Cut-up - 29 de agosto

Por Diego Vieira
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
por Jornal A Voz da Serra

“Você, mulher, nem sabe a poesia que tem.”

João Antônio, PAULO

MELADO DO CHAPÉU

MANGUEIRA SERRALHA

Os reflexos se tocam, exasperados, murchando em suas respirações, atraídos eternamente pela visão turva que são eles mesmos. Homem e mulher e mulher e homem e homem.

Desesperados por sentido, como outros quaisquer. Únicos e perfeitos, como outros quaisquer. Suas jornadas simples, anônimas e esquecidas na poeira dos tempos, são tão importantes quantoz as grandes navegações, os grandes romances, os pequenos e simpáticos primeiros olhares que brotam em uma vida, em um amor, em uma batalha. Suas pequenas e insignificantes jornadas são lendárias tomadas, misticamente ligadas ao destino da terra.

Ainda que, muito acima dela.

“Gostaria de pintar um quadro em que eu capturasse um único momento. Algo simples, preso no tempo, as discussões, as músicas, os sentimentos, tudo questionavelmente real. Como uma pessoa que você conhece no ônibus, conversa, te conta alguns problemas, e então, desaparece. É o tipo de quadro que eu gostaria de fazer. É o tipo de música que eu gostaria de ouvir ao ver uma imagem como essa, os sons do ambiente ao redor, como amigos numa mesa de bar, ou pessoas se conhecendo. Estranhos perdidos, fazendo o possível para não serem estranhos.”

“Eu gostaria de algo assim.”

“Pôr na novela um novelista. Ele servirá de pretexto às generalizações estéticas que poderão ser interessantes – pelo menos para mim. Ele justificará igualmente a experimentação. Espécimes de seu trabalho poderão ilustrar outras maneiras possíveis de se contar uma história.”

Aldous Huxley, POINT COUNTER POINT (CONTRAPONTO)

(da tradução de Érico Veríssimo e Leonel Vallandro)

PÁGINA

“It´s a Kafka high. Make you feel like a bug.”

“É uma viagem kafkiana. Te faz sentir como um inseto.”

Página 5 / 4 linhas

Linha 1 / 2 painéis

Painel 1:

O rapaz escrevendo uma carta.

Quadro de texto:

Viver catando palavras, obsessivo como um personagem de Cortázar. Fumando e esperando o inesperado.

Quadro de texto:

Buscando cegamente pelo fantástico e pelo estranho em casa esquina. Vivendo com medo de viver.

Painel 2:

A mão da garota segurando um pedaço de tamarindo, oferecendo uma semente ao rapaz.

Quadro de texto:

E, de repente, as regras deixam de valer.

Rapaz:

Nunca comi tamarindo.

Quadro de texto:

E eu me pego guardando uma semente como lembrança.

Linha 2 / 1 painel

Imagem do painel:

Uma coruja branca voando perfeita, na escuridão, através dos galhos das árvores.

Quadro de texto:

Você entende o que quero dizer?

Linha 3 / 3 painéis

Painel 1:

A garota coçando uma espinha sobre o lábio superior.

Painel 2:

Seu cabelo castanho bagunçado caindo sobre seus olhos verdes.

Quadro de texto:

Gosto de estar com você.

Painel 3:

Os dois se despedindo no ponto de ônibus. Ele, mais alto, está beijando-a no rosto.

Linha 4 / 2 painéis

Painel 1:

Os dois sentados no chão. Há uma pilha de cartas de tarô no chão e ela segura a carta da Estrela (XVII).

Quadro de texto:

Ainda não sei o que fazer a seguir.

Painel 2:

Outra vez, a tela de tv. No canto esquerdo superior, o símbolo do PLAY.

Na tela, o rapaz beijando a garota.

Quadro de texto:

Mas posso imaginar algo.

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