A picada do mosquito - 28 de novembro

Por Diego Vieira
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
por Jornal A Voz da Serra

Detalhe para fora do encarte, a parte dura do fósforo roça o áspero da caixa. As fissuras provocadas, todas da mesma fonte, criam a ilusão de uma flor. Vê-se na tentativa de manter o fogo aceso, diante de um céu escuro dos diabos, o rosto do moribundo. Olheiras arroxeadas, barba de semanas, um chapéu sujo e um cigarro que, sob a força do vento, teima em não acender.

Detalhe para dentro do encarte, em que a fumaça desce até o pulmão, irradia todo o corpo e amansa o cérebro brabo de quem prefere fechar os olhos e andar pela chuva, que nessas alturas molha muito mais que a pele.

O encarte, este pequeno arremedo de sensações e sentimentos, desejos e atrevimentos, não exibe segurança nenhuma. Aperta, agora, contra o peito, duma forma que só quem sofre e ama é capaz, fotos que são só dele, que não nos cabe entender.

(Porque somos como guris intrometidos, olhando por cima do muro, sem nunca sermos capazes de compreender o quadro todo. Capturamos a realidade assim, em pequenas partes, com suas mentiras e linóleos. "Deixe-os passar, pelo amor de Deus!")

O encarte comete a façanha de esconder tudo aquilo que ninguém mais quer ver.

Tracejando aqui, contando uma história diferente daquelas outras, o encarte acende seu cigarro, comete a insensatez de amar e pensar no amor e deixa de lado todos os seus afazeres. No caminho de toda essa ação concentrada no ato de ficar parado, observando o horizonte enquanto fuma, o encarte percebe que pouco faz do que realmente é capaz.

E assim, o encarte rabisca pelos cantos, cria sua própria história, se finge de louco, se faz de infeliz, se encurrala para com os inimigos e, finalmente, "ganhe, tenha um final feliz", bote para ferver.

O encarte joga uma pessoinha entre as páginas dos jornais. Uma pessoinha pintada de papel, escondida e dependurada nas propagandas, que cai no seu colo, bem no momento em que as mentiras começam a ser contadas. Graças a Deus, ninguém percebe os vírus que ele traz consigo.

2012 vem aí, e todos estarão à salvo, porque quem não morrer imprensado entre as páginas secas do deserto de Thomas Pynchon e Paul Bowles, certamente irá se confortar entre as linhas e viverá con'alguma paz, enfim.

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