Por volta das 13h30, Manoel Vicente chega carregado por dois homens à Unidade de Pronto Atendimento da Avenida Governador Roberto Silveira, em Conselheiro Paulino. O aposentado sofre com problemas cardíacos e passou mal, mas desta vez não pôde ser atendido na unidade. Os funcionários entraram em greve nesta terça-feira devido aos salários atrasados e falta de remédios, e paralisaram todos os atendimentos. O acompanhante de Manoel tomou a iniciativa de pegar uma cadeira de rodas e, com a ajuda de um amigo, levou o aposentado para dentro da unidade. "Ninguém me emprestou o equipamento, é uma vergonha. Ele mora perto da gente e começou a passar mal. O Manoel tem o coração grande, e passa mal com frequência. A gente o trouxe e os médicos disseram que não vão atendê-lo. Levaram ele para o soro apenas.”
A ideia da paralisação partiu dos médicos e teve a adesão dos demais funcionários. Dentre as reivindicações, está a defasagem dos salários em relação ao piso das categorias. Os enfermeiros da unidade, por exemplo, recebem 940 reais com a insalubridade, enquanto o valor-base é de 970. Por conta da greve, os atendentes orientavam aos pacientes a procurar o Hospital Municipal Raul Sertã. "Tenho uma pessoa que está passando muito mal aqui. Vou ter que levá-la para o hospital, não tem outro jeito. É a primeira vez que venho aqui e não me atendem. Entendemos o lado dos médicos, que também dependem dos salários para sobreviver. A culpa, na verdade, é do poder público. Não tem nem um copo lá dentro”, declara Fernando.
A reportagem de A VOZ DA SERRA tentou ouvir a direção da unidade, mas ninguém foi autorizado a comentar sobre o assunto. Os funcionários também preferiram não se pronunciar. A Secretaria de Saúde não respondeu às solicitações da equipe até o fechamento desta edição. Portanto, ainda não há como prever quando a greve terminará.
A UPA de Conselheiro Paulino recebe em média 300 pacientes por dia, e atende também moradores de Bom Jardim, Cachoeiras de Macacu, Cantagalo, Cordeiro, Duas Barras, Macuco, Santa Maria Madalena, São Sebastião do Alto e Trajano de Moraes. A unidade possui consultórios de pediatria, clínica médica e odontologia, além de laboratório para exames e salas de raio-X, sutura, medicação e nebulização. Na sala de observação de adultos, há dez leitos para observação de até 48 horas. Entretanto, todas essas estruturas sofrem com a falta de medicamentos e condições ideais de trabalho.
Manoel Vicente é socorrido por colegas na porta da Unidade de Pronto Atendimento
Durante toda a tarde foi comum observar mães com os filhos no colo decepcionadas com a negativa das consultas na unidade. A costureira Marlucia Soares dos Santos leva a filha de sete anos de idade para realizar um tratamento de rotina. A pequenina necessita de tratamento de nefrologia, mas nem sempre consegue atendimento. "Minha filha sofre com crises constantes, devido a uma doença, e eu preciso desse atendimento. Fui ao Conselho Tutelar, à Justiça e ninguém pode fazer nada. É uma luta que tenho desde o ano passado. Estive aqui mais cedo e os funcionários já estavam em greve por conta de salários atrasados e falta de aumento. Retornei e não fui atendida. A gente vai ao posto de saúde e não tem nada, assim como no Raul Sertã e agora na UPA.”
Enquanto esperava a definição sobre o atendimento, Marlucia percorreu o centro de Conselheiro Paulino e conseguiu recolher mais de 600 assinaturas em abaixo-assinado, que segundo ela, será entregue ao prefeito Rogério Cabral. "Recolhi essas assinaturas do povo para pedir a melhoria da saúde, e vou levar ao gabinete do prefeito. Ninguém se recusou a assinar. Os colégios estão em greve, o Raul Sertã não atende como deveria e agora a UPA também não atende. Como que a gente fica? E os nossos filhos?”
Lizete teve melhor sorte e conseguiu a aplicação de uma injeção para a filha, que sofreu uma grave lesão na costela no último fim de semana. "Eles até tiveram boa vontade, mas faltam os materiais. Não tem os medicamentos aqui. O médico ainda olhou o exame e aplicou uma injeção, com um dos poucos remédios que ainda restam na unidade”, conta.
Enquanto médicos, enfermeiros e demais funcionários buscam um consenso junto ao poder público, a população sofre com as consequências da paralisação. "Vou voltar pra casa e dar um analgésico para a minha filha. Trabalho em casa, recebo 20 centavos por peça e pago 560 de aluguel. Não tenho nem condições de levá-la ao Raul Sertã com esse preço da passagem de ônibus”, lamentou Marlucia.
Mães deixam a unidade com os filhos no colo e sem o devido atendimento
Pacientes foram orientados a seguir para o Hospital Raul Sertã: movimento intenso durante todo o dia na unidade
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