Escolas de samba se movimentam para arrecadar recursos e financiar os desfiles

sexta-feira, 02 de maio de 2014
por Jornal A Voz da Serra
Escolas de samba se movimentam para arrecadar recursos e financiar os desfiles
Escolas de samba se movimentam para arrecadar recursos e financiar os desfiles

Vinicius Gastin

Desde o dia seguinte aos desfiles carnavalescos, as escolas de samba de Nova Friburgo começam a planejar o carnaval do próximo ano. O planejamento inclui visitas aos barracões das escolas de samba cariocas, e até mesmo um intercâmbio com agremiações do sul do país. Entretanto, o maior desafio é levantar recursos para financiar as apresentações, orçadas em 200 mil reais, em média. As subvenções municipais, de 46 mil reais, cobrem apenas 25% dos gastos e são liberadas às vésperas dos desfiles, quando todo o material já foi comprado.

"Se quisermos brigar por títulos, nós temos que nos adequar à realidade de Nova Friburgo. Ou seja: fazemos um dinheiro, no final de março e início de abril vamos ao Rio de Janeiro para comprar algumas fantasias e alegorias e complementamos com a mão de obra daqui. A Alunos do Samba, até hoje, fez tudo aqui. A escola só vai pra avenida porque o povo conta aquela história. Temos municípios que pagam 180 mil e as escolas apresentam desfiles fracos. Precisamos pensar o quanto o carnaval gera de receita para a cidade”, pondera o presidente do Alunos do Samba, Felipe Borges.

Uma das saídas para as agremiações friburguenses é alugar os barracões para eventos ou mesmo promover festas durante o ano. O valor arrecadado, no entanto, não chega a 3% do total de gastos das escolas --- o restante provém de patrocinadores e da ajuda de seus componentes. A Unidos da Saudade, por exemplo, realiza bailes às sextas e domingos, e esporadicamente aos sábados. "Nosso carnaval custou cerca de 400 mil reais, e com os aluguéis das quadras, cobrimos apenas 1% deste valor. Quando o evento é promovido pela escola, o percentual dobra, mas ainda é muito pouco”, afirma o diretor de carnaval da roxo e branco, Robson Poubel. 

A Imperatriz de Olaria segue pelo mesmo caminho, e promove rodas de samba e feijoadas para a comunidade. Em processo de reestruturação, o Alunos do Samba organiza eventos voltados para a família e, desta forma, tenta angariar recursos para mexer na quadra e organizar os desfiles do próximo ano. A interdição do espaço em 2013 foi apontado como o principal motivo para o Alunão desistir dos desfiles deste ano.

"Vamos mudar algumas coisas. Queremos, por exemplo, trocar o palco da quadra e adaptá-lo ao que deve ser em uma escola de samba. Nós procuramos sempre ouvir a comunidade. Se eu posso ter ensaios e eventos até 22h, é o que eu vou fazer. Queremos a família do distrito na escola de samba”, destaca Felipe Borges.

No caso da Vilage no Samba, a realização de eventos fica restrita ao período próximo à folia. Durante o ano, a quadra se transforma em depósito de fantasias do carnaval anterior. A escola esbarra nas dificuldades para encontrar parceiros e desenvolver os projetos, fato que contribui para a inatividade do barracão. "O recurso que a escola tem é esse: pegar a fantasia e revender. Se existisse alguma parceira para projetos, as crianças poderiam estar lá restaurando as fantasias e aprendendo alguma coisa. Falta uma parceira com a iniciativa pública. As pessoas criticam os investimentos feitos nas Escolas, mas não conhecem as dificuldades”, destaca Betão, mestre-sala da verde e branco.

 

Eventos realizados na Unidos da Saudade são responsáveis por cobrir apenas 3% dos gastos com os desfiles

 

Quadra do Alunos do Samba deve passar por pequenas reformas para receber os ensaios

 

Enredo da roxo e branco sobre a cerveja custou cerca de 400 mil reais


Preocupação com o futuro do carnaval

Os gastos cada vez mais elevados e as dificuldades para colocar a escola de samba na avenida preocupam os envolvidos no mundo do samba. Outro ponto em discussão é a terceirização do processo de montagem de fantasias e alegorias, que reflete na dificuldade de renovação dos componentes nas agremiações.

"Todo o dinheiro da subvenção é gasto no Rio de Janeiro e não fica nada aqui. O projeto social poderia ser uma saída, com um trabalho dentro dos barracões para tirar as crianças rua. Poderiam ensinar a fazer um adereço, uma fantasia. Estamos exportando talentos, mas não existe um trabalho de renovação. Se eu não desfilasse, iria para a praia. Não existe valorização.”

Betão é exemplo de jovem que trocou as ruas pelo samba através do Projeto Kurumim, desenvolvido pela Imperatriz de Olaria. O sambista revela o desejo de resgatá-lo e criar uma escolinha para mestres-salas e porta-bandeiras, em parceria com outros casais do município. A ideia é não ter uma sede específica e percorrer os bairros. "Observo toda essa situação com muita tristeza e preocupação, porque o samba é cultura. Aprendi muitas coisas com os enredos de escolas. As pessoas deveriam deixar de pensar no carnaval como uma farra, e observar esse tipo de coisa. Eu saí da rua por conta do carnaval, e posso dizer que o samba deu o melhor que tenho. Um ex-vereador prometeu uma parceria, mas ele não se reelegeu. Gostaríamos de andar pelas localidades e escolas. Levar uma bateria, os casais e apresentar aos meninos e meninas.”

 

Fantasia x uniforme

Sem atividades, sambistas voltam à realidade dos empregos

Fim de folia. Viver apenas do samba é uma realidade restrita ao carnaval do Rio de Janeiro e, por isso, os sambistas abandonam os barracões e voltam à vida tradicional. Mestre-sala da Vilage, Betão troca as sapatilhas pelas botas, a fantasia pelo uniforme e volta à rotina de metalúrgico na Stam, produtora de cadeados e fechaduras, em Conselheiro Paulino, das 7h às 16h18. Alessandra, porta-bandeira e esposa, trabalha na mesma empresa, e à noite atua como professora. "A gente volta ao ritmo normal. Procuro ter uma boa alimentação, e quando saio do trabalho faço alguma atividade física para manter o corpo em dia e não sofrer tanto no ano que vem. No começo desse ano eu estava com quase 80kg, e cheguei a 70 no carnaval.”

O bailar fica praticamente restrito ao período da festa de momo, mas a preparação para o carnaval do ano seguinte faz parte da rotina do casal. Betão e Alessandra assistem a alguns vídeos na internet, e observam o desempenho dos sambistas friburguenses e cariocas. "Analisamos, assistimos aos desfiles deles e também do pessoal de Nova Friburgo. Observamos a justificativa dos jurados também. Mas a nossa coreografia é feita por nós, aqui mesmo. A gente mora em um apartamento, mas aos finais de semana colocamos um samba e tentamos fazer um passo diferente. Respiramos carnaval o ano inteiro”, revela.

 

Betão e Alessandra vestidos para mais um desfile da Vilage no Samba: após a folia, a volta à rotina do trabalho





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