Em Nova Friburgo existe a lenda de que Tiradentes teria passado pelo distrito de Amparo por ocasião da Inconfidência Mineira. Trata-se somente de uma lenda, pois Tiradentes nunca passou por Amparo. No entanto, como diz o ditado popular, “onde há fumaça, há fogo”. Essa lenda entre o vulgo tem uma razão de existir: sua origem está relacionada com um indivíduo chamado Jerônimo de Castro e Souza que teria participado da Inconfidência Mineira. A população de Amparo sempre desejou ser reconhecida como a “Amparo dos Inconfidentes”. Em 30 de novembro de 1938, no salão da escola estadual de Amparo, sob a presidência do então prefeito Dante Laginestra, diversos moradores da localidade reuniram-se para definir a justificativa do nome “Amparo” ao respectivo distrito. O depoimento mais esperado era de Eugênio Gripp, na ocasião com 78 anos de idade e residente na região desde 1860, ano em que nascera. Eugênio Gripp declarou que o nome “Amparo” já era dado à localidade desde a sua infância, e no ouvir dizer, essa denominação vinha desde a Inconfidência Mineira. Segundo ele, o sargento Jerônimo de Castro e Souza era compadre e companheiro de Tiradentes na conspiração. Jerônimo, com receio de ser preso, fugiu para Cantagalo e posteriormente obteve terras, onde hoje é Amparo, construindo uma moradia e uma olaria, na qual ainda havia vestígios. A denominação “amparo” foi dada pelo próprio Jerônimo que se julgava livre, “amparado” das perseguições contra os inconfidentes. Reza a tradição que ele disse à família: “estamos amparados” e crismou o seu novo domicílio de Amparo. Conforme Eugênio Gripp, esses fatos lhe foram narrados por Higgina de Castro Toledo, filha de José de Castro e neta de Jerônimo de Castro e Souza.
Ainda de acordo com a tradição oral, Jerônimo de Castro e Souza era oficial do exército colonial, exercendo a função de cartógrafo em Minas Gerais, ao tempo da insurreição.
Abraçara a causa dos inconfidentes e participara da trama revolucionária. Durante a devassa, como era chamado o processo na época, ficou detido na prisão da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro. Como não havia provas para sua condenação, foi libertado, e desde então, embrenhou-se pelo interior da província fluminense indo parar onde hoje é Amparo, nome dado por ele por ter sido o “amparo” de suas vicissitudes e perseguições.
No entanto, há quem afirme que Jerônimo foi um delator de Tiradentes, beneficiado com sesmarias pela Coroa Portuguesa em razão de sua delação. Mirtarístides de Toledo Piza, membro da Academia Fluminense de Letras, foi levantar toda essa história nos arquivos da Biblioteca Nacional. Após suas pesquisas concluiu que Jerônimo de Castro e Souza foi, na realidade, um falso inconfidente e traidor da pátria brasileira. Pesquisando os “Autos da Devassa da Inconfidência Mineira”, Piza desconstrói o herói de Amparo provando que ele foi um traidor. Segundo Piza, Jerônimo de Castro e Souza era alferes do Regimento de Cavalaria Auxiliar da Capitania do Rio de Janeiro.
De acordo com os autos, Jerônimo foi delator de Tiradentes e diante do desembargador nomeado para a devassa depôs contra o herói da inconfidência. O depoimento de Jerônimo de Castro e Souza consta nos “Autos de Devassa da Inconfidência Mineira”, na Biblioteca Nacional. Como recompensa pela delação que prestou à Coroa Portuguesa, Jerônimo de Castro e Souza foi nomeado 1° tabelião da Vila de Cantagalo, tomando posse em 8 de outubro de 1815. Porém, em razão da delação, fora sempre hostilizado pelos habitantes de Cantagalo, vindo a refugiar-se no recanto por ele mesmo denominado de “amparo”, nas cabeceiras do Ribeirão de São José. Jerônimo conseguiu que os moradores da Vila de Nova Friburgo acreditassem em sua versão de inconfidente perseguido e um de seus filhos foi vereador e outro juiz de paz, o que denota que tinham prestígio na região.
