Henrique Amorim
Os motoristas que passaram pela RJ-116 nessa sexta-feira, 3, tiveram que ter paciência redobrada devido ao grande congestionamento ocasionado pelo escoamento do tráfego, na altura do km 78, na Ponte da Saudade, no sistema Pare-Siga. O motivo foi uma obra promovida pela concessionária que administra o trecho privatizado da rodovia, a fim de nivelar o pavimento, que sofreu severas ondulações com as fortes chuvas do mês passado.
Para os moradores e comerciantes do local, contudo, a obra não põe fim ao transtorno que eles sofreram no último fim de semana, quando, munidos de pás e enxadas, tiveram que arregaçar as mangas em mutirão para impedir que a lama invadisse seus imóveis. O pior é que se chover forte de novo, o problema tende a se repetir.
Por causa do entupimento dos bueiros que deveriam captar o volume da enxurrada vinda de uma imensa encosta bem ao lado do radar eletrônico, na pista de sentido Centro, a água e lama que desceram da montanha durante a chuva recente invadiu a pista. “O trânsito aqui é pesado. Quando passava um caminhão ou ônibus, mesmo devagar, mais lama era jogada na porta das casas. Tivemos que passar o domingo limpando tudo. Agora o problema é a poeira”, conta o funcionário de uma oficina mecânica bem em frente à enorme encosta.
Outro comerciante do local observa que as galerias naquele trecho estão entupidas desde a tragédia climática de 2011, fazendo com que as enxurradas busquem outros caminhos, causando estragos e deslizamentos. A situação se complicou com a queda de parte da encosta num terreno particular. Quem mora ali teme novos deslizes de terra da montanha, que podem não só engolir parte da RJ-116, inviabilizando o principal acesso ao Centro-Norte do Estado, mas também atingir os imóveis marginais ao Rio Santo Antônio.
O empresário do ramo de confecção de lingerie, Paulo Chelles, que é proprietário de 5.875 metros do terreno que engloba parte da encosta, também se mostra preocupado com a possibilidade de uma tragédia. Toda vez que visita o terreno onde ele e sócios pretendem instalar o estacionamento de um empreendimento no antigo e conhecido casarão amarelo à beira da estrada—um dos símbolos do local—Chelles se assusta.
Uma grande quantidade de terra desceu da encosta e destruiu a construção de um sistema de captação das águas de enxurradas. “Não deu tempo nem de emboçar a estrutura. Tudo foi danificado pela avalanche”, observa o empresário, apontando para marcos de ferro no terreno, fincados logo após o deslizamento, e que dias depois já estavam encurvados. “Não precisa ser engenheiro para concluir: o terreno está cedendo. Se não for feita uma contenção já, tudo pode deslizar. É preciso uma grande intervenção neste local e na propriedade vizinha, no cume da encosta”, diz Paulo Chelles. Com a rede de drenagem entupida, as águas das chuvas continuam infiltrando o solo. A gravidade do problema é tamanha que a força da água subterrânea já levantou parte do pavimento da rodovia, formando um grande calombo na pista.
Perigo no local é relatado em documento encaminhado às autoridades e à Justiça
A possibilidade de um novo deslizamento de terra na encosta, com risco iminente de um grave acidente, já foi denunciada ao Ministério Público (MP) pela jornalista e editora-chefe de A VOZ DA SERRA, Angela Pedretti, e será ainda detalhada em documento que Chelles pretende elaborar em breve, a fim de encaminhá-lo à Prefeitura, Defesa Civil e órgãos ambientais. Angela, que logo após a tragédia denunciou toda a situação ao MP e aos órgãos ambientais, está fazendo um dossiê com fotografias de flagrantes do perigo para também enviar ao Ministério Público em nome dos moradores. “Enquanto se discute a quem cabe a responsabilidade pelo desmoronamento daquele talude, a intenção é que a Justiça obrigue o Estado a viabilizar imediatamente as obras de contenção necessárias, pois há vidas em risco”, diz a jornalista.
Angela Pedretti chegou a solicitar junto à Secretaria Municipal de Meio Ambiente a certidão de inteiro teor relativa às obras aprovadas no referido terreno, mas aguarda desde agosto do ano passado o documento que, por previsão legal, deveria ser expedido num prazo de 15 dias. “Dei entrada neste pedido no dia 26 de agosto de 2011. Já estive na Prefeitura algumas vezes para buscar a documentação e ligo quase que diariamente para saber que fim levou esse requerimento. A cada vez ouço uma desculpa diferente, e até agora nada”, afirma.
Outra situação bastante preocupante observada na encosta são algumas árvores tombadas, não na direção da rodovia, indicando o cedimento do terreno, mas ao contrário, o que evidencia a possibilidade de um grande escorregamento de todo o bloco da encosta.
Para evitar o grande risco no local, tanto moradores como o empresário alertam para a necessidade de desobstrução urgente das calhas e galerias de captação das águas das chuvas construídas há mais de duas décadas pelo Departamento de Estradas de Rodagem do Estado (DER-RJ). Chelles espera ainda que o platô existente no local—previsto para dar lugar ao estacionamento—sirva como “ponto amortecedor” de uma futura avalanche, evitando uma tragédia na estrada.
O secretário municipal de Defesa Civil, tenente-coronel João Paulo Mori, disse nessa sexta-feira que já enviou técnicos para vistoriar o local e que após expedição de laudo oficiará os órgãos responsáveis, notificando-os da necessidade de obras ali. Enquanto isso, a concessionária que administra a RJ-116 investe em serviços de desobstrução dos bueiros e sondagem do solo, na tentativa de evitar que a infiltração subterrânea continue comprometendo a pista.
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