E se não fossem as vovós?

Com creches e escolas em recesso a partir do próximo dia 16, pais que trabalham têm que buscar ajuda para cuidar dos filhos
quinta-feira, 15 de dezembro de 2016
por Dayane Emrich
Creche Padre Luiz Yabar (Foto: Arquivo A VOZ DA SERRA)
Creche Padre Luiz Yabar (Foto: Arquivo A VOZ DA SERRA)

É direito do trabalhador urbano e rural, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, a assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas. É o que diz o artigo 7º, inciso XXV, da Constituição Federal Brasileira.

No entanto, embora a lei garanta o direito, sacramentado na constituição de 1988, na prática, a concessão da norma passa por uma série de entraves. Um deles é que em vez de serem consideradas como ação de assistência social ou apoio aos pais trabalhadores, as creches são assunto das secretarias de educação.

Entendida como a primeira fase do sistema de ensino, as creches tiveram seu calendário, naturalmente, unificado com os das escolas, que preveem apenas 200 dias letivos ao ano. Desta forma, fica aberta uma questão: como os pais que trabalham e não têm com quem deixar os filhos fazem para trabalhar no período de férias escolares? Afinal, nem todo mundo tem vovó para ajudar, certo?

Juliana da Rocha Boy trabalha das 7h às 17h, como costureira em uma confecção em Conselheiro. A jovem, de 23 anos, tem uma filha de 2 anos que, desde os seis meses de idade, fica em tempo integral em uma creche também no distrito. Juliana conta que, ao longo do período de recessão da instituição, tem que recorrer à mãe. “Durante as férias ela fica  com a avó. O problema é que minha mãe trabalha como costureira em casa e é muito complicado conciliar o serviço e cuidar de uma criança. Já pensei em pagar alguém pra ficar com ela mas, infelizmente, ainda não pude”, disse, explicando que entra de férias do trabalho quase um mês após a paralisação da creche onde a filha está matriculada.

A situação de Géssica Fernandes, de 29 anos, é ainda mais complicada. Ela tem dois filhos em escolas diferentes na rede pública. Um está matriculado em uma creche em Duas Pedras, em horário integral, entrando às 7h30 e saindo às 17h, e o outro estuda na General Osório, em horário parcial, de 12h30 às 17h. “Meu horário de trabalho é de 10h às 19h. Ou seja: eu saio de casa às 7h, levo um para a creche em Duas Pedras, e volto a pé correndo pra arrumar tudo em casa e estar no trabalho às 10h. Na hora do almoço, 12h30, vou correndo em casa, busco o outro e levo até a General Osório. Como preciso pegar os dois no mesmo horário, acabo saindo mais cedo do meu emprego, preocupada com hora, e isso reflete no andamento do trabalho, pelo fato de ser feito em equipe”, explicou.

Apesar do dia a dia de Géssica já ser tumultuado, por conta da logística dos horários e a distância entre as escolas dos filhos, a situação fica ainda pior durante as férias. “Eu sempre tenho que recorrer a amigos para ficar com meus filhos. Geralmente, tiro férias do trabalho durante o mês de setembro, totalmente fora do período de recesso das escolas e creches. Já aconteceu de eu precisar levar as crianças para o trabalho, por não conseguir ninguém para ficar com eles”, contou.

Ainda de acordo com ela, “para completar o quadro, como é fim de governo, a rede pública está na fase de devolver alguns dos imóveis alugados que servem de locação para escolas. Um dos meus filhos terá que vir estudar no Paissandu, ou seja, o lado oposto de onde o outro estuda. Ainda não sei o que fazer”.

Maria Luiza dos Santos, de 22 anos, é outra personagem desta história. Mãe de um menino de 1 ano, ela trabalha como garçonete em um restaurante no Centro e deixa o filho com a sogra. “Trabalho todos os dias, inclusive aos finais de semana. Tenho sempre que estar pedindo ajuda à minha sogra, pois meu marido é motorista de ônibus e também trabalha aos sábados e domingos”, disse, explicando que: “é difícil, para mim, ter que deixá-lo com a avó, pois sei que é puxado para ela, que também trabalha a semana toda. Mas, como a creche fica fechada, não tem jeito. Agora, nas férias, eu nem sei ainda como vou fazer. Acho que terei que contratar uma babá, o que vai sair muito caro; uma despesa que não sei se poderei pagar”, falou.

Os números e o governo

Ao todo, são 44 creches e jardins de infância e 79 escolas em Nova Friburgo. São quase 6.000 alunos da Educação Infantil - do berçário ao Pré-escolar II, ou seja, dos 0 aos 5 anos de idade, e cerca de 11.500 alunos do 1º ao 9º ano.

Em outras palavras, isto significa que, a partir do próximo dia 16, até o dia 6 de fevereiro, quando as aulas retornam, aproximadamente 17.500 crianças e adolescentes estarão sem aula, enquanto os pais, em sua maioria, estarão em horário de trabalho.

“Sou pai solteiro de um menino de 4 anos de idade e não tenho família em Nova Friburgo. Arrumei um emprego há pouco mais de 8 meses aqui e só terei férias no próximo ano. Até então ele fica na creche enquanto eu trabalho, mas não sei como vou fazer. Terei que recorrer a ajuda da minha vizinha”, disse Leonardo Barbosa da Costa, de 28 anos.

Embora já existam exemplos de cidades no Brasil que ampliaram o funcionamento das creches para 12 meses, como em Sarandi, no Rio Grande do Sul, em Nova Friburgo a questão pouco caminha.

Durante sua campanha em 2012, o prefeito Rogério Cabral definiu como meta o ensino integral/ininterrupto, no entanto, em quatro anos, nada foi feito. De acordo com a secretaria de comunicação da Prefeitura, o projeto não entrou em vigor pela falta de recursos. “Embora tenha havido amplo estudo para iniciar a implementação do ensino em tempo integral, além das escolas abrangidas pelo programa Mais Educação (quase a totalidade do ensino fundamental), não houve possibilidade de ampliar essa ação em razão da redução dos repasses estaduais e federais, tendo em vista a crise econômica nacional que assola o país há mais de dois anos. A ampliação das escolas de tempo integral requereria o aumento no número de profissionais contratados e impactaria nos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. Atualmente, todas as creches e cinco escolas são de tempo integral. Da mesma forma, não é possível manter creches abertas durante todo o ano sem recursos para pagamento do contingente exigido para isso. Sem contar com a necessidade que as crianças têm de passarem um tempo com suas famílias, fundamental para o desenvolvimento emocional de todo ser humano”, disse a nota.

A má notícia é que o funcionamento das creches  durante todo o ano também não parece estar entre os planos do próximo governo. Durante o mês de setembro, todos os candidatos a prefeito de Nova Friburgo participaram da série ‘Sabatina’, promovida e publicada diariamente por A VOZ DA SERRA, na qual foram abordadas 19 assuntos, entre eles a educação.

Na ocasião, o prefeito eleito Renato Bravo falou sobre a implantação do ensino integral, mas não mencionou a ampliação dos dias letivos, em especial para as creches. “Ensino de qualidade e educação em tempo integral serão prioridades em meu governo. A escola integral é uma tendência mundial, que possibilitará estabelecermos as políticas públicas necessárias para a governança da educação. Não haverá interferência na carga horária dos professores, pois para o horário estendido serão contratados profissionais especializados nas áreas de artes, esportes, ciências e demais atividades complementares”, disse Bravo, à época candidato à cadeira número do Executivo friburguense.

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