Diálogo introdutório de personagens

sexta-feira, 05 de abril de 2013
por Jornal A Voz da Serra

Laryssa Frezze

— E agora então eu volto. Onde estão os outros?
— Mortos. As notícias correm...
— Pois eu não ouvi.
— As pessoas morrem...
— Mas não esperava aqui.
— Isso aí é choro?
— Sei que não é um sorriso.
— Você está de joelhos de novo?
— Não consigo manter-me vivo.
— Isso a gente sempre consegue...
— Eu não.
— E que fará?
— Eu vou acabar.
— Deixa de ser tolo que essa gente nunca te quis. Se eles estão mortos foi por que isso fez Deus feliz. Se eles já se foram, nada tinham mais a fazer. Agora enxuga esse choro e vê se deixa de sofrer. Eles foram embora e ninguém nem notou. Você sente agora, pois só agora voltou. Quando acabarem os sentimentos, pensará nisso direito. Eles não estavam lá quando você sentiu dores no peito. Eles não tinham mãos quando lhe faltava apoio. Agora vê se levanta e separa do trigo, o joio.
— Você é frio hoje.
— Mas frio eu sempre fui.
— Eles se lembraram de mim?
— Sua presença dilui.
— Até você?
— Não. Eu aqui sempre estive.
— E como nunca te vi?
— Se você quer, cative.
— Eu não entendi.
— Eu te amei logo que te vi.
— E por que nunca me disse?
— Temi perder-te, então me contive.
— E doeu?
— Muito.
— Você morreu?
— Muitas vezes.
— Eu nunca te amei assim.
— E eu sei.
— Agora eu estou confuso.
— Eu sei também.
— Onde você esteve?
— Bem aqui, ao seu lado.
— Como você se manteve?
— Comendo dos seus migalhos.
— Você me ama então?
— Muito.
— Doeu ver-me partir?
— Você nunca partiu de mim. E eu sabia que voltaria um dia.
— Eu não sei se te amo.
— Você nunca amará. Você ama os outros. Aqueles que não estavam lá.
— Mas os outros morreram.
— E você sente.
— Eu sinto.
— Não se arrepende?
— Sim. Muito tempo foi extinto.
— Você pode ir agora.
— Mas acabei de chegar...
— Vá, por favor. Se você ficar, eu não vou me aguentar.
— Mas você não me ama?
— Hoje eu espero que não. Espero ficar bêbado, ou matar meu coração. Hoje eu queria que fosse somente uma passagem. Se você não me ama, não precisa fazer alarde, que eu entendo. Eu me arrebento, mas se não é suficiente, então pegue as suas malas e volte. Mas volte contente. Saiba que aqui alguém te ama, que isso nunca vai mudar... Mas se isso não te basta, não vale a pena ficar. Eu aqui posso morrer tantas vezes como fiz antes. Vá afogar-se nos braços daquelas suas acompanhantes. Elas que sempre lhe dedicaram tanto apreço, elas que te merecem muito mais do que eu mereço. Então vá embora que pra mim agora basta! Perder-te uma vez é praxe, duas vezes é desgraça. Se um dia me entender, eu quero que saiba que aqui fico. Se me puderes corresponder, o meu amor eu não modifico.
— Eu nada posso dizer se não adeus. Eu sinto muito.
— Não, você não sente. Adeus também... Vá encontrar o seu mundo.

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