Comunicar para transformar!

Por Alessandro Lo-Bianco
sexta-feira, 08 de abril de 2011
por Jornal A Voz da Serra

“As pessoas estão usando as novas mídias para falar cada vez mais, e escutar cada vez menos”

Ator, cantor, pintor nas horas vagas e futuro psicólogo. Este é Leonardo Miggiorin, que aos 28 anos dá um show na pele de Roni Frangonard, na novela Insensato Coração, na Globo. Apesar de jovem, o ator mostra-se extremamente preocupado com os rumos da educação no Brasil ao declarar que pretende abrir uma escola que forneça orientação e educação para pessoas de baixo acesso. Estudante do curso de psicologia, o artista já trabalhou com estágios, prestando atendimento a pessoas de rua, adolescentes, dependentes químicos e idosos, trabalhos estes que enriqueceram sua vocação profissional, criando em si o desejo de unir as duas profissões: a arte com a psicologia. Como? É o que você confere a seguir, nesta entrevista!

Onde você estudou?

Passei por muitos colégios, pois meu pai era militar da aeronáutica, então nos mudamos bastante. Mas me formei no Colégio Estadual do Paraná, onde fiz um segundo grau técnico de artes cênicas. Tive nos dois primeiros anos um ensino geral, englobando física, química, matemática e todas as matérias normais. No final tive disciplinas específicas de teatro, com figurino, iluminação, maquiagem, tudo.

Como foi essa fase?

Foi uma fase muito boa, de grandes descobertas. O colégio tinha uma preocupação e uma responsabilidade muito grande com os alunos. Ali existia acompanhamento psicológico, muitas áreas de lazer, espaços dedicados a música, oficinas de teatro e muitas áreas de convivência e relacionamento. O ensino foi como o esperado. Por ser um colégio público tinham algumas deficiências, claro, mas foi um colégio que me fez muito bem em termos culturais.

Como o colégio contribuiu para sua formação de ator?

Comecei a fazer teatro numa vila militar, onde morei com 12 anos de idade, no Rio de Janeiro. Aos 15, já em Curitiba, eu entrei pra um curso de vídeo, pois eu já tinha interesse. Mas em relação à importância do colégio, na verdade, eu procurei uma escola normal para me inscrever, e descobri que lá também tinha um segundo grau técnico em Artes Cênicas. De certa maneira, isso me profissionalizou. Eu não sei se eu seria um ator profissional sem essa orientação escolar.

E depois que você concluiu o ensino médio?

Eu sempre quis fazer psicologia. Na verdade, eu entrei pro teatro porque tinha uma matéria de psicologia no meio do curso.

E como foi a experiência de começar o curso de psicologia?

Já estou no meio da faculdade. Mas precisei trancar inúmeras vezes por conta do trabalho. Eu estudo na Universidade São Marcos, em São Paulo, e pretendo me formar de qualquer maneira. Já trabalhei com vários estágios e vários tipos de pacientes. Tive experiências de lidar com dependentes químicos, idosos, adolescentes e moradores de rua. Esta sendo uma experiência incrível.

E por que você escolheu fazer psicologia?

Tenho uma prima que se formou em psicologia quando eu era criança. Este nome, psicologia, me despertava muito interesse. Tinha um lado relacionado à comunicação, ao ser humano como objeto de estudo, a mente humana, as relações e emoções. Esse universo sempre me interessou, pois sempre fui muito comunicativo e de fácil relação com as pessoas. Essa tendência pra área de humanas se manifestou logo cedo em mim.

E qual a importância de relacionar os estudos à sua carreira de ator?

Um dos objetivos da minha carreira é me formar. Quando resolvi estudar psicologia, nunca havia pensado em largar o trabalho de ator, o trabalho artístico, mas sim unir as duas profissões, já que a psicologia me leva para um lado mais racional, o lado social. A psicologia social tem muitas ramificações. Eu penso em ter uma escola voltada para arteterapia e projetos sociais. Até mesmo neste momento, estou produzindo uma peça pro final do ano, na qual irei incluir questões relacionadas à responsabilidade social e sustentabilidade. São temas que me interessam e é uma forma de unir as áreas e trabalhar os dois lados.

