Ceará: governista ou de oposição?

Substituto de Wanderson Nogueira na Câmara Municipal e já rotulado de diversas formas, vereador Eder Carpi explana sua visão política
domingo, 07 de junho de 2015
por Jornal A Voz da Serra
Ceará: governista ou de oposição?

Vereador desde o dia 3 de fevereiro deste ano, quando assumiu a cadeira deixada vaga pelo recém-eleito deputado estadual Wanderson Nogueira, Eder Carpi (PSB) — mais conhecido pelo apelido, Ceará — já foi rotulado de diversas formas. Governista, oposicionista, e até mesmo demagogo, após doar seu salário do mês de maio, juntamente ao vereador Christiano Huguenin, para a aquisição de equipamentos para o Hospital Municipal Raul Sertã.

Diante dos vários questionamentos, Ceará procurou a reportagem de A VOZ DA SERRA justamente com o intuito de esclarecer seus posicionamentos, dar sua versão a respeito das diferenças com o próprio partido, e esclarecer, de uma vez por todas, qual sua postura dentro do plenário.

Início na política

“Eu comecei a participar do processo político da cidade, a participar de um grupo — ou a achar que fazia parte de um grupo — em 1999, quando estava sendo coordenada a campanha da Dra. Saudade para a Prefeitura no ano seguinte. Conheci a Dra. Saudade na Universidade Estácio de Sá, onde eu trabalhava e a Dra. era médica do vestibular. Num determinado momento a Dra. comentou comigo que seria candidata a prefeita do município, e teve meu apoio imediato. Esse foi meu primeiro passo na política. Não foi um apoio partidário, porque eu ainda não era filiado a partido algum, mas apoiei e pedi votos para a Dra. Saudade na eleição do ano 2000. No ano seguinte concluí o curso de fisioterapia e fui convidado pela Dra. a fazer parte do grupo político. Em 2002 comecei a fazer parte do governo da Dra., e fui trabalhar no Raul Sertã, que foi uma experiência de vida para mim. E daí pra frente eu sempre fiz parte desse grupo político. Aliás, volto a dizer, eu achava que fazia parte desse grupo político.”

Idas e vindas

“Após o término do mandato da Dra. Saudade, seguimos rumos diferentes. Eu não apoiei a candidata que o PSB indicou para sua sucessão, em 2008. Parti, naquela altura, para uma candidatura solitária pelo PCdoB, partido ao qual me filiei por orientação do próprio PSB, orientação do [deputado federal] Glauber e da própria doutora. Não apoiei nenhum candidato. Nem o candidato do PSB, nem muito menos qualquer nome de oposição, em respeito à Dra. Saudade. E tive, para minha surpresa, mais de 800 votos, sendo o mais votado do PCdoB na época. Isso me surpreendeu, e acendeu uma luz para a eleição seguinte. Mas, devido à necessidade de sobrevivência, fui trabalhar no hospital de Bom Jardim. E a vida seguiu. Próximo às eleições nos reaproximamos, Glauber e eu, e recebi o convite para ser candidato, agora pelo PSB. E assim fiz. Tive apoio de vários amigos, tive uma visibilidade interessante, politicamente falando. Também não posso dizer que não fui ajudado pelo Glauber, porque eu estaria mentindo. Fui sim, porque antes de assumir o compromisso de ser candidato ele nomeou meu pai no gabinete dele. Eu teria que sair de um emprego, e precisava do mínimo de apoio para sustentar a família. Isso não é segredo para ninguém, e me ajudou muito.”

