A propósito do Dia Nacional de Combate ao Fumo
Dalva Ventura
Venho acompanhando, há quatro anos, os esforços do pessoal do grupo de tabagismo do Hospital São Lucas, no sentido de ajudar as pessoas que precisam desesperadamente de parar de fumar. Não diria que estas pessoas queiram mesmo parar de fumar, pois se fosse por vontade própria, garanto que não deixariam seu sagrado cigarrinho de lado não. Mas, fazer o quê?
Sabem que ele é um veneno, já passaram poucas e boas por causa dele, o cardiologista, o alergista, o pneumologista, o clínico, tudo que é médico já falou que teriam de parar de fumar de qualquer jeito. Como qualquer tabagista, chega uma hora em que a pessoa tem de fazer uma escolha e decidir entre morrer (continuar fumando), ou se salvar. O problema é como fazer isso.
Sim, elas já tentaram de tudo e não conseguiram. O cigarro foi mais forte. Parece uma doença e o pior é que é mesmo. Assim como um amante que acaba com a gente, mas não conseguimos deixar de vez. A cada volta, a cada derrota, nos sentimos mais fracas para lutar contra aquela relação que só causa sofrimento.
Não, não sou fumante, mas a julgar pelo que ouço por aí e pelo que já ouvi no grupo, é exatamente assim que um fumante sente quando tenta parar de fumar e não consegue. As pessoas falam de sua luta contra o cigarro como se estivessem descrevendo um relacionamento fracassado. Fico pensando cá comigo. Para quem está de fora, como eu, parece tão fácil. Alguns até tiram de letra. Devem ter, sei lá, mais força de vontade mesmo. Tiram a maior onda com isso. “Não precisei nem de adesivos”, “Quando decidi parar, parei mesmo”, e por aí vai.
Deve dar até raiva, penso eu. Porque para a maioria das pessoas que fuma, a coisa é complicada. Vejo ali no grupo gente que ficou meses sem fumar e recaiu, sentindo-se agora a pior das criaturas. Outras que ficaram dias sem dormir de tanta saudade de seu cigarrinho. Felizmente, porém, a maioria ali parou ou está parando de fumar sem tanto sofrimento.
Para todas elas, o grupo vem representando um apoio e tanto. Para começar, os participantes contam, de cara, com a supervisão de uma pneumologista, a abnegada Ana Acácia Lima, uma ferrenha inimiga do tabaco, que se dedica de corpo e alma aos que a procuram com a firme intenção de parar de fumar. Os que necessitam e demonstram estar, de fato, comprometidos em parar, podem, se for o caso, receber adesivos de nicotina. Desde que, comprovadamente, não disponham de condições financeiras para adquiri-los.
Além disso, os participantes contam com o apoio de um psicólogo e outros especialistas, que contribuem no sentido de reforçar a decisão de parar de fumar. Outro dia mesmo, o cirurgião cardíaco Alexandre Deslandes falou sobre o mal que ele faz para o coração. Noutro, foi exibido o filme “É proibido fumar”, dirigido por Anna Muylaert, com Gloria Pires no papel principal.
O grupo permite, também, uma interessante troca de experiências que, por si só, já é um enorme alento. Em cada reunião que fui, ouvi depoimentos incríveis de pessoas que estão longe do cigarro há meses. “Sou um ex-fumante, não preciso mais dos cigarros, já me libertei”, disse um participante, que retornou ao grupo levando um amigo. Outro já estava há dois anos sem fumar e, mesmo assim, continuava indo ao grupo, quinzenalmente. “Ainda não me sinto totalmente livre, tenho medo de recair”, disse. O fato é que todos se dizem fortalecidos ao sair dali, só de ouvir a doutora Ana Acácia, que sempre encontra um ângulo novo que reforça a vontade de parar de fumar.
Ela própria, aliás, diz que mudou sua visão a respeito do tabagismo depois do grupo. “Comecei com uma visão técnica de quem estudou como a nicotina atua no cérebro e coisas afins. Aqui eu me dei conta do quanto esta ação é maior, muito mais ampla, pois ao lado da dependência química tem a questão psicológica, comportamental, que alimenta esta química de forma devastadora”, costuma dizer.
Segundo a médica, os resultados têm sido animadores. O percentual de sucesso dos participantes gira em torno de 28%. Parece pouco? Tenha a certeza de que não é. Basta dizer que apenas de 3% a 5% das pessoas que tentam parar de fumar conseguem fazer isso sozinhos. Até porque, como insiste a especialista, a nicotina é uma droga potente e os fumantes precisam de tratamento para deixar o vício. É isso que encontram lá.
Assim, sem alarde, o Hospital São Lucas vem dando uma enorme contribuição à comunidade friburguense. Os alertas do Ministério da Saúde, o Dia Nacional de Combate ao Fumo, tudo isso é válido, claro, mas não bastam. Para deixar definitivamente este amante cruel, a maioria dos fumantes precisa contar com um auxílio efetivo e permanente. O grupo está lá para isso. É só chegar.
Em tempo: as reuniões do grupo de tabagismo são realizadas nas primeiras e terceiras quintas-feiras do mês, às 18h30, no auditório do Hospital São Lucas. É só chegar.
“Fumar faz mal para você, faz mal para o planeta”
O Inca, coordenador do Programa Nacional de Controle do Tabagismo, promoveu ontem, dia 29, nas capitais, uma série de atividades e eventos em comemoração ao Dia Nacional de Combate ao Fumo.
A campanha deste ano, que dá continuidade à estratégia iniciada no dia 31 de maio—Dia Mundial sem Tabaco—, aborda o impacto socioambiental da indústria, com destaque para as questões que afetam o meio ambiente. O foco da campanha é o público jovem e adulto, especialmente entre os 13 e 25 anos, que, segundo as estatísticas, vem fumando cada vez mais.
Se você fuma, já sabe, mas nunca é demais lembrar o mal que o cigarro faz à saúde. Ele contém uma mistura de cerca de 4.700 substâncias tóxicas, entre elas, o alcatrão, o monóxido de carbono e a nicotina, que causam todo tipo de problema, de irritação nos olhos a câncer, enfisema e entupimento das artérias.
Os não fumantes também são atingidos. Onde quer que alguém esteja fumando, são encontradas partículas da fumaça do cigarro, principalmente em locais fechados, residenciais ou públicos. E também a natureza, claro. O cigarro é considerado pela Organização Mundial da Saúde o maior agente de poluição doméstica e ambiental.
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