CPI da Saúde rejeitada durante madrugada

Com plenário esvaziado, mesa diretora vetou por 3 a 2 proposta de comissão que iria investigar possíveis irregularidades na Saúde de Friburgo
quarta-feira, 06 de maio de 2015
por Jornal A Voz da Serra
Extenso expediente da Câmara Municipal de Nova Friburgo em 6 de maio de 2015 adentrou a madrugada do dia 7 (Cortesia de Maicon Figueira)
Extenso expediente da Câmara Municipal de Nova Friburgo em 6 de maio de 2015 adentrou a madrugada do dia 7 (Cortesia de Maicon Figueira)

Ao término de uma das sessões legislativas mais longas dos últimos anos, já próximo às duas da manhã de quarta-feira, 6, a mesa diretora da Câmara Municipal de Nova Friburgo, através do posicionamento de três de seus cinco integrantes, apresentou parecer contrário à instauração da CPI da Saúde proposta pelo vereador Cláudio Damião com apoio de Pierre Moraes, Zezinho do Caminhão, Christiano Huguenin, Gabriel Mafort, Wellington Moreira e Cigano. Assinaram o parecer os vereadores Francisco de Barros, 2º vice-presidente; Marcelo Verly, 1º vice-presidente; e Marcio Damazio, presidente da Câmara Municipal. O 1º secretário, Christiano Huguenin, e o 2º secretário, Ceará, mantiveram o posicionamento favorável à instauração da CPI e não assinaram o documento.

A reportagem de A VOZ DA SERRA consultou uma fonte jurídica, que resumiu e explicou o aspecto que foi decisivo para desenrolar do episódio. “Na verdade, quando uma proposta de CPI é apresentada e os critérios estão presentes, a presidência tem a obrigação de instaurar. É um direito da minoria, que precisa de apenas um terço das assinaturas. Além delas, a proposta também precisa apresentar prazo e fato determinado. A presidência analisa esses critérios, pode pedir orientação jurídica, e por fim toma sua decisão. A presidência ou, como foi nesse caso, a mesa diretora. Nada impede isso. A maioria da mesa entendeu que não tinha fato determinado. Entendeu que, apesar da proposta ter relacionado vários ocorridos na Saúde, o pedido da CPI era muito amplo, e iria devassar o governo e fazer uma investigação genérica. O padrão para uma situação como essa seria investigar um número limitado de processos onde foram identificados indícios. Mas não, o pedido mostrava interesse em investigar todas as contratações, tudo o que diz respeito a recursos humanos. Não tinha um foco, a intenção era investigar tudo. O presidente entendeu que a proposta era de uma devassa, e aí a jurisprudência e a doutrina são contrárias. Ele não disse que a Saúde está boa. A mesa diretora entendeu que a proposta apresentada teria esse vício, que é a ausência de fato determinado. E a partir daí foi feito o arquivamento.”

