Henrique Amorim
O primeiro sargento do Corpo de Bombeiros, Joilton Estevan Lima, 47 anos, após 29 anos de carreira, teria tudo para não encontrar mais sentido algum na vida. A catástrofe climática do último dia 12 de janeiro vitimou fatalmente sua principal razão de viver: a esposa Geisa Quintanilha Estevan, que morreu soterrada aos 43 anos, com o desabamento da casa onde os dois moravam, há um ano e meio, no condomínio Vale dos Pássaros, na localidade conhecida como Ponte Preta, próximo a Córrego Dantas. A união de 17 anos, marcada pelo amor e total cumplicidade entre ambos, sem brigas, espelha-se na solidificação da confecção de roupas infantis Kamélique, na Rua Raul Melhado, no Prado, distrito de Conselheiro Paulino, onde Geisa comandava 12 funcionárias, dividindo com elas a produção das peças.
Agora, Joilton, em homenagem à amada, decidiu manter o empreendimento e fazê-lo crescer cada vez mais. “Não tenho mais a Geisa, mas ela me deixou o que mais gostava de fazer: o trabalho na confecção, onde tenho só boas lembranças dela. A Geisa merece que eu dê a volta por cima”, garante Joilton, que se emociona ao falar da esposa e lembrar momentos marcantes da vida a dois e no gerenciamento da confecção, que produz modelos exclusivos da grife infantil Sucekids. Joilton quer expandir o empreendimento aproveitando o crescimento da rede, que já possui 25 franquias no Brasil do selo Bebê Básico.
Todo o êxito obtido com a confecção de roupas infantis Joilton atribui às amigas Ana e Márcia, que permitiram ao casal, em 2004, trocar a produção de sutiãs, que acumulava prejuízos ante a desleal concorrência chinesa, pela linha baby. As amigas, inclusive, eram chamadas por Geisa de “anjos da guarda”, por terem permitido que a confecção não fechasse as portas e, pelo contrário, expandisse.
Uma união marcada por boas lembranças
Uma das maiores emoções da vida e que Joilton faz questão de não esquecer é a cerimônia de casamento com Geisa, ocorrida em 7 de março de 2009, no espaço Multifestas, no Córrego Dantas, com o pastor Ricardo Bessa, da Igreja Presbiteriana.
“Programamos todos os detalhes da festa de oficialização da nossa união. Até as músicas escolhemos juntos. A Geisa teve outra grande emoção no casamento: reviu a filha, Juliana, que mora nos Estados Unidos e viajou à Nova Friburgo especialmente para nos abraçar”, recorda-se. Após o casamento Joilton, que tem outros três filhos de um relacionamento anterior, e Geisa realizaram outro grande sonho: a aquisição da casa própria.
Depois das dificuldades enfrentadas com a concorrência dos produtos chineses, o que abalou a confecção, Joilton e Geisa adquiriram uma chácara de 160 metros quadrados no Condomínio Vale dos Pássaros, com 350 metros de jardim, outra paixão de sua amada, que lhe consumia momentos diários de dedicação no cultivo de flores e plantas ornamentais. Afastado de suas funções militares por conta de uma hérnia de disco, Joilton se encantava ao constatar a dedicação da esposa às tarefas profissionais e domésticas. “Tinha na Geisa minha maior razão de viver, e em segundos minha vida mudou. Mudou meu juízo de valores com a perda brutal da minha Geisa”, diz Joilton.
No dia da tragédia ele foi alertado por um dos filhos, que telefonou para informá-lo da forte chuva e apelou para que ele e Geisa não saíssem de casa. “Imediatamente fui verificar o entorno da casa. Quando percebi que muita lama de uma encosta estava chegando perto da varanda, acordei a Geisa e decidimos sair. Mas não deu tempo: fomos soterrados ainda na varanda e pude ouvir ela gritar por três vezes – eu vou morrer -, e não mais respirou”, recorda-se Joilton, retirado dos escombros por um vizinho cerca de 40 minutos depois, com fraturas de costelas que atingiram também seus pulmões. Ainda durante a fatídica madrugada, outra avalanche arrastou o corpo de Geisa, que só foi encontrado no dia seguinte.
“A aliança de casamento foi retirada do dedo dela por uma amiga, que reconheceu o corpo da Geisa no Campo do Coelho, e fez chegar até mim. Me lembro com emoção da fala do meu neto, de 4 anos, que disse, ao ver a aliança: fui eu que entreguei as alianças no casamento e agora ela [Geisa]não está mais aqui”, emociona-se Joilton, que faz questão de manter a aliança da esposa em sua mão esquerda, junto com a dele. “Daqui para frente vou juntar os pedaços e tocar a vida, que não tem mais cor, nem odor, mas, em nome da Geisa, vou continuar. Ela merece esse esforço. Como expressamos no nosso convite de casamento: Tudo o que é bom dura o tempo necessário para ser inesquecível”, sustenta Joilton, que elaborou uma homenagem especial à amada.
A homenagem póstuma
de Joilton para Geisa
Vivemos por 17 anos uma maravilhosa história de amor,
a qual gostaríamos que todos tivessem vivido
e ainda tenham a oportunidade de viver também.
Agora nos resta continuar vivendo,
não da forma que escolhemos,
mas da forma que podemos.
O nosso amor continua...
Falta ar, falta cor, falta odor...
Só não falta o AMOR.
Minha eterna amada,
minha eterna namorada
Um dia encontro com você
Minha vida, G...
Um verdadeiro amor de mulher, de companheira, de amiga, de mãe, de vida, de felicidade..
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