Do luxo ao lixo: por que o descarte irregular virou rotina?

Em Nova Friburgo, é comum ver móveis e eletrodomésticos em calçadas e terrenos baldios
sábado, 04 de fevereiro de 2017
por Karine Knust
A multa para quem for flagrado cometendo a irregularidade pode superar os R$ 1.086 (Fotos: Henrique Pinheiro)
A multa para quem for flagrado cometendo a irregularidade pode superar os R$ 1.086 (Fotos: Henrique Pinheiro)

Andar pelas calçadas nem sempre é tarefa fácil, muitas vezes é preciso desviar de buracos, desníveis e postes encontrados pelo caminho. Mas, em alguns locais, ainda existem outros obstáculos a serem enfrentados pelos pedestres: os entulhos. E não é sobre restos de material de obra que estamos falando.

Com o rápido avanço de novas tecnologias e a facilidade de compra, as pessoas quase não têm mais o hábito de consertar aparelhos e objetos. E aí é hora de substituir. A televisão de tubo, por exemplo, é trocada por modernas e compactas TVs de LED. Com os computadores acontece o mesmo: vão-se os monitores enormes, vêm as telas cada vez mais finas. Móveis antigos também são por vezes substituídos por itens novos.

A consequência? Eletrônicos quebrados, eletrodomésticos ultrapassados, móveis antigos e mais uma infinidade de objetos que se tornaram obsoletos, quando não são doados ou vendidos a preços de banana, viram alvo de descarte irregular e vão parar na rua. Só no que diz respeito a lixo eletrônico - que abrange desde pequenos eletrodomésticos, monitores de televisão e telefones celulares - de acordo com levantamento feito por uma iniciativa liderada pela Organização das Nações Unidas, é descartado, em média, por cada ser humano, sete quilos todos os anos. Em todo o mundo, o total é de 48,9 milhões de toneladas de dispositivos elétricos jogados fora — o suficiente para cobrir três quartos da linha do Equador com caminhões carregados de 40 toneladas de lixo.

De acordo com o documento "E-Waste na América Latina: Análise estatística e recomendações de política pública", da Associação de Empresas da Indústria Móvel (GSMA) e da Universidade das Nações Unidas, o Brasil é responsável por 36% de todo o resíduo eletrônico produzido na América Latina. Em 2014, o total foi de 1,4 milhão de toneladas.       

Em Nova Friburgo, segundo a prefeitura, a estimativa é de que pelo menos mil toneladas de lixo irregular sejam descartadas todos os meses. “Em fevereiro do ano passado, por exemplo, foram retiradas das ruas entre Ponte da Saudade e Duas Pedras, 1.360 toneladas”, afirma o município.

Um veneno chamado lixo

​Com dados tão agravantes para o meio ambiente, o descarte irregular de lixo tem sido um dos maiores desafios da atualidade. Isso porque, além de poluir visualmente o meio ambiente, muitos materiais são um verdadeiro veneno para a natureza e, por consequência, para o ser humano. Os monitores e televisores de tubo, por exemplo, contém, em média, 1,4 quilo de chumbo. Se ingerido, o metal pode causar danos ao sistema nervoso e reprodutivo.

Para o ambientalista Fernando Cavalcante, em cidades montanhosas, como Nova Friburgo, a população pode estar ainda mais vulnerável ao contato com materiais tóxicos descartados de forma irregular. “Os efeitos na natureza são os mais diversos e catastróficos, e isso varia conforme o tipo de resíduo descartado. Se tratando de Nova Friburgo, um município situado em área montanhosa, com grande aclividade e vales profundos, a situação se agrava mais. Pela lei da gravidade, todo resíduo abandonado e não encaminhado corretamente, vai parar nas valas, córregos e rios aumentando o assoreamento, que é uma das causas das inundações e enchentes. Implantar uma Política Municipal de Resíduos Sólidos é uma questão emergencial”, alerta o ambientalista.

Em bairros mais afastados é muito comum ver casos de descarte irregular, principalmente de cômodas, sofás e televisores antigos. Mas o centro da cidade também tem se tornado cenário da ação. Na última semana, por exemplo, a equipe de A VOZ DA SERRA registrou um fogão ocupando parte de uma calçada na Avenida Comte Bittencourt, no Centro.

De acordo com a prefeitura, a responsabilidade de descarte de lixo como esse é do proprietário do objeto. “Ele deve, ao descartar, contratar frete para isso, ou caçamba”, orienta a secretaria de Posturas. Segundo a pasta, a multa para quem for flagrado cometendo a irregularidade pode superar os R$ 1.086 e as denúncias podem ser feitas pelo telefone (22) 2525-9123.

Ainda de acordo com o governo municipal, o local adequado para descarte de móveis e eletrônicos é o Aterro Sanitário da EBMA, em Córrego Dantas. A VOZ DA SERRA entrou em contato com a EBMA para buscar mais informações sobre o recolhimento e direcionamento do material, mas, até o fechamento desta edição, não obteve respostas.

Medalha de ouro em sustentabilidade

Nesta última quarta-feira, 1, o Comitê Organizador dos Jogos Tóquio 2020 deu um show de consciência ambiental. O motivo? O comitê convidou a população japonesa para participar de uma ação doando dispositivos eletrônicos antigos ou que seriam descartados, ou seja, lixo eletrônico. O objetivo é coletar pelo menos oito toneladas de metal, sendo 40kg de ouro, 4.920kg de prata e 2.944kg de bronze para nada mais nada menos do que utilizar os metais para a produção das medalhas dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos.

As toneladas que o comitê pretende arrecadar devem se transformar em 5 mil medalhas. A ação deve começar em abril. Mais de 2.400 lojas e outras centenas de espaços públicos espalhados pelo país farão parte dos postos de coleta. A coleta será encerrada quando a meta de 8 toneladas for atingida.

 

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Em Nova Friburgo, segundo a prefeitura, a estimativa é de que pelo menos mil toneladas de lixo irregular sejam descartadas todos os meses
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TAGS: lixo e entulho | Meio Ambiente
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