Em meio a crise e a diminuição do dinamismo, mais do que nunca é preciso investimento

Caderno Light entrevista o professor Hamilton Werneck, que fala dos caminhos para a educação em Nova Friburgo dentro desse cenário
sábado, 04 de fevereiro de 2017
por Jornal A Voz da Serra
Hamilton Werneck (Foto: Reprodução Facebook)
Hamilton Werneck (Foto: Reprodução Facebook)

Chegamos ao último fim de semana de férias. Segunda-feira é dia de volta à rotina escolar. Mas, e o ânimo, tanto dos alunos, como dos educadores, como está? O professor e conferecista que assina coluna sobre educação em A VOZ DA SERRA às quartas-feiras comenta como enfrentar esse desafio, as necessidades de investimentos no setor e os caminhos para a educação em Nova Friburgo.

Light: Professor, as aulas recomeçarão na próxima segunda-feira. O que se pode esperar do sistema educacional brasileiro?

Hamilton Werneck: Em todos os níveis a tendência será pela diminuição do dinamismo por causa da crise econômica e dos remédios amargos aplicados. Para mudar, a educação requer mais investimento, pelo menos por um tempo determinado. Se a educação ficar atrelada às normas de toda a economia, não haverá esperança de grandes transformações. A esperança está na possibilidade de remanejamento de verbas de outros setores.

O que mudou com o projeto de lei dos gastos, votado e amplamente aprovado pelo Congresso Nacional?

Mudou todo o planejamento dos investimentos em educação. Não temos mais a meta de aplicação de 10% do PIB neste setor que deveria ser atingido em 2024. Portanto, as metas de aplicação do tempo integral de estudo está descartada. Para se ter um tempo integral, necessitaremos de espaço físico, verbas e formação de professores. Não teremos disponibilidade para isso. Quando se fala em formação integral, ela poderá existir mesmo com tempo parcial, contanto que os professores participem de programas de formação continuada. E, para a formação continuada, as secretarias de educação dos municípios têm como se organizar. Demanda inteligência, planejamento e vontade política.

Se o Congresso Nacional votou as medidas econômicas, todos eles como representantes do povo não deveriam ter pensado nessas consequências?

Deveriam, sim. Mas, minha percepção em relação ao conjunto de deputados e senadores é que eles não elegem a educação como ação prioritária e transformadora. Na minha visão eles não acreditam nisso, a não ser uma parcela muito pequena que ainda reflete sobre estas questões. Não é de se estranhar que o Brasil foi o último da América do Sul a ter universidade, a proclamar a independência e a república, mesmo com todos os disfarces embutidos nas leis, foi o último a abolir a escravidão e será o último a acabar com os analfabetos. A educação esteve, em nossa história, em segundo plano. E, o pior, é que ainda está no mesmo patamar.

Professor, você acha que é possível aprovar o projeto de lei que fala das escolas sem partido?

As escolas não pertencem a partidos políticos. Os professores, os alunos e os pais podem ter tendências variadas segundo a legislação. Considero uma das mais imbecis propostas que já se propalou pelo Brasil. O Ministério Público Federal já se pronunciou pela inconstitucionalidade desta proposta. O que penso a este respeito é que o proponente ou proponentes não querem uma escola que forme o cidadão. Querem uma espécie de robô ou papagaio que fala ou repete sem saber o significado das coisas que fala e faz. Se quisermos criar uma geração de idiotas úteis, este será o caminho. Será o pior para a nação. Passar pela escola e de lá sair sem ser cidadão.

E quando um docente retira pontos de uma resposta do aluno porque ele pensa de forma contrária à ideologia do professor?

Trata-se de uma concepção errada em avaliação. O professor pode pensar como quiser, no entanto, se na pergunta ele pedir a opinião dos alunos em relação a dois ou mais textos opostos e que questionam a economia do país ou de uma região do globo, só poderá corrigir dentro da lógica do pensamento, da argumentação usada e da coerência. O docente tem a obrigação de acatar a opinião expressa. Afinal, a pergunta não foi nesse sentido?

Professor, você prevê quais caminhos para a educação de Friburgo com esta nova gestão?

Sua pergunta inclui, a meu ver, a estratégia. O governo municipal quer um choque de gestão. Isto significa que, também a educação, deve adequar seu pessoal às necessidades da rede de ensino. Mantendo o choque de gestão é necessário organizar a educação, delineando o que vai ser ensinado (teaching) com o mais importante: a aprendizagem (learning). Não é, simplesmente, muita gente que soluciona um problema. Trata-se de gente certa no lugar certo. Para se conseguir isto é necessário que este choque visualize a necessidade da formação continuada dos professores, adequando seus saberes às necessidades da clientela. Alguma experiência de tempo integral e formação integral seria necessária. O processo mais barato e que inclui uma economia em escala é o da criação de Centros de ensino. É a experiência da cidade de Rio do Sul-SC.

A educação no Brasil vinha discutindo a teoria do gênero, parece-nos que, com a mudança de governo, este assunto arrefeceu. Como a escola deve tratar essa questão?

Esta questão teve abordagem mais forte no congresso feminista de Pequim em 2005. Cresceu em vários países. A primeira coisa a considerar é que se trata de uma hipótese e, não, de uma teoria. Teorias correspondem à realidade e devem ser provadas. No campo do estudo da hipótese, concordo com o debate. Como teoria, não. Nós estamos num processo de busca de solução. Na verdade, todos nós nascemos sexuados, o que não significa que a realização psicológica da afetividade tenha relação direta e não modificada, apesar da genitália. Tais manifestações que sejam contrárias à formação física do corpo podem ocorrer, no entanto, a escola e a família deverão tratar a criança de acordo com o que seu físico apresenta, sem neuroses classificatórias de que tais brinquedos são próprios de meninos ou meninas. A escola e a família, no entanto, precisam estar atentas para o fato do surgimento de singularidades diferentes, ou seja, pessoas fisicamente masculinas que tenham comportamento típico do outro gênero e que não se realizam com o chamado sexo oposto. Nesses casos a orientação e os esclarecimentos precisam existir e uma reformulação em relação à convivência devem acompanhar. A humanidade até hoje não conseguiu uma explicação para este fato. É preciso entender que a definição da realização sexual faz parte da singularidade da pessoa e não considero função do educador direcionar conforme seus paradigmas. O respeito aos seres humanos, frutos da criação, tornam-se necessários. Nós não temos o direito de tratar mal um ser humano porque ele é diferente. O importante é continuar estudando e discutindo porque não temos ainda definições satisfatórias. Só o campo da crença e de algumas crenças é que direciona e condena.

Quais as suas esperanças para 2017?

Esperança, relacionada ao verbo esperançar, são muitas. Não vivo o ditado “quem espera sempre alcança”. Para mim, este ditado é uma balela, é um engodo. Quem fica esperando acaba amargando o fracasso. Os professores e professoras deste país ainda têm esperança e este fator poderá trazer mudanças apesar das leis, às vezes, atrapalharem. Espero um 2017 onde continuarei minha caminhada de nômade moderno! Grato pela oportunidade de poder me expressar neste fantástico caderno de  fim de semana de A Voz da Serra.

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