Amor sem limites

Esporte mais popular do país, o futebol faz parte do cotidiano dos brasileiros. A grande maioria, mesmo que não acompanhe de perto, tem preferência por algum clube. E nem sempre a lógica prevalece na hora de escolher o time de coração. Alex Moreira, 37 anos, é um exemplo clássico. Filho de flamenguista, ele começou a acompanhar futebol na década de 1980, quando tinha cinco anos de idade. Nesta época, o Flamengo de Zico, Adílio, Andrade e outros craques conquistou todos os títulos possíveis, inclusive o Mundial Interclubes. Mas nada seduziu Alex tanto quanto a cruz de malta. O gol de Marquinhos e a conquista do estadual de 1982 com o time quase todo reserva consolidou a paixão pelo Vasco.

"Eu achei a camisa bonita pelo fato de ser diferente. A partir dali, comecei a torcer pelo Vasco. Meu pai, por incrível que pareça, sentia orgulho por eu ser vascaíno. E vale lembrar que quando eu comecei a acompanhar, o Vasco não tinha um grande time. Mas depois da vitória na final de 1982 contra o Flamengo, eu não tive mais dúvidas”, conta.

Um sentimento traduzido em 840 itens. Copos, cofre, abridor que canta o hino do Vasco, convite de aniversário, CDs, rádio, baralho, cola, escova de dente, vela de aniversário, ioiô, pacote de feijão com o escudo do clube e chaveiros diversos. Há 12 anos, o zelador começou a colecionar produtos do Vasco. A primeira peça do acervo de 58 camisas foi a do time de 1992. Cada objeto é guardado com o mesmo cuidado, sejam os mais difíceis de conseguir — como a camisa utilizada pela equipe na Sul-Americana de 2005 e a que foi usada em apenas duas partidas em 2006, ou os mais fáceis, como os artigos comprados em lojas de material esportivo.

"A maioria delas eu compro, mas algumas eu ganho. O colecionador Rogério Albertini me deu duas dessas camisas. Alguns amigos sabem que eu sou colecionador e me ajudam. Algumas pessoas comentam que sou maluco. Quem entra na minha casa não imagina que eu tenho tantas coisas. Mas eu compro mesmo. Se tem um chaveiro pequeno ou qualquer outro objeto, eu compro. E não penso em parar. Quero chegar aos 900 itens até o final do ano e aos mil, em breve.”

Dentre tantos itens, um pequeno boneco quebrado e sem uma das pernas é considerado especial. Ou "Milagroso”, como Alex prefere chamar. "A minha esposa queria jogá-lo fora no dia em que o Vasco enfrentava o Atlético-PR pelas quartas de final da Copa do Brasil de 2011. Eu pedi a ela para guardá-lo e combinei: se o Vasco empatar e se classificar, eu nunca mais me desfaço dele. Instantes depois, o Elton (atacante) marcou o gol do empate que garantiu o time nas semifinais”, relembra.

Em meio a superstições e histórias curiosas, a paixão pelo Vasco não tem limites, mesmo quando envolve a questão financeira. Alex pagou 100 reais para assistir à decisão da Taça Guanabara de 2012, contra o Fluminense. "Não tinha jeito. Eu estava sem ingresso e eles estavam esgotados nas bilheterias. Então, eu tive que recorrer ao cambista.”

Como não poderia ser diferente, Sueli, a esposa de Alex, também torce pelo Vasco. No início do relacionamento, ela reclamava dos gastos a cada produto comprado pelo marido. Com o passar do tempo, percebeu que não adiantaria questionar e passou a colaborar. "Às vezes ela passa por uma loja e compra algum objeto que eu não tenho”, revela.

 

 

 (foto) Boneco "Milagroso” é o xodó do colecionador 

Há exatos dez anos, o Vasco não conquista um título carioca. Na última vez, em 2003, a equipe dirigida por Antônio Lopes venceu o Fluminense na decisão. Alex guarda a camisa daquela partida, a de número oito, usada por Marcelinho Carioca. "Não pensei que ficaríamos tanto tempo sem um título carioca. Eu guardei como qualquer uma outra, mas já está virando relíquia”, brinca.

Apesar do jejum, algumas partidas recentes pelo estadual são lembradas pelo vascaíno. A vitória por 3x2 sobre o Flamengo, no ano passado, faz parte da coleção de Alex. Uma das páginas dos nove livros repletos de documentos e recortes de jornais é dedicada exclusivamente a essa partida. A última entrevista sobre o Vasco do humorista Chico Anysio, um cartão de Natal enviado pelo presidente e ídolo Roberto Dinamite e até mesmo a nota fiscal de uma das camisas estão devidamente guardados, bem como recortes sobre conquistas em outros esportes, a exemplo do basquete e remo.

Junto a essas peculiaridades estão os registros das primeiras partidas profissionais do clube em 1916, ainda pela 3ª divisão do carioca, além de todos os resultados das campanhas dos títulos estaduais e as fotos dos times campeões. Cada uma delas traz alguma lembrança, mas duas remetem a momentos considerados inesquecíveis por Alex Moreira: a do título da Mercosul de 2001 sobre o Palmeiras, e a do gol de Cocada contra o Flamengo, em 1988. Mas também há um espaço reservado para as decepções, sendo a maior delas o rebaixamento para a segunda divisão nacional em 2009. "Chorei a noite inteira. O mundo acabou pra mim naquele dia, mas na segunda-feira eu já estava vestindo a camisa de novo. Quando o Vasco voltou à elite, eu festejei como nunca e pude assistir ao jogo do acesso no mesmo bar do rebaixamento”, contou.

 A partir deste fim de semana, Alex e milhões de vascaínos poderão acompanhar a equipe na disputa de mais um campeonato brasileiro. O Vasco estreia neste sábado, 25, contra a Portuguesa, em São Januário. Apesar de ainda manter as esperanças, ele admite que será difícil colocar a foto do time de 2013 em sua galeria de campeões. "Nós temos que pensar em título e claro que chegar à Libertadores seria maravilhoso, mesmo desacreditado. Mas pelo o time que o Vasco tem, se não cair, está ótimo.”