pequeno chalé no alto da Cascatinha e gosto muito dessa paisagem de montanha. Talvez não seria a mesma coisa se eu morasse no Centro, por exemplo.

Explique melhor o caudaloso título do seu livro: "A Arte de Procrastinar: Estratégias criativas, simples e concisas para você realizar adiando". Como é possível "realizar adiando"? Não é antagônico?

Antes de mais nada, boa parte do que eu escrevo vem da minha experiência com estudo e prática de Marketing Direto, em particular algo que se chama "engenharia humana" (“Human Engeneering”) de Alfred Korzybski, rebatizado mais recentemente de “Engenharia Social” (ou “Human Hacking”) por Christopher Hadnagy, trabalhos absolutamente desconhecidos no Brasil. De modo que, boa parte do que eu afirmo aqui, em meus livros, palestras e consultorias, é empírico, predominantemente baseado na lida com as pessoas no mercado. Minha especialidade maior é em Vendas e Marketing Direto.

E o que tem Vendas a ver com procrastinação?

Tudo! Para vender bem, é preciso conhecer como a máquina humana funciona. Conhecer a razão, o motivo por que as pessoas compram, é muito mais importante do que saber o que as pessoas estão comprando. Descubra o que elas estão comprando e você venderá bem apenas uma coisa. Entenda por que elas compram e você venderá qualquer coisa.

Isso tem a ver com a psicologia da compra?

Sim. As pessoas se escravizam a ferramentas e têm um trabalho danado para vender, mas a psicologia é muitas vezes mais importante que a tecnologia. Quem afirma isso é Paco Underhill em seu clássico "Why we buy" ("Por que nós compramos", traduzido para o português com o título cretino de "Vamos às compras!").

 Mas então, voltando ao título, como é possível "realizar adiando"?

Aqui há uma mudança de paradigma. As pessoas têm na cabeça que procrastinação é algo ruim e que ser produtivo é bom. Em outras palavras, buscar a produtividade é a coisa certa a fazer. E as pessoas pensam assim porque foram adestradas a pensar assim pela indústria editorial, que é a parte da grande indústria que dissemina aquelas ideias que mais a vão beneficiar. Mas será que é assim que tem que ser? Será que é natural seres humanos ambicionarem produtividade a todo custo? Sob o ponto de vista individual, será que isso é normal? Será que, do ponto de vista coletivo, da sociedade, a produtividade é realmente a coisa mais importante a ser buscada? 

Mas as pessoas precisam sobreviver, precisam trabalhar para ganhar dinheiro, precisam ser produtivas para continuarem empregadas...

Sim, esta é uma ideia que foi “normalizada", isto é, massificada através de costumes e ideologia. É quase um "meme" que se instala na mente das pessoas. Como"trabalho enobrece" ou "decisão judicial não se contesta, se cumpre" ou "as pessoas precisam pagar suas contas". São ideias não  necessariamente normais. O "trabalho enobrece", claro, mas trabalho infantil é crime, trabalho escravo também. Só que o meme não tem limites. Até bem pouco tempo, era legal comprar seres humanos e os obrigar a trabalhar. Até bem pouco tempo atrás, a mulher era tida como posse marital do homem e a justiça amparava isso tudo com leis que dificultavam extremamente o divórcio. 

 Ainda bem que o mundo mudou, não é?

O mundo está hoje diferente em aparência mas nem tão diferente assim em substância. Eu creio que a escravidão mudou de intensidade mas se ampliou em quantidade. As pessoas não estão mais presas a correntes, mas a seus celulares.

Vendo memes, né?

As pessoas não se apercebem, mas a sociedade inteira está sendo reprogramada. Por isso as coisas estão mudando com tanta velocidade. Os memes comandam as pessoas. Nós agimos, individualmente e em grupo, de acordo com os memes que temos instalados em nossas mentes. 

E o que tudo isso tem a ver com o hábito de procrastinar?

Procrastinar é uma reação natural do corpo. Assim como a ansiedade e a depressão.Quando você quer muito algo ou quando não quer muito algo, seu organismo como um todo acompanha esse desejo e a maneira natural de manifestar isso é com ansiedade. É uma forma do corpo mover você para a ação.  Já a depressão se manifesta quando você absolutamente não age, não faz nada. É simplesmente um mal-estar natural por falta de ação. Quer acabar com a depressão, mova o esqueleto, entre em uma aula de dança, de natação, de artes marciais, qualquer coisa que haja muita ação. Quanto mais ocupar os espaços vazios com atividades, melhor. Já a procrastinação acontece naturalmente no espectro oposto: quando há sobrecarga do organismo. Quando você faz coisas demais, como mal, se estressa, resolve um problema atrás do outro… 

E o que você sugere então?

Respeitar seu corpo. Compreender suas reações naturais. Para de lutar contra o inimigo errado. Parar de se machucar, de se ameaçar, de se violar. Entender de uma vez por todas: você nasceu para ficar do seu lado. Portanto, aja em conformidade! Isso se chama "harmonizar-se", parar de querer coisas desconexas, controversas. Isso é amor próprio.Quando você se pacifica, as coisas acontecem naturalmente. A mente só é criativa quando está relaxada. É um mito achar que ela produz sob pressão, sob medo, sob ameaças. Tudo o que você conseguirá extrair de sua mente nesses estados é um comportamento robotizado, artificial. E isso não é viver, é sobreviver. Meu livro tem esta única ambição: mostrar que a vida é para ser vivida e que não é necessário fazer metas, planos nem nada desse monte de baboseira que a indústria editorial tenta nos fazer engolir goela abaixo. Já estamos vivendo! Temos que parar de insistir fingir que estamos vivendo.

 

 

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