Após a polêmica dos investimentos destinados pelo Ministério da Cultura para a produção do blog da cantora Maria Bethânia — um montante de R$ 1,3 milhão — criou-se entre alguns setores da mídia a curiosidade de saber onde estão realmente faltando investimentos necessários para suprir a carência do setor no país. Quem foi atrás dessas questões foi a professora Silvia M. Gasparian Colello, formada em Pedagogia, mestre e doutora pela USP, além de pesquisadora e coordenadora do grupo de Estudos e Pesquisas sobre Alfabetização e Letramento (Geal).
Autora dos livros “Alfabetização em questão”, “A escola que não ensina a escrever” e “Alfabetização e letramento: pontos e contrapontos”, Silvia relata que apenas uma mínima fatia de 25% da população brasileira consegue compreender e interpretar diferentes textos — um problema que está associado a múltiplos fatores, como a limitação e a dificuldade de acesso aos bens culturais, a desigualdade social e a democratização do ensino atrelada as condições de vida e de trabalho.
De acordo com pesquisas do IBGE, há 14,2 milhões de analfabetos entre a população acima de 15 anos e 32,1 milhões de analfabetos funcionais. Analisando os estudos do INAF — Índice Nacional de Analfabetismo Funcional —, encontra-se um cenário ainda mais desolador: apenas 25% conseguem interpretar de forma correta um texto. Segundo a especialista, a conclusão parece óbvia: “Ainda que as crianças tenham acesso às escolas e que consigam permanecer nas salas de aula por mais de quatro anos, não há garantia de que seja cumprido o mais básico dos objetivos da escolaridade: a efetiva aprendizagem da língua escrita”.
Ainda de acordo com a educadora, o compromisso de ensinar a ler e a escrever na escola deve ser uma meta imprescindível para todos os educadores. Meta porque alfabetizar deve ser mais que um compromisso, deve ter resultados efetivos como atribuição formal de uma escola. “Alfabetizar é mais do que ensinar a escrever corretamente; é garantir ao sujeito a oportunidade de se aventurar na língua para liberar o pensamento e compreender o mundo.”
Relembrando a posição da ministra da Cultura, Ana de Hollanda — irmã do cantor Chico Buarque e amiga íntima de Bethânia —, sobre a já citada destinação de verbas, isso somado ao nome do blog da cantora — “O mundo precisa de poesia”—, torna-se extremamente necessário a transcrição íntegra da orientação de Sílvia acerca do que realmente é vital: “Antes de qualquer coisa, compreender a natureza da língua, os processos de alfabetização, os mecanismos de construção cognitiva, as relações do sujeito aprendiz com a sociedade letrada, a realidade da formação e das condições de trabalho dos professores e, finalmente, os percalços da transposição didática para um ensino de qualidade são caminhos indispensáveis para todos aqueles que se importam com educação, entendendo-a como instrumento de luta pela consolidação da democracia do país.”
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