O vereador Cláudio Damião, autor da proposta, discorda. “Foi uma manobra. Esperaram até duas horas da manhã, foram protelando o trabalho da sessão com leituras absolutamente supérfluas e desnecessárias para aquele momento, cansando as pessoas que estavam aqui. Eu fiz a entrega de mais oitocentas adesões, e com isso chegamos a 14.500 assinaturas populares em apoio à instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito. Todos os quesitos formais foram cumpridos: prazo certo, as assinaturas de um terço dos vereadores, e o objeto da CPI, que é o fato determinado. E nós elencamos diversos, inúmeros fatos determinados. Entre eles omissão e negligência, que já seriam suficientes para a instauração de uma CPI. Se levarmos em conta que houve um aumento no número de óbitos, as pessoas não conseguem o atendimento de forma razoável, existem centenas de casos de pessoas que relataram seus problemas e esperam há um ano ou dois anos por uma cirurgia, fora os que estão internados e aguardam atendimento cirúrgico, ou passam pelo procedimento e não tem remédio para ser fornecido, a família tem que ir à rua comprar. Equipamentos que não são manuteídos, contratações emergenciais que a gente não tem conhecimento, falta de insulina, de fita para medir a glicemia, os carros que não passam por manutenção... Problemas de toda ordem. Então, se nós elencamos tantos problemas dessa natureza, não é absolutamente razoável que o presidente venha alegar que não tem fato determinado. Quer dizer, fizeram uma manobra. Cansaram todo mundo até duas horas da manhã, para dizer ao final que a CPI não seria instaurada. Pegaram lá argumentos de casos que foram negados em outros municípios por razões absolutamente diversas das razões que nós apresentamos aqui. Então não tem fundamentação, foi uma decisão de proteção ao prefeito e ao secretário de Saúde. Não de proteção ao interesse público, não de proteção à população que está abandonada e desassistida. E também demonstra uma falta de vontade de conhecer a fundo os problemas da Saúde, como uma CPI poderia fazer. Na medida em que ela investigasse, levantasse os casos, ouvisse as pessoas, podendo inclusive ao final, no seu relatório, apontar caminhos. Mas nem isso eles quiseram ouvir. Na minha opinião, tomaram uma decisão de força, impedindo a fiscalização através de uma comissão parlamentar de inquérito.”

O vereador Ceará, membro da mesa diretora que não assinou o parecer contrário à instauração da CPI, também manifestou publicamente sua posição. “Quero expor publicamente que mantenho meu posicionamento favorável à CPI da Saúde, sendo contrário a tal parecer. Meu compromisso é com a população friburguense. Não pactuo com o erro.”

O presidente da Câmara, vereador Marcio Damazio, também foi ouvido pela reportagem de A VOZ DA SERRA. Questionado a respeito do horário em que o tema foi abordado, Marcio negou que tenha sido uma medida premeditada. “Na verdade nós estamos há praticamente um mês sem sessões ordinárias. Houve feriados, várias sessões específicas, e nossa pauta estava, e ainda está, muito sobrecarregada com vários requerimentos e projetos para serem votados. Nós iniciamos nossa sessão no horário normal e tivemos que prorrogá-la por mais algumas horas, porque eram projetos que estavam na pauta. Não foi nada escondido, toda a população sabia que esses projetos estavam na pauta. Tanto a questão da CPI, que foi protocolada há mais de quinze dias aqui na Casa e não é matéria deliberativa, quanto o projeto de emenda à Lei Orgânica que definiu o número de vereadores, e já estava tramitando havia mais de dois meses. A própria imprensa noticiou várias vezes que a qualquer momento essas definições iriam acontecer, e eu, como presidente, não tenho o poder de impedir que um projeto vá a votação. Os vereadores propuseram, e o projeto de emenda à Lei Orgânica foi a votação.”

Sobre o arquivamento da proposta de CPI, Marcio novamente afirmou que sua decisão foi técnica. “Essa é uma questão jurídica. Em momento algum eu afirmei que não existem problemas na Saúde. Eles existem sim, mas não serão resolvidos através de uma CPI. É tudo uma questão jurídica. O documento apresentado pelo vereador do PT apresenta fatos abstratos, sem o argumento jurídico necessário. Então a orientação que a mesa diretora recebeu por parte da Procuradoria da Casa, juridicamente, pela parte técnica, foi de que aquele documento não teve um fator primordial, que é o fato determinado. A maioria dos membros da mesa diretora acatou essa orientação, até porque o próprio vereador que é presidente da Comissão de Saúde da Câmara, Dr. Renato Abi-Ramia, foi um dos vereadores que não assinou a proposta de CPI, alegando que aquela documentação era frágil e sem fato determinado. Isso tudo fez com que nós tomássemos essa decisão, baseados apenas em questões jurídicas e de legalidade. Se essa CPI fosse instaurada com base no documento apresentado, além dos problemas que já existem na Saúde ela iria causar muitos outros. Porque se fala ali de uma devassa com a administração pública, sem um fato determinado que seria investigado.”

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