Arthur é um dos meus amigos mais antigos, destes que encontrei por um acaso, nesse caso numa banca de jornais, folheando uma edição de Dragão Brasil enquanto eu tinha uma Bloody Mary* nas mãos. Anos depois, quando já havíamos tido todas as conversas agradáveis do mundo (porque nunca houve discussão alguma), quando já havíamos incendiado meimundo com nossas esquisitices, típicas dos estranhamentos que costumávamos causar apenas com a respiração e a decisão de pôr os pés pra fora da cama pela manhã**, foi a vez do cogumelo.
Nada de uma explosão atômica que recondensasse a realidade em outros tópicos. Não, só o que tivemos (ou eu tive) foi uma enchente colorida de situações mascaradas em psicodelia – inté as goteiras, ’tadinhas, eu via escorrerem pelos telhados e pif poft, espalharem-se em cores pelo piso, que naquela ocasião era o da capela mortuária, o lugarzinho bacana que todos escolhem para viajar lá pelas bandas d’onde vim.
Distâncias efetuadas, o camarada Arthur substituiu seus vícios. Primeiro, mulher e filho. Depois, o sujeito se prega, sem vergonha, um bêbado, gordo, viciado, oh meu Deus, viciado em eletrochoque, o grandessíssimo. Usava em si mesmo uma dessas armas pequenas de choque, das que paralisam temporariamente o atacado e que são usadas como ferramentas de segurança, e era encontrado pela esposa no final da tarde. Ele, tão acostumado ao brilho do próprio vômito quando despertava, teve de se virar como pôde quando os familiares lhe arrancaram a arma de choque.
Da última vez em que eu soube dele, havia arrancado os interruptores da casa e estava mordendo os fios das paredes***.
* Não o drinque, mas uma minissérie em quadrinhos escrita por Garth Ennis e desenhada por Darick Robertson – embora, de fato, olhando para trás, eu perceba que já havia lido essa história bacana de guerra, sangue, gritos de horror e dragões assassinos alguns anos antes de conhecer o camarada referido lá no primeiro capítulo.
** A seleção de sentenças, assim como o caráter revolucionário da dupla em questão, pode dar a entender erroneamente que se trata de um caso amoroso. Não é o caso.
*** É tudo verdade. E também é tudo mentira.
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