O que era para ser uma escolha natural entre muitas gestantes acabou se transformado numa raridade na rede particular de saúde de Nova Friburgo. A exemplo de várias cidades do país, a dificuldade de encontrar um médico conveniado disposto a fazer parto normal vem provocando descontentamento e frustração nas mulheres que sonham em ter seu filho através do tradicional trabalho de parto. A redação de A VOZ DA SERRA vem recebendo algumas queixas sobre o problema, que leva algumas gestantes a uma peregrinação por consultórios médicos. "Meu obstetra foi bem sincero comigo e disse que não faz parto normal nos hospitais particulares de Friburgo porque não compensa. A remuneração é muito baixa e o tempo para fazer um parto equivale ao de cinco cesáreas. Procurei então outros três obstetras na cidade, que também não fazem parto normal”, desabafa uma jovem que terá seu primeiro filho em dezembro e preferiu não se identificar.
Vale destacar que o índice de cesarianas nos hospitais da rede particular de Nova Friburgo segue o dos hospitais privados do Rio de Janeiro e outras cidades do estado, ultrapassando os 90%. Bem acima do estipulado pela Organização Mundial de Saúde, que recomenda que esse percentual não ultrapasse 15%. O dado é preocupante e motivou um grupo de mulheres da cidade a se articular para chamar a atenção sobre a dificuldade de conseguir um parto humanizado nos hospitais privados. Intitulado "Frutos da Serra”, o grupo foi formado recentemente e tem se reunido semanalmente para trocar ideias e lutar, principalmente, por mudanças no cenário obstétrico moderno, que prioriza as cesarianas em detrimento do parto normal.
O grupo também planeja promover na cidade a exibição do filme "O renascimento do parto”, de Érica de Paula e Eduardo Chauvet. Lançado em agosto passado, o filme destaca o número alarmante de cesarianas no país e mostra as consequências clínicas e psicológicas para bebês que costumam nascer antes da hora prevista. Com vários relatos de especialistas, a produção questiona o modelo obstétrico atual e promove uma reflexão acerca de uma civilização nascida sem os chamados "hormônios do amor”, liberados apenas em condições específicas de trabalho de parto, de acordo com os médicos.
Para presidente da Sociedade Médica, indisponibilidade dos obstetras pode ser motivada pela excessiva carga de trabalho
O presidente da Sociedade Médica de Nova Friburgo, Carlos Alberto Pecci, reconhece a dificuldade que as gestantes atendidas pela rede particular de saúde do município têm de encontrar um obstetra disposto a realizar um parto normal. Ele atribui isso a uma série de fatores. O principal deles é a disponibilidade que este tipo de parto exige. "O parto por via vaginal precisa ser rápido, caso contrário pode acarretar riscos para a mãe e o bebê. Por conta disso, é um procedimento que requer uma ampla assistência do médico porque pode levar até 12 horas. Geralmente, o obstetra não pode dispor de todo esse tempo”, explica Pecci.
Outro fator que vem contribuindo para o crescente aumento do número de cesáreas, segundo Pecci, são os avanços da técnica operatória e anestésica. "De 10, 15 anos para cá houve uma evolução extraordinária da cesariana. A anestesia está mais segura e permite um pós-operatório bem mais tranquilo para a mulher e um tempo de internação menor. Bem diferente do passado, quando a alta só era dada após quatro, cinco dias”, observa Pecci, que há mais de 40 anos atua como ginecologista e obstetra.
Para Pecci, a excessiva carga de trabalho dos obstetras também contribui para que estes não tenham disponibilidade de fazer partos normais. "A cidade cresceu muito e o número de usuários de planos de saúde também cresceu e abrange não só moradores de Nova Friburgo como de outros municípios da região. Isso tem deixado os obstetras sobrecarregados. O ideal seria que os hospitais particulares do município tivessem obstetras de plantão. Atualmente, só o Hospital Maternidade conta com uma equipe de médicos e enfermeiros pronta para fazer partos normais”, conclui ele.
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