A dor de cotovelo das gerações benditas

quinta-feira, 01 de abril de 2010
por Jornal A Voz da Serra

João Clemente Moura

Imagine um concurso de roteiros com o tema Amor. As belezas do Brasil devem ser o pano de fundo obrigatório das histórias. Os três premiados receberão um considerável orçamento para realizar seus filmes.

Diversos brasileiros se inscreveram nesse concurso, bem como pessoas de outras partes do mundo. Seu resultado, baseado em critérios sérios e honestos, baseado na qualidade dos projetos e na experiência prévia dos proponentes, concedeu vitória a dois americanos e a um francês. Bom, naturalmente eles entendem do assunto; sua indústria cinematográfica é muito bem desenvolvida. De qualquer forma, é interessante ver o intercâmbio cultural e o crescimento do interesse pelo Brasil.

Porém, os brasileiros que participaram do concurso ficaram tristes, pois nenhum projeto nacional foi contemplado. Não havia qualquer um que se salvasse? Ora, ao invés de pensar nesses termos – e alimentar sentimentos de mau perdedor –, os brasileiros deveriam se comprazer com umas dessas oportunidades únicas que a vida oferece: entender in loco como um bom filme é produzido.

Essa história aí em cima, como muitos devem saber, não é ficção, é baseada em fatos reais. Aconteceu nas suas devidas proporções aqui, em Nova Friburgo.

Os artistas friburguenses, que geração após geração esperam por oportunidades, esses artistas que moram aqui não pelas condições de trabalho, mas porque gostam daqui, mesmo aceitando o fato de ganharem pouco e serem vistos como sonhadores ou frustrados, esse artistas finalmente encontraram uma boa chance de concretizar algo, de se expressar e ganhar dinheiro com aquilo que gostam de fazer. De fato, tratou-se de um evento inédito – e mexeu com a esperança de todos nós. Além do mais, afirmava-se que um dos nobres motivos do festival era incentivar a economia criativa na região. Foi, inclusive, oferecido um workshop gratuito para ajudar os friburguenses nessa empreitada. Mas... só podemos lamentar, parece que não foi suficiente.

Os friburguenses se entregaram apaixonadamente a uma ilusão. Não tínhamos chance ao concorrer com os ‘profissionais’. Ah, sim, 50% da mão de obra deve ser local. Mas o trabalho imaterial de ponta, o devir criativo, não ficará conosco. Como nos ‘anos dourados’, quando se acreditava que era só trazer indústrias de fora para a economia se desenvolver. Este é um fator importante, sem dúvida, mas também é necessário um investimento nas potencialidades locais. Seria uma maneira de estimular o capital intelectual a permanecer no município. Geração após geração, ele segue fugindo para as metrópoles, de coração partido.

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