Fale um pouco mais sobre este desejo de abrir uma escola...

É um projeto futuro. Penso em abrir uma escola voltada pra teatro, arteterapia, que trabalhe questões voltadas pra trabalhos sociais. É uma ideia que tenho desde jovem, de ter um centro educativo em que as pessoas sem oportunidades possam ter acesso a informações.

Não basta apenas ter acesso. É preciso também orientação, né?

A orientação é muito importante. Quando você tem orientação, você descobre novos talentos e novas oportunidades. Todo mundo tem a possibilidade de desenvolver um dom, de se tornar um engenheiro, um físico, um matemático, um ator, basta que você tenha oportunidade e orientação. Eu tenho esse desejo de gerar oportunidades.

Do que mais você sente falta quando se lembra dos tempos de colégio?

Eu sinto falta de uma rotina de estudos. Quando eu fico muito tempo sem ir pra faculdade, por exemplo, por conta das gravações, sinto falta de ler, escrever e estudar uma determinada disciplina. O estudo é uma forma e um processo de socialização, de civilizar o indivíduo.

O que você acha que ainda falta no ensino atual?

O mundo evoluiu muito tecnologicamente e cientificamente, mas avançou pouco em termos de relação social. A tecnologia está aí, tudo bem, mas e a relação com o próximo e consigo mesmo? Precisamos trabalhar mais o autoconhecimento, aproximar mais as pessoas. Eu acho que o mundo esta caminhando para uma individualização. Hoje em dia é tão fácil você divulgar suas coisas por meio do computador que a impressão que me dá é que as pessoas só estão falando e não escutando. Cada vez mais estão falando sobre si mesmas, divulgando coisas, e estão cada vez menos lendo sobre os outros.

Seria um alerta em relação a como podemos usar melhor as ferramentas de mídia, como twitter e facebook?

Acho que sim, pois vejo pessoas que falam coisas vazias, apenas pela necessidade de usar aquela nova mídia, aquela nova forma de comunicação. Acho que temos que evoluir no sentido das relações pessoas e interpessoais. Não adianta falar do preconceito e colocar na televisão as pessoas dando risadas dos negros, dos gordos e dos gays, se você não leva esses temas para uma discussão mais profunda, presencial. Precisamos aprofundar mais estes temas e estas questões da nossa sociedade. Não adianta tentar conter o bullying se você não trabalha as relações pessoais. Você pode dizer que é errado, mas será que as pessoas estão aprendendo mesmo, passando um processo de autoconhecimento?

Você acha, então, que as relações humanas e a forma como vemos o próximo deveria ser estudada com mais profundidade?

Sim. Trabalhar mais o autoconhecimento dos alunos seria uma grande evolução pro país. Não adianta mandar um foguete pro espaço se as pessoas não se conhecem dentro da sua própria casa.

Que conselho você deixa para os leitores desta entrevista?

Eu deixo a minha experiência. Vejo que, na minha realidade, no meu dia a dia de trabalho, você só adquire respeito de verdade através do estudo, porque ele trás conhecimento pra tudo em nossa vida. Conhecimento sobre o próximo, sobre as oportunidades e possibilidades. Às vezes a pessoa deixa de ser uma coisa na vida porque ela não sabia que poderia ser aquilo. O estudo vai mostrar que ela pode sim e que existe a possibilidade. As pessoas só irão lhe respeitar quando você tiver algo a dizer, um posicionamento ético sobre as questões do mundo e da vida. É estudando e adquirindo conhecimento que você poderá ser uma referência e passar a ser admirado pelo que você fala. Temos que correr atrás, pois o mundo não é guiado pelas respostas, e sim pelas perguntas que a gente faz.

E para fechar, lugar de criança é...

Na escola! É um crime e uma injustiça não permitir que uma criança estude, pois você está tirando a possibilidade dela enxergar o mundo além do que ela está acostumada a ver.

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