Vale destacar que Amparo fora anexado ao município de Bom Jardim no início da República. O povo de Amparo protestou veementemente! Isso não agradou em nada a população local e depois de incessantes reivindicações conseguiram reverter a situação e anexar-se, em 1911, a Nova Friburgo. Logo, Amparo foi o “Refúgio” de um traidor e não, o “Amparo” de um inconfidente. Alguém levantou essa história e o distrito de Amparo foi obrigado a trocar de nome. Em função das provas contra Jerônimo de Castro e Souza, a lei estadual de 641, de 15 de dezembro de 1938, modificou a denominação de Amparo para Refúgio. Era dessa forma que esse distrito deveria ser mencionado nos documentos oficiais.
Até meados do século 20, Amparo fora um importante distrito de Nova Friburgo. Possuíra a Sociedade Musical Recreio Amparense, de fardamento azul com botões dourados, fundada em janeiro de 1913; o Amparo Futebol Clube, fundado em 1927; o Grupo Dramático Amparense e animados carnavais no Cine-Teatro Almeida, cujo prédio ainda se mantém, testemunho de um passado glorioso. A capelinha de Nossa Senhora do Amparo foi inaugurada em 1950, erigida inclusive com o auxílio de muitos espíritas que existiam na região.
Visitando o cemitério de Amparo percebemos pelos sobrenomes das famílias que foi uma região que atraiu portugueses, colonos suíços e alemães: terra dos Alves da Costa, Frossard, Gripp, Folly, Sanglard, Schuenck, Toledo, Lugon, Monteiro, Lamblet, Mury, Hermsdorff, Heckert, Pereira, Schuabb, Bussinger, Emerick, Heckert, Schumacker, Thurler e muitas outras famílias.
No século 19, quando fazia parte da Freguesia de São José do Ribeirão, foi grande produtor de café. As terras férteis de Amparo foram escolhidas, além dos colonos europeus, pela aristocracia rural friburguense do século 19. Membros da elite como o Cel. Galiano das Neves possuía a Fazenda Cachoeira, ainda hoje de propriedade da família. Pela qualidade de suas terras plantava-se na ocasião café, milho, feijão e cana de açúcar. No passado, o acesso a Amparo era feito pelo Alto das Braunes, cuja estrada se denominava zigue-zague.
Até a década de 50 do século 20, Amparo foi o distrito-celeiro que abastecia o Rio de Janeiro e Niterói com produtos de sua lavoura, como batata inglesa, tomate, cenoura, arroz, ervilha, repolho, nabo, aipo, batata doce, feijão e mandioca. No ramo da floricultura existiam extensas plantações de cravo, rosa, margarida, palma, lírio, saudade, entre outras. Na fruticultura produzia caqui, lima, tangerina, laranja, banana, pera, uva, maçã, pêssego e ameixa. No entanto, na década de 60 do século 20, ocorre a decadência da lavoura na região.
Um dos maiores problemas era a via de acesso que ligava Amparo ao seu mercado, com estradas sem pavimentação, dificultando e encarecendo o transporte da produção.
A extinção da linha de trem em 1964 teria corroborado para sua decadência, pois os produtores rurais provavelmente faziam uso desse meio de transporte para levar os seus produtos ao Rio de Janeiro e Niterói. Na década de 70, já não se viam mais as serras onduladas, cobertas pelos verdes mantos dos cafezais.
Assim, um distrito tão próspero conviveu durante vários anos com a humilhante denominação de refúgio, para lembrar que lá viveu um traidor da inconfidência. É curioso ver nos antigos documentos oficiais de Nova Friburgo essa aprazível região ter um nome tão bizarro. Dado o prestígio econômico que gozava, o nome de Amparo foi restabelecido pela Resolução de n°220, de 6 de abril de 1953, do prefeito municipal José Eugênio Müller, no lugar de Refúgio. Igualmente, a Assembleia Legislativa do Estado, em 22 de julho de 1957, ratificou o nome de Amparo como denominação de quarto distrito de Nova Friburgo.
Amparo é um aprazível distrito que até hoje preserva um casario do tipo colonial. É por conta dessa história que em Amparo escolas e logradouros públicos levam o nome de Tiradentes. Não obstante toda essa história envolvendo um traidor da inconfidência mineira, o triângulo, símbolo dos inconfidentes, faz parte do brasão de armas do distrito de Amparo, embora esse distrito tenha sido o refúgio de um traidor e não o amparo de um inconfidente.
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