Depoimento de Xuxa estimula discussões sobre abuso sexual

sexta-feira, 01 de junho de 2012
por Jornal A Voz da Serra

Dalva Ventura

A corajosa entrevista que Xuxa deu ao Fantástico, revelando que sofreu abuso sexual na infância, contribuiu para colocar em discussão essa violência inaceitável a que, infelizmente, muitas crianças e jovens são expostos. Dentro de suas próprias casas ou em casas de parentes, vizinhos ou amigos da família.

Como foi amplamente divulgado pela mídia, as denúncias de casos de abuso aumentaram depois da entrevista. Ao revelar diante das câmaras o que sofreu, Xuxa trouxe à luz a angústia de quem passa por isso e, no dia seguinte, o número de ligações para o disque 100, que recebe denúncias de violação aos direitos humanos, saltou dos habituais 80 mil para 112 mil telefonemas em um só dia. Um aumento de quase 50%.

Estranhamente, porém, parece não ter sido o que aconteceu em Nova Friburgo. Pelo menos na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam), que registrou apenas um caso na semana passada—se é que se pode chamar de pouco—, um caso em apenas sete dias.

A reportagem de A VOZ DA SERRA procurou o Conselho Tutelar do município que informou não dispor de dados globais sobre os atendimentos realizados e, portanto, não pode afirmar se o número de denúncias de abuso sexual aumentou depois da entrevista. O motivo alegado é o revezamento dos conselheiros nos plantões. Mas, segundo a conselheira Sebastiana Alves, conhecida como Tiana, a demanda de casos de pedofilia continua a mesma, apesar de constante.

A delegada Grace Arruda confirma que pelo menos lá também não houve um aumento nas queixas após a polêmica entrevista que repercutiu mundo afora. Nem precisava, pois já é enorme. Durante a semana, Grace atendeu “apenas” um caso, um número que está dentro da média de registros da delegacia. Pode até parecer pouco, se comparado com o de outras cidades, mas a verdade é que está longe de ser satisfatório. Aliás, nenhum número poderia ser considerado satisfatório. O ideal é que não houvesse pedofilia neste mundo, prática abominável que horroriza e assusta a mais fria das criaturas. Infelizmente, não é o que acontece.

“Atualmente, estamos com 30 inquéritos de abuso sexual em andamento. Nossa média está em torno de um caso por semana, um absurdo”, afirma a delegada, indignada. “É assustador, principalmente se levarmos em conta que muitos casos, talvez a maioria, não são denunciados”, completa. Para começo de conversa, muitos pais simplesmente não acreditam nos filhos quando estes conseguem romper a barreira do silêncio e se abrir sobre o que está acontecendo. Outros até acreditam, mas têm medo ou vergonha de levar o caso até uma autoridade policial ou mesmo a um conselheiro. E há até, acreditem, quem compactue com o abusador e participe, junto com eles, desta prática abominável.

Atenção ao que acontece entre quatro paredes

Enquanto isso, continua a delegada, as famílias friburguenses ainda estão em pânico com a onda de boatos dando conta de uma série de estupros de jovens e senhoras que andaria à solta na cidade.

“Na verdade, todos também deveriam se preocupar com o que pode estar acontecendo de suas próprias casas e que, muitas vezes, as pessoas não se dão conta”, declara. Cabe aos pais alertar seus filhos—meninos e meninas—para esta triste realidade. Aliás, vale a pena registrar que os meninos—e não só as meninas—são alvo de abuso, ao contrário do que muita gente acredita.

“Temos que ficar alertas. Não se trata de assustar crianças e jovens, mas de tomar cuidado, prestar atenção e, se for o caso, contar a uma pessoa de sua confiança. Que pode ser a professora, a diretora do colégio, a psicóloga, a tia, o tio, a vovó, o vovô, seja lá quem for.”

Na verdade, o fantasma pode estar muito mais perto de nós do que imaginaríamos—no aconchego de casa, diante dos olhos da família, enfim, onde menos se espera. “E, que ninguém se engane. O abuso sexual não tem lugar nem hora, não tem forma, não tem nível social, características. Não dá para imaginar”, diz. E também dentro da escola, na vizinhança, na casa de amigos ou de coleguinhas de nossos filhos e filhas, entre as pessoas que frequentam as nossas igrejas. “Chega a ser inacreditável”, diz.

Então, todo cuidado é pouco, alerta a delegada, que aproveita o gancho para alertar as famílias sobre a necessidade de controlar de perto o que acontece com seus filhos. Dentro e fora de casa. A qualquer hora. Em qualquer situação.

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