Agora é que são elas

domingo, 15 de março de 2015
por Jornal A Voz da Serra

Todo ano a coisa se repete: 8 de março, Dia da Mulher; segundo domingo de maio, Dia das Mães. A primeira data ainda é controversa quanto à origem, mas não quanto ao significado: sabe-se que a independência, ou melhor, a autonomia feminina foi — e ainda é — uma escada percorrida de degrau em grau, não sem alguma dificuldade, e digna, claro, de todos os estudos e aprofundamentos possíveis. E a segunda data, por mais comercial que seja, continua no top das paradas — quem vai dizer que homenagear a mãe é besteira?

O dia 8 de março engloba todas as mulheres do planeta — e isso não é pouca coisa. O destaque sempre flerta entre o aspecto social e o papel da mulher do mundo de hoje e outros temas, digamos, mais corriqueiros, muitas vezes tidos como "de praxe” no universo feminino: estética, comportamento, decoração. Ou seja, as empresas de todos os setores buscam agradar o público feminino criando uma peça publicitária bem direcionada — e que, embora específica, passeie por todos os tipos e classes de mulher. E esse é o grande desafio, porque sempre haverá uma mulher interessante, com muito conhecimento em determinada área ou com uma história de vida fascinante para compartilhar. Como representar todas as mulheres em um único texto?

Esta semana, dando continuidade à celebração pelo Dia da Mulher, A VOZ DA SERRA pretende, através de sete personagens de Nova Friburgo, dar enfoque ao papel da mulher hoje no mercado de trabalho. De acordo com o IBGE, segundo os indicadores de distribuição da população economicamente ativa no estado do Rio de Janeiro, em janeiro de 2015, 45,85% dos trabalhadores ativos são mulheres. Entretanto, é impossível negar as desigualdades existentes na sociedade brasileira quanto à representação social da mulher dentro dos mais variados espaços, principalmente no ambiente de trabalho. Foi somente nas duas últimas décadas do século XX que passamos a notar uma onda crescente de inserção da mulher dentro do mercado de trabalho, fato este que envolve ainda mudança em outros aspectos da vida em sociedade — a saber: fatores econômicos, sociais e culturais. O que significa dizer que, com o crescimento da economia e o contínuo processo de ocupação dos espaços urbanos, aliados ao recuo nas taxas de fecundidade nas famílias brasileiras, o mercado de trabalho se reconfigurou. E, com ele, avançou também a mulher, especializando-se em funções que antes eram exercidas somente pelo homem, seja no trabalho, nos esportes, na política, etc. No campo profissional, embora seja o nível de formação acadêmica o maior responsável pelas melhores colocações e oportunidades dentro das empresas, ainda existem dificuldades recorrentes no caminho da trabalhadora que almeja equiparação salarial e funcional em relação aos homens; este talvez seja o próximo capítulo da luta da mulher no século XXI, luta esta que começou bem antes, quando ela saiu da cozinha para a sala, da sala para a rua, da rua para o trabalho, para o tatame, o congresso, as oficinas, o parlamento, a presidência da República. 

 

Quem são essas mulheres, que estão conquistando todos os espaços?

Elas são CORAJOSAS

Infelizmente, certos estereótipos não são quebrados com facilidade. Uma situação hipotética: você está no meio da RJ-116, debaixo de chuva, e o seu carro quebra. Você chama um mecânico para resolver seu problema. Quem aparece? Um homem baixo, de barba, com um macacão cuja cor original é azul, mas que já está quase preto de tanta graxa? Não no que depender de Bruna Melo, Thamirez Frez e Sandy Mariano. As três moças, as três com menos de 20 anos de idade, fazem o curso de mecânica no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, o Senai. Bruna vem de uma família em que muitos já trabalham na área e isso foi o que a motivou. Em casa não sofreu preconceito, mas na rua já não pode dizer o mesmo. Thamirez concorda, e diz que "a reação que as pessoas têm é estranha, pois no geral é uma profissão em que se espera um homem, não uma mulher”. A aluna — depois do curso, ela pretende seguir a faculdade de Engenharia Mecânica — diz ainda que "leva na boa” o preconceito, pois se importa mais com as portas que estão se abrindo para as mulheres, não com as que se fecham. Sandy ainda complementa: "Algumas pessoas geralmente se espantam, outras não. Depende da pessoa”. Engrossa o coro a jovem Larissa Soares, de 22 anos, que faz o curso de soldas. Sempre se interessou pela profissão e é a única mulher na turma. "Eu não ligo para o que pensam disso, até porque, se eu for ligar para o que as pessoas pensam, eu não faço mais nada”. E não é que ela está certa!

Elas são LUTADORAS

Literalmente. Alessandra Alves, de 37 anos, bicampeã mundial e bicampeã brasileira de jiu-jitsu, esporte que pratica há nove anos. Ela afirma ter tido dificuldade no início, por estar somente entre os homens, mas ao chegar à faixa azul, percebeu que a força bruta não é a única habilidade responsável pela vitória. A força é superada pela técnica, aliás, como em quase todas as áreas da vida. A atleta sente que o preconceito é maior entre pessoas de fora, os espectadores que assistem às lutas, não entre os que praticam. "Dentro do tatame não existe nenhum preconceito; fora daqui de Friburgo tem muita mulher competindo, inclusive.” A modalidade é até indicada para as mulheres, como forma de aprender uma técnica de defesa pessoal.

Elas são EMPREENDEDORAS

Carla Ade, Lyvia Passos e Viviane Azevedo têm uma história em comum. As três são qualificadas como coaches de CrossFit, tendo inaugurado, em 2012, a CrossFit Friburgo, primeira unidade dedicada a esta modalidade de exercício do interior do estado, sendo a 19ª do Brasil; hoje, são mais de 350 espaços voltados à CrossFit.

"Apesar das dificuldades iniciais para montar o negócio, dados os preços altos dos aparelhos e dos cursos de qualificação, o sonho em ajudar a melhorar a qualidade de vida das pessoas foi maior. O bem-estar está acima da estética ou qualquer outra coisa”, afirma Lyvia. Perguntadas se a relação com os alunos é diferente por serem só treinadoras mulheres na academia, elas revelam que o início foi mais difícil, mas a idade pesou mais que o gênero, já que eram três mulheres muito jovens trazendo uma metodologia nova de exercícios, até então desconhecida pela maioria. O CrossFit consiste na junção da ginástica, levantamento de peso e atletismo, e esta combinação substitui o conceito de máquinas de musculação e esteiras e pode trazer diversos benefícios para a saúde. Viviane exemplifica o trabalho das três mencionando uma das alunas, a dona Fátima, de 60 anos de idade. Sedentária, foi incentivada pela filha, que já treinava o CrossFit, a ingressar também neste novo conceito. "Ela confiou no nosso trabalho, o que também é difícil de acontecer: as pessoas aceitarem, acreditarem e nos darem uma chance. Hoje em dia a Dona Fátima corre, agacha, salta na caixa de 50cm e faz o treino normal, incluindo o levantamento de peso com 25kg”, diz Lyvia. Tudo a ver com o tema desta reportagem: a mulher que vence suas próprias limitações.

 

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