As eleições em 2012

“O que mais me entristeceu em minha eleição de 2012, e eu acabei não sendo eleito por cinco votos, não é nem a questão de ser apoiado ou não dentro do partido, porque faz parte do jogo político alguns candidatos terem um pouco mais de apoio interno. O que me deixou chateado foi a postura da então presidência do partido. Entre os candidatos do PSB havia o Jorge Natureza, mas ele acabou tendo a candidatura impugnada, e eu me lembro bem que num comício de Mury Jorge chegou para mim e disse: ‘Ceará, tenho duas notícias para te dar. Uma boa e uma ruim. Minha candidatura foi impugnada. Mas a boa, Ceará, é que eu gostaria de lhe apoiar’. Fiquei triste por ele, conversamos durante um tempo, mas para mim foi uma grande surpresa. E é lógico que, dentro de uma campanha política, qualquer apoio é muito bem-vindo, especialmente de alguém como Jorge Natureza, que é muito querido na cidade. A partir daí ele começou a caminhar comigo. Nessa altura faltavam cerca de 20 dias para o pleito eleitoral. E, de repente, o Jorge desapareceu dessas caminhadas. Fiquei preocupado. Procurei o Jorge e, para minha surpresa, o então presidente do partido havia proibido Jorge de me apoiar. Ou ele apoiava o candidato para o qual perdi a eleição por cinco votos, ou não apoiava ninguém. Ou seja: uma postura de um presidente de partido contra um candidato da própria sigla. Isso me desestruturou emocionalmente, e percebi ali, naquele momento, que na verdade não fazia parte do grupo político ao qual eu achava que pertencia. Essa postura poderia ser de qualquer um, da secretária, de um militante do partido. Mas da figura do presidente do partido... Eu acho que ele não poderia fazer isso comigo. Se ele foi orientado ou não por alguém, paciência.”

Ecos da eleição

“Apesar dessa situação, depois da eleição Glauber me convidou para que eu fosse trabalhar em seu gabinete. Acontece que no mesmo instante eu tinha sido convidado a ser subsecretário de Saúde de um município vizinho, e aceitei. Nessa história não pesou apenas o lado financeiro, mas também o emocional. Como é que eu ia trabalhar no gabinete de um deputado após uma derrota política de apenas cinco votos, sob coordenação de uma pessoa que prejudicou minha eleição? Eu poderia ter uma expectativa de votos superior à que eu tive? Poderia. Mas na verdade eu perdi a eleição por cinco votos, e nessa situação o Jorge com certeza me ajudaria. Estava chateado com o presidente, chateado com a derrota, mas mantinha uma relação amistosa com o deputado Glauber. Só que, nesse período, eu percebi que não estava sendo visto como uma figura política no partido. Por exemplo, eu recebia ligação do PSB para avisar sobre um evento, mas nunca era convidado a participar de uma conjuntura política, para a discussão política, ou até mesmo para organizar os eventos. Eu me senti realmente como uma peça no tabuleiro, um peão. Estou sendo vaidoso? Não, não é vaidade. Eu acho que é uma questão de espaço interno no partido. Eu tinha um problema pontual, mas uma boa relação com o deputado. Após tudo isso, tive uma conversa franca com Glauber, em seu gabinete. E nesse papo colocamos todos os pontos, lavamos roupa suja, houve emoção de minha parte. Após isso, segui meu caminho.”

Eleições 2014

“Próximo às eleições para deputado, fui convidado por um empresário da cidade, e deixo bem claro que não foi pelo Executivo na época, mas sim por esse empresário que estava apoiando um deputado estadual e um deputado federal. Tenho uma relação de amizade com esse empresário, e ele pediu meu apoio aos seus candidatos. Aceitei de imediato. Já que não tinha mais nenhum tipo de relação política com ninguém do PSB, não tinha compromisso com ninguém, não havia por que não apoiar os candidatos. E assim fiz. A partir daí virei inimigo do PSB. Virei inimigo do PSB. Esse é meu sentimento hoje. Sentimento que começou a aflorar de uma situação que aconteceu na discussão do nome de Wanderson Nogueira para ser o candidato a estadual do partido. Aí é uma opinião minha. Se o PSB no município pensasse em grupo, nós tínhamos quatro vereadores do PSB e um suplente com uma derrota de cinco votos. Quem mais precisava ser fortalecido politicamente nessa história seria eu, por uma questão de lógica.”

Apoio a candidatos de outras siglas

“Quem era o cara mais interessado na eleição do Wanderson Nogueira? Ora, depois dele próprio, eu era o maior interessado. E nem ao menos fui procurado para qualquer discussão. Eu só fui procurado pelo Wanderson quando ele tomou a ciência de que seria o candidato. Aí faz parte do jogo político, ele começou a buscar apoio e veio me procurar. Mas aí já não dava mais tempo. Já que eu não participei do processo de escolha, não teria por que eu entrar no trem, ou no ônibus. Essas coisas começaram a mostrar que realmente eu era um peão no tabuleiro. Aconteceu a eleição, e é bom lembrar que após a eleição para vereador eu não fui procurado por ninguém. A gente não sentou para conversar. Até hoje o partido não sentou para conversar comigo.”

Ameaça de expulsão

A eleição do Wanderson foi uma grande surpresa para muitos, sem qualquer desmerecimento. Penso que ele é um parlamentar brilhante, tem uma postura brilhante. Mas a eleição dele foi uma surpresa, não só para mim, mas para muitos. Por incrível que pareça, apesar dessa minha distância gigante do partido nesse período eleitoral, a confirmação da eleição do Wanderson se deu por volta das 21h, e perto de 23h eu recebi uma ligação do PSB. Não para me dar os parabéns, mas para que eu me preparasse pois o partido estava montando um processo de expulsão, e eu não iria assumir minha cadeira. No dia da eleição do Wanderson, e praticamente da minha, porque a eleição dele para deputado estadual também significou minha eleição para vereador. Então naquele momento de alegria, o partido não fazia contato comigo há meses, e telefona para dizer que eu sofreria um processo de expulsão do partido por ter ferido o código de ética e ter apoiado um outro candidato que não fosse do partido. Aquilo para mim foi a gota d’água. Mesmo assim procurei sem sucesso a Dra. Saudade por uma questão do respeito que tenho por ela. Após tudo isso, toda essa turbulência, procurei meus direitos. Minha opinião é de que a expulsão só não aconteceu de fato porque eles recuaram quando tiveram a orientação do jurídico do PSB de que a minha expulsão não tiraria o meu mandato. Porque se houvesse alguma possibilidade de me expulsar do partido e assumir o meu mandato, eu não tenho sombra de dúvida nenhuma que eles fariam.”

Preparação para o mandato

“Após tudo isso, em novembro, tivemos o nosso primeiro encontro. ‘Não vai ter expulsão, processo nenhum, está resolvido, vamos conversar’. Conversamos. Vereador Zezinho, Cigano, Wanderson Nogueira, Rômulo Spinelli e eu. Tivemos essa reunião no gabinete do vereador Cigano, na qual eu mais ouvi do que falei. Ouvi, e a ideia do PSB era de que eu caminhasse com o PSB. Só que o meu sentimento ainda não permitia isso. Um vereador foi para a televisão e falou que eu tinha me comprometido de alguma forma a acompanhar a orientação partidária, quando em momento algum eu me comprometi em relação a isso. Assumi o compromisso de manter o peito aberto para o diálogo, e continuo assim. Só que após toda essa reunião de novembro a gente não deu continuidade a isso. E o que mais me causou espanto foi que nessa mesma reunião, no mesmo ato, nesse mesmo momento, me disseram o seguinte: ‘Ceará, nós vamos ter um encontro para comemorar a eleição do deputado e a reeleição do Glauber, mas eu não queria que você fosse não, porque o clima não é bom’. Ou seja: ao mesmo tempo que querem iniciar um diálogo, uma aproximação, deixam claro que você não é bem-vindo. Vida que segue.”

Postura em plenário

“Assumimos o mandato, e minha postura desde o dia 3 de fevereiro de 2015 tem tentado ser coerente e independente. Tenho sido bastante independente em minhas decisões. Fui alfinetado umas duas ou três vezes pela liderança do PSB no plenário, que solicitou que os vereadores do PSB seguissem o voto da liderança, e assim fiz, está tudo registrado em atas. Fiz porque a votação era unânime, e não teria por que mudar meu voto. Mas em todos os requerimentos, todos os meus votos, eu prezei a coerência. Voto técnico, considerando se o objeto está dentro da legalidade ou não. E vou seguir esse caminho até o fim do meu mandato. Não sei se essa é uma expressão muito forte, mas eu acho que não tenho que dar satisfação nenhuma ao Executivo e muito menos a um partido que não me considera mais um membro integrante. Eu acho que a minha obrigação é com a população, e é isso que vou fazer até o último dia do meu mandato. Quando falo que o partido não me considera mais vereador do PSB eu me refiro às declarações do deputado Wanderson Nogueira na rádio e no seu programa de televisão. Quando ele cita na rádio que vai conversar com os vereadores do PSB, Zezinho e Cigano, ele já me exclui da sigla do PSB. Quando ele vai para a televisão e parabeniza os vereadores do PSB que assinaram a CPI da Saúde, Zezinho e Cigano, ele já me exclui do PSB. E gostaria que ficasse bem claro que eu sou vereador do PSB, eles queiram ou não. E já que fui excluído desta forma do PSB, não tenho por que dar satisfação nenhuma à liderança do partido. E muito menos ao Executivo.”

Relação com o governo

“Quero ter uma postura coerente. Como cidadão, pai de família, essa é a cidade na qual escolhi viver, para casar, criar meus filhos, ter meus vínculos de amizade. Não posso torcer para que a cidade vá mal, que o governo vá mal. Se eu puder ajudar o Executivo, eu vou ajudar. E se tiver que fazer as críticas, também vou fazer. Se tiver que elogiar, vou elogiar. Esse modelo de política é o que considero mais coerente. Se está certo, está certo; se está errado, está errado. Dá para discutir e melhorar? Então vamos discutir e melhorar. Porque fazer oposição por oposição não é o caminho. Estou num momento bastante confortável, tanto partidário quanto em relação ao Executivo, para ter essa postura de independência. Não sei qual será meu futuro partidário, mas posso garantir que, no caso de uma transferência, minha conversa com o eventual novo partido será nesse sentido, para manter a mesma postura de independência que eu venho mantendo desde que assumi o mandato.”

A CPI e as doações

“A Comissão Especial que foi criada, muito antes dela ter o trabalho iniciado já havia sido rotulada como a comissão da pizza, a comissão da nuvem, que vai esconder os fatos. E os trabalhos foram aí bem divulgados, o relatório está aí, deixou claro que não jogou nuvem em nada. Relatamos o que realmente está acontecendo. E sobre nossa postura de doar o salário, minha e do vereador Christiano Huguenin... A gente ouve alguns vereadores e algumas pessoas dizendo que é demagogia, politicagem, que isso não resolve o problema da Saúde. Paciência, mas a minha parte estou fazendo. Se as doações durarem uma semana ou dois dias no hospital, ao menos nesses momentos algum sofrimento será amenizado. Torço de coração para que o governo, com essa mudança toda que o Executivo fez, tanto na direção do hospital quanto na secretaria, que inverta todo o caos em que a Saúde se encontra. A Saúde eu conheço bem e de perto, por ter trabalhado lá, e por ser a área que eu escolhi para trabalhar particularmente, então não tem por que tentar tapar o sol com a peneira.”

O futuro do partido e a iminente fusão com o PPS

“Eu sou vereador do PSB. Nos bastidores algumas vozes falam numa possível saída em massa de filiados do partido aqui no município. Confesso que ainda não tenho uma opinião formada sobre isso, sendo muito franco. Porque a gente não sabe quem irá assumir essa fusão com o PPS. Quem ficará no comando aqui no município? Se dependesse de alguns membros do partido eu já não estaria mais no PSB, mas eu não tenho ainda uma opinião formada se fico ou não no próximo partido que está sendo formado. A definição sobre isso virá nos próximos meses, e é importante registrar também que tenho visto com bastante simpatia o esforço do deputado Ricardo Izar (PSD/SP) pela criação do Partido Nacional Direito Humano e Animal [Pandha